07 Actualizacao Do Cuidar.indd 85 Atualização do cuidar Atualização do cuidar Recibido: 28 de enero de 2008 Aceptado: 3 de abril de 2008 RESUMO O presente artigo tem como objetivo divulgar uma série de idéias acerca do cuidado, a fim de contribuir para uma reflexão sobre a prática do cuidar no cenário da enfermagem. É uma síntese sobre os aspectos que fundamentam a natureza e o conhecimento do cuidar desde uma perspectiva filosófica e propõe algumas definições, como cuidado humano, cuidado na enfermagem, relações de cuidado, entre outras. PALAVRAS-CHAVE: Enfermagem, cuidado, cuidar. Nuevas ideas sobre el cuidado RESUMEN El presente artículo tiene como objetivo difundir una serie de ideas acerca del cuidado, pretendiendo con esto, contribuir para una reflexión sobre la práctica del cuidar en el cotidiano del escenario de la enfermería. Presenta una síntesis sobre los aspectos que fun- damentan la naturaleza y el conocimiento del cuidar bajo la perspectiva filosófica y plantea algunas definiciones tales como: cuidado humano, cuidado de enfermería, relaciones de cuidado, entre otras. PALABRAS CLAVE Enfermería, cuidado, cuidar. New Ideas about Care ABSTRACT The aim of this article is to circulate a series of ideas on care in the hope of fostering reflection on care practices in everyday nursing scenarios. It offers a summary of the aspects that substantiate the nature and understanding of care from a philosophical point of view, and proposes definitions of human care, nursing care and care relationships, among others. KEY WORDS Nursing, attention, care ISSN 1657-5997 - AÑO 8 - VOL. 8 Nº 1 - CHÍA, COLOMBIA - ABRIL 2008 85-96 Vera Regina Waldow1 1 Profesora jubilada por la Universidad do Rio Grande do Sul. Porto Alegre, Brasil. Doctora en Educación-Enfermería. waldowvr@portoweb.com.br 86 AÑO 8 - VOL. 8 Nº 1 - CHÍA, COLOMBIA - ABRIL 2008 AQUICHAN - ISSN 1657-5997 Introdução As idéias emitidas no presente texto são de autoria e, portanto, de inteira responsa- bilidade da autora que, ao longo de quase duas décadas, vem pesquisando e estudando sobre o tema do cuidado. Primeiramente houve uma preocupação em divulgar o tema cuidar/cuidado (1, 2), inspirado em alguns trabalhos de teoristas e estudiosas do tema, como Madeleine Leininger (3), Jean Watson (4) e Sister Simone Roach (5), entre outras. Após algum tempo, a autora iniciou a publicar trabalhos nos quais expunha suas próprias idéias (6), as quais, por sua vez, evoluíram com o passar do tempo. A sua trajetória pode ser constatada nas suas publicações mais recentes (7, 8, 9). Contribuíram para muitas das idéias, igualmente, discussões com grupos de colegas de pesquisa, seminários e cursos realizados, além de constante investigação sobre a te- mática. Atualmente seu trabalho é orientado pela linha filosófica, sendo Heidegger (10) seu referencial de partida; assim mesmo com pelas contribuições de outros autores, da mesma linha, como Boff (11); Mayeroff (12); Noddings (13) e Torralba (14, 15). Neste texto, o cuidar será analisado buscando captar o seu sentido mais amplo: o cuidado como uma forma de ser, de se expressar, de relacionar-se consigo mesmo, com o outro ser e com o mundo (6, 8). O que se propõe é uma releitura ou uma resignificação do cuidado, visualizando-o como uma ação moral, portanto permeado de valores, e também como um sentimento. En- volve, conforme Griffin (16), além de atividade, o aspecto de atitude em que são expressos os sentimentos. Para a autora, as atividades de cuidar só podem ser realmente cuidado ao serem desempenhadas quando estão acompanhadas de um comportamento emocional. Como se verá a seguir, o cuidado é um fenômeno existencial, relacional e contextual. Existencial porque faz parte do ser, lhe confere a condição de humanidade; relacional porque ocorre em relação com outro ser, se revela na co-existência com outros seres; contextual porque assume variações, intensidades, diferenças nas maneiras e expressões de cuidar conforme o meio em que ocorre (8). Gênese do cuidar Uma curiosidade em saber como se originou, se desenvolveu e como tem se manifes- tado o cuidar na humanidade, fez com que se investigasse a respeito. Contudo, o que se conseguiu são apenas aproximações, suposições daquilo que se infere e acredita serem hábitos e comportamentos de cuidar. De modo informal e rudimentar, o cuidar inicia-se de duas formas: como um modo de sobrevivência e como uma expressão de interesse e carinho em relação com outro ser; portanto, relacional (6, 8). A história das civilizações nos brinda alguns registros. Nos diferentes períodos im- primiram, em forma de arte, muitos dos seus hábitos e rituais de seu cotidiano, de sua 87 Atualização do cuidar cultura. Através de algumas disciplinas, como a Arqueologia e a Antropologia, con- segue-se deduzir algumas evidências de como os povos se desenvolveram através dos tempos, se movimentando entre hábi- tos, ações e comportamentos de cuidado e não-cuidado. O ser humano é um ser de cuidado; o ser nasce com este potencial, portanto, to- das as pessoas são capazes de cuidar (5) e necessitam, igualmente, de serem cui- dadas. Porém, esta capacidade será mais ou menos desenvolvida de acordo com as circunstâncias, dependerá da forma como as pessoas foram cuidadas durante as etapas da vida. Vários fatores intervêm neste processo: ambiente, cultura, econo- mia, política, religião, entre outros. Ao pinçar alguns momentos da evo- lução humana e os sucessivos eventos através dos séculos não se consegue caracterizar, de forma fidedigna, o com- portamento das pessoas nas suas cultu- ras, em termos de cuidado. Atualmente já é possível resgatar muitas informações através da tecnologia, das descobertas e métodos exploratórios, assim como de es- tudos e investigações utilizando metodo- logias variadas. No entanto, o que ficou no passado permanece um mistério e é fonte de suposições e especulações. Muitos se- gredos, ainda sobre antigas civilizações, estão sendo descobertos. A autora do presente trabalho ofere- ce uma visão histórica sobre o cuidado, buscando resgatar informações sobre esta categoria, desde o início da huma- nidade, as primeiras civilizações, antes e após o cristianismo e nos tempos mais modernos (6, 8). Pode-se considerar que o ser humano foi progredindo nas suas necessidades, através dos tempos, as quais lhe exigiram o desenvolvimento de habilidades e capa- cidades não só físicas e biológicas para a adaptação ao meio e às circunstâncias, mas também mentais, emocionais e sociais. Os recursos e os comportamentos de cuidado à sobrevivência assumem assim caracte- rísticas estéticas, pois os seres humanos imprimem cultura e história nas suas pin- turas e esculturas de figuras e objetos de uso doméstico, os quais descrevem even- tos do dia-a-dia, crenças, devoções, etc. Além da expressão artística, o ser humano tenta comunicar experiência, conhecimen- to e sentimentos. Dessa maneira, a arte como forma de expressão cultural, de co- municação e de expressão de sentimentos, registra a história, a cultura de um povo e as formas e rituais de cuidado. O que se pode concluir é que o ser humano, infelizmente, em sua história, apresenta paradoxos e ambigüidades en- tre comportamentos de cuidado e não-cui- dado: as guerras, os progressivos e cada vez mais sofisticados arsenais para uso militar, verdadeira obsessão dos homens, são responsáveis pela dizimação de mil- hares e milhares de pessoas. As desco- bertas científicas e o avanço industrial e tecnológico, de um lado, têm beneficiado populações no mundo inteiro, e de outro, acarretam tragédias em função do prazer do ser humano em exercitar seu poder. Foley (17) recorda que, desde o final do Pleistoceno, há cerca de 10.000 anos, o meio ambiente tem sido transformado pela atividade humana. Ele menciona a destruição de florestas; a modificação do curso ou o desaparecimento de rios em função das necessidades humanas; o in- crível aumento da população e a alteração de tamanho e forma das plantas e animais; a criação, inclusive de novas espécies. A engenharia genética e a biotecnologia têm acelerado esse processo e possibili- O ser humano é um ser de cuidado; o ser nasce com este potencial, portanto, todas as pessoas são capazes de cuidar (5) e necessitam, igualmente, de serem cuidadas. 88 AÑO 8 - VOL. 8 Nº 1 - CHÍA, COLOMBIA - ABRIL 2008 AQUICHAN - ISSN 1657-5997 tado coisas inimagináveis até certo tempo atrás, como clonagem, entre outras téc- nicas. Em outro sentido, observa Foley, o desaparecimento crescente de muitas espécies e a redução da biodiversidade parece não só uma ameaça, mas sim uma realidade. Em contrapartida, doenças têm sido erradicadas, a mortalidade tem sido reduzida, o trabalho se tornado simplifica- do, e as oportunidades de realização pare- cem ter-se ampliado. A violência, contudo permanece ou aumenta, ou ainda simples- mente assume nova cara; novas doenças surgem, outras reaparecem. A população envelhece e os jovens morrem vítimas de acidente, de homicídio e de drogas. Os go- vernos tornam-se cada vez mais corrup- tos, a ética torna-se questionável. Considerando-se a idéia de caracte- rizar o cuidar como um modo de sobre- vivência, a humanidade ainda demonstra essa forma de cuidado, agora bastante mais exigente e sofisticada. Por vezes não mede conseqüências, pois a luta agora é bem mais competitiva, e o ser humano é mais individualista. O bem-estar passou a significar ter, possuir coisas, adquirir bens e, por vezes, não importa a que custo. Quanto ao cuidar como uma forma de se relacionar, parece que vivemos um pa- radoxo. A hostilidade, o ódio, a violência, a desonestidade e o medo convivem com a solidariedade, a afetividade, o amor, a luta pela paz, pelo respeito, pela espe- rança. No final quem vence? Pensa-se que o cuidado “humano” é “uma atitude ética em que seres humanos percebem e reconhecem os direitos uns dos outros”. As pessoas se relacionam numa forma a promover o crescimento e o bem-estar dos outros (6: 43). Conside- rando-se dessa forma, pode se questionar qual é a ética que impera atualmente. O cuidar sob a perspectiva filosófica O ser humano, além de atuar no mun- do, sente a necessidade de explicar o porquê de suas ações, a razão de seus atos, e pensar as razões de cuidar, assim como justificar tal atividade. Isso consti- tui uma tarefa básica não somente para compreender-se a si próprio, mas tam- bém para exigir de si mesmo e de seus semelhantes uma ação compatível com sua dignidade moral. A interpretação filosófica do cuidar tem sua fundamentação em Martin Heide- gger. Para entender sua interpretação, é necessário falar brevemente antes do ser que habita o cuidar. Ser implica que alguém está em vias de tornar-se algo, um “vir a ser”. O homem é entendido como um projeto inacabado, um “sendo” que se interroga acerca do ser, entidade que está em condições de refletir sobre seu próprio ser. A presença é o ente do ser, e o sentido existencial da presença é a cura ou cuidado. O ser é uma realidade difícil de definir; por exemplo, é mais fácil compreender que não se é um outro. “Sendo-com-os outros” é a caracte- rística fundamental que Heidegger (10) descobre no existir do ser humano. O ser humano só pode definir-se a partir do seu existir, de sua possibilidade de ser ou não ser o que ele é. Dasein, que significa o ser-aí, quer dizer o modo de existir do homem, único entre os existentes. É a compreensão de ser e a sua revelação. Dasein está em relação básica com o ser, cuja filosofia é a explicitação da compreensão do existir Considerando-se a idéia de caracterizar o cuidar como um modo de sobrevivência, a humanidade ainda demonstra essa forma de cuidado, agora bastante mais exigente e sofisticada. 89 Atualização do cuidar pelo existente. Na análise do Dasein, ve- rifica-se que ele é essencialmente estar no mundo. O mundo e o Dasein estão em relação interna, não havendo sentido em conceber Dasein fora do mundo. Dasein está sempre criando, cuidando, preocu- pado e em desassossego com o mundo num estado de busca constante e jamais alcança a totalidade. A existência autênti- ca é sempre uma inquietude de ser, uma luta com o não-ser (10). Ser-no-mundo é essencialmente zelar, cuidar, existir ao lado das coisas e dos se- res, ter interesse, ser-com-os-outros que encontramos no mundo, o que correspon- de ao que Heidegger denomina de “solici- tude”. A relação de ser com os outros se caracteriza pela maneira como age, sente e pensa no convívio com seus semelhan- tes. O cuidar, o relacionar-se com outro é a estrutura fundamental do ser-aí. Cuidar se expressa pela relação com o outro dentro do mundo. Existencialmente falando, significa “zelar”; é o desvelar do outro, orientado pela consideração e pa- ciência. O cuidar põe em evidência o ser- livre. O ser humano sem “cuidado” não pode ser livre. As duas partes envolvidas na relação, ser cuidado e cuidador, contribuem para ele; existe responsabilidade, compromis- so. O cuidado deve ser, de alguma forma, completado no outro para assim ser des- crita como uma relação de cuidado. A re- lação é o reconhecimento do encontro hu- mano que implica uma resposta afetiva. O cuidar, o relacionar-se de forma envolvente e significante com o outro ser corresponde à solicitude e esta solicitude que representa a “preocupação com” é o cuidado (10). Concluindo esta parte, pode- se dizer que “o ser-ai-no-mundo se define pelas formas ou maneiras de experienciar cuidado e pelas relações (de cuidado) que estabelece consigo mesmo, com os outros e com o meio que o cerca” (8: 37). A figu- ra abaixo representa, de forma gráfica o cuidado humano que para Waldow é com- preendido como uma forma de viver, de ser e de se expressar: ”Consiste em uma postura ética e estética frente ao mundo e contribuir com o bem-estar geral, na pre- servação da natureza, na promoção das potencialidades, da dignidade humana e da nossa espiritualidade; é contribuir na construção da história, do conhecimento, da vida” (8: 89). A figura é representada por círculos que se interconectam e por isso se apre- sentam por linhas abertas, tracejadas, que compõem o eu –ou self–, o outro e o cosmos. Estas dimensões são permea- das por elementos que variam: valores, conhecimento, felicidade, respeito, ética, entre outros. As linhas onduladas repre- sentam a dinamicidade dessas variáveis; constituem o fluxo energético entre as di- mensões e os elementos que variam. Figura 1. Representação gráfica do cuidado humano con- forme Waldow (6, 8). O cuidado na enfermagem Em sua trajetória, a enfermagem tem sido associada ao termo cuidar, assim como ao termo assistir. Os termos são utilizados de forma indiferenciada, mas al- gumas diferenças podem ser observadas (18). O cuidar é anterior à enfermagem e, através da história, se constata que havia uma estreita ligação com a prática religio- sa no sentido de oferecer conforto, tanto físico quanto espiritual, aos necessitados (pode-se dizer que mais espiritual), além de abrigo e alimento. Pessoas que se dedicavam a exercer práticas de carida- de tratavam também feridas; durante as guerras havia voluntários para cuidar dos guerreiros. Com a construção dos hospi- tais, se utilizavam pessoas sem formação para “cuidar” dos enfermos, e houve épo- ca em que estas pessoas, sendo as reli- giosas expulsas destes locais, eram de caráter duvidoso, prostitutas e bêbados. Esta época foi considerada o período ne- gro na enfermagem. Com o movimento reformista de Nig- htingale, o cuidar assume uma nova face. Higiene, a importância do ambiente, a pre- ocupação em fazer as ações com conhe- cimento são características que Florence Nigthingale imprimiu à enfermagem. As- sim mesmo, o comportamento e a atitude das enfermeiras eram caracterizados por uma dualidade: obediência, servilismo, docilidade, mas também autoritarismo. Com o advento da revolução indus- trial e da era científica, as especialidades médicas adquiriram uma importância re- fletida na enfermagem. Há uma idolatria pela técnica. A cura e as atividades de cuidar passam a ter privilégio. Importam aquelas atividades de cunho terapêutico, 90 AÑO 8 - VOL. 8 Nº 1 - CHÍA, COLOMBIA - ABRIL 2008 AQUICHAN - ISSN 1657-5997 enfocando a doença; a pessoa passa a ser secundarizada. Ações básicas de cuidar são menosprezadas e delegadas. A enfer- magem tenta auferir status se mirando no modelo biomédico e busca se caracterizar como ciência. A década de sessenta se caracteriza pelo início do desenvolvimento de teorias de enfermagem nos Estados Unidos e se propagam aos outros países. A maioria dessas teorias foi desenvolvida por enfer- meiras norte-americanas, com ênfase em aspectos biomédicos, como adaptação, ho- meostase, necessidades básicas. Algumas buscam apoio em outras áreas de conhe- cimento e seu enfoque predominante é o aspecto psicológico ou social. É comum, mesmo utilizando um enfoque oriundo do paradigma positivista, considerarem-se “holísticas”, o que revela ambigüidade e, inclusive, contradições. O processo de enfermagem é uma conseqüência das teo- rias, o que parece organizar o trabalho de enfermagem e lhe conferir prestígio. Algumas teorias propõem o cuidar como foco central, como as de Leininger (3), Wat- son (4) e de Boykin e Schoenhofer (19). Parece que a fase atual por que pas- sa a enfermagem é justamente discutir e questionar seu conhecimento adotando abordagens plurais. Há certa diversidade, embora o modelo norte-americano ainda exerça certa influência; a classificação por diagnósticos é uma delas. Contudo, já se observam peculiaridades próprias de cada país. As teorias e modelos fora dos Estados Unidos perdem o seu glamour (9). Uma tendência observada e já eviden- ciada nas abordagens das pesquisas mais recentes é a de um enfoque mais huma- nista na enfermagem. Observa-se uma tendência de privilegiar uma pluralidade de abordagens, o que equivale permitir que se discuta diferentes maneiras de pensar, fazer e ensinar enfermagem. Em conseqüência visualiza-se uma era de desafios, pois conduz os profissionais a conviverem com uma heterogeneidade de idéias nos processos de cuidar. O pluralismo, a diversidade, a inter- disciplinaridade são algumas das tônicas para o novo milênio e, entre elas, também o resgate do cuidado humano Contrariamente ao que algumas pes- soas pensam, o resgate do cuidado na enfermagem não é uma rejeição aos as- pectos técnicos, tampouco ao aspecto científico. O que se pretende ao relevar o cuidar é enfatizar a característica de processo interativo, assim como do com- ponente emocional, da intuição que carac- terizam a sua dimensão artística, além da dimensão moral que contém (6). Uma das dificuldades no cuidar ser aceito, em seu caráter humanístico, re- side na idéia de que, visto desta forma, não apresentaria características de cien- tificidade e de ações sistemáticas e tec- nologizadas que tragam “resultados per- tinentes”. No entanto, há quem rejeite a compreensão preconceituosa do cuidado que desqualifica o cuidar ao transmitir sentimentos (20). O cuidado compõe a linguagem da en- fermagem e ao visualizá-lo como um modo de ser, relacional e contextual, caracteriza- se por ser a única ação verdadeiramente independente da enfermagem. O cuidado não pode ser prescrito; terapêuticas, técni- cas, intervenções e procedimentos podem ser prescritos. Não se prescreve um modo de ser, não se ditam ou criam regras ou normas de cuidar, ou maneiras de se com- portar. Eles podem ser sugeridos, aconsel- hados, recomendados, não prescritos (8). Na enfermagem, o cuidar “compreen- de os comportamentos e atitudes demons- tradas nas ações que lhe são pertinentes e asseguradas por lei e desenvolvidas com competência no sentido de favore- cer as potencialidades das pessoas para manter ou melhorar a condição humana no processo de viver e morrer” (8: 87). Por competências entende-se as quali- dades necessárias ao desenvolvimento das atividades de enfermagem e se traduzem por conhecimento, habilidades e destreza manual, criatividade, sensibilidade, pen- samento crítico, julgamento e capacidade de tomada de decisão (veja-se represen- tação gráfica do processo de cuidar e sua descrição). Os comportamentos e as atitudes são entendidos como de cuidado e são com- postos por uma vasta lista, onde se des- tacam: respeito, gentileza, amabilidade, compaixão, responsabilidade, disponibili- dade, segurança, oferecimento de apoio, conforto (8). Momento de cuidar O cuidar implica um movimento em direção a algo ou alguém que é motivo de interesse ou preocupação. O exercí- cio de cuidar é, portanto, uma ação que possui direcionalidade concreta e deter- minada (14). É uma ação que nos move a fazer algo, que nos impulsiona. É uma ação moral que objetiva, como referido anteriormente, aliviar, satisfazer, ajudar, confortar, apoiar. A ação de cuidar tem sempre uma conotação para prover, favorecer o bem para outro ser. É, portanto, uma ação bastante peculiar. A finalidade é algo ou alguém que necessita a ação de cuidar; na enfermagem, do ser que padece, que 91 Atualização do cuidar se encontra carente, vulnerável. A vulne- rabilidade é uma condição que solicita o cuidado (14). A cuidadora responde a uma necessidade manifesta ou inferida; ocorre uma troca e o encontro de cuidar entre cuidadora e ser cuidado é sempre transformativo. O ser implica em algo mais do que sim- plesmente estar com. O estar com pode dar-se de forma a não haver um real en- volvimento, em não se caracterizar como verdadeira presença. Esta presença real, de corpo e alma, significa ser com. Cui- dar é um compromisso, é ajudar o outro ser a crescer promovendo sua integrida- de e unidade, mantendo sua dignidade, sua singularidade. O cuidado não é exatamente a técnica que se faz, o procedimento, por exemplo, um curativo, uma troca de decúbito. O que diferencia o cuidar de um procedimento é a preocupação, o interesse, a motivação, ex- pressos em um movimento, como já men- cionado. Consiste em um impulso que nos dirige no sentido de fazer algo para ajudar. Aí se realiza a ação. No caso de um proce- dimento, ela só se concretiza plenamente como cuidar na forma como é realizada a ação. Esta é interativa. Interage-se com o ser, seja através de palavras, de ges- tos, de olhares; há envolvimento não só no que se faz, mas também com a pessoa em quem se realiza a ação. Portanto, o que diferencia o cuidar é como se faz, ou seja, com gentileza, com respeito, com conside- ração, pois está se prestando uma ajuda a um ser humano que é digno de atenção e para quem se tem um compromisso, uma responsabilidade. Além disso, existe a in- tenção de promover o bem-estar, de man- ter o ser seguro e confortável, oferecendo apoio e minimizando os riscos, e reduzindo a sua vulnerabilidade. Existe um sentimen- to, é uma ação e uma atitude moral (9). Processo de cuidar Por processo de cuidar entende-se “todas as atividades desenvolvidas pela cuidadora para e com o ser cuidado com base em conhecimento científico, habili- dade, intuição, pensamento crítico, criati- vidade, acompanhadas de comportamen- tos e atitudes de cuidado no sentido de promover, manter e/ou recuperar sua dignidade e totalidade humanas. Essa dig- nidade e totalidade englobam o sentido de integridade e a plenitude física, mental, moral, emocional, social e espiritual nas fases do viver e do morrer, constituindo- Figura 2. Representação gráfica do processo de cuidar segundo Waldow (6, 8). se, em última análise, em um processo de transformação de ambos, cuidadora e ser cuidado” (8: 113). A seguir descreve-se o processo de cuidar, conforme visualizado pela autora (6, 8). Embora a figura privilegie o cuidado no contexto hospitalar, ele pode ser viabi- lizado em outros contextos e mesmo que não na sua íntegra, mas de acordo como a situação se apresentar no momento do encontro. A cultura organizacional é composta por variáveis ou fatores que influenciam 92 AÑO 8 - VOL. 8 Nº 1 - CHÍA, COLOMBIA - ABRIL 2008 AQUICHAN - ISSN 1657-5997 a forma como se processará o cuidado, as quais foram denominadas de compo- nentes da cultura organizacional. Entre os componentes destaca-se o meio am- biente organizacional, composto, por seu turno, pelo meio ambiente físico, o meio ambiente administrativo, o meio ambiente social e o meio ambiente tecnológico. Os dois primeiros constituem os componen- tes estruturais: o social, o componente afetivo, porque responde pela valorização do cuidado na instituição. O ambiente tec- nológico responde pela parte tecnológica, tão presente nos dias de hoje nas áreas de prevenção, diagnóstico e tratamento e, inclusive, do cuidado. Por meio ambiente físico, entende-se a estrutura física e suas condições: insta- lações adequadas, equipamentos e material suficiente e em condições de uso com se- gurança. Por meio ambiente administrativo entende-se a direção hospitalar e todas as chefias de serviços e equipes. Espera-se dos setores administrativos, a provisão de material e pessoal em todos os locais e níveis, de forma a favorecer o preparo e a atualização técnica e científica, visando à qualidade do atendimento. Inclui, ainda, apoio no planejamento e no desenvolvi- mento das atividades de enfermagem, um dos serviços com maior número de funcio- nários na prestação do cuidado. Por meio ambiente social, entende-se a socialização e valorização do cuidado, ou seja, o re- flexo, em todos os setores da instituição, de atitudes e relações harmônicas, ou de cuidado as quais são definidas em outro momento. Representa a polidez, a soli- citude, o respeito, a consideração, a boa vontade, o bom humor e a paciência no encaminhamento de todas as questões da organização. Por meio ambiente tecnoló- gico, entende-se todas as atividades que corroboram para o cuidado ao paciente e que incluem desde as de comunicação e informação na prevenção, diagnóstico e tratamento, como as de ajuda funcional e processamento de dados e pesquisa*. O momento de cuidar, como pode ser observado na figura, está representado por um movimento ondular, significando tempo e espaço indefinidos; é um movi- mento evolutivo, energético, transforma- tivo, por isso, estético. Para o cuidado ocorrer, a cuidadora primeiramente percebe a situação e o paciente como um todo. O pensamento crítico, representado pela reflexão, deve ser acionado. Ao refletir sobre a situação, alguns questionamentos e hipóteses são levantados; por exemplo, como se carac- teriza esta situação? Quem é este pacien- te? O que preciso saber sobre sua história e sua condição? Como posso ajudá-lo? Em seguida, a cuidadora identifica a necessidade de cuidado e verifica os meios disponíveis para que o mesmo se realize. Essa fase inclui desenvolvimento da inte- ração interpessoal; deve incluir iniciativas para oferecer um ambiente adequado (lim- peza, privacidade, segurança, condições térmicas adequadas, etc.) e expressar reconhecimento do paciente, sua família demonstrando aceitação que pode ser por intermédio de palavras, toques, olhares, gestos. A presença é importante, demons- trando segurança e eficiência no desem- penho das intervenções necessárias. Durante a ação, a cuidadora também deve se comunicar, mesmo que no silên- cio. A ação é também reflexiva. Enquanto desempenha a ação, levanta questões e hipóteses, que serão, ao mesmo tempo, acompanhadas de avaliação do que está ocorrendo no momento: Como se apresen- ta a situação? Os meios estão sendo ade- quados? Precisarei modificá-los? Como o paciente e sua família estão reagindo? O que mais posso fazer para tornar a situação, condição do paciente mais con- fortável? Durante e após a ação, a cuidadora checa a reação do paciente e, nessa fase a reflexão é bem mais objetiva. A cuidado- ra reflete sobre o que foi feito, como foi feito, quem executou a ação, as reações do paciente e condições do meio ambien- te, do material, assim como reflete tam- bém sobre seus valores e sentimentos em relação ao paciente e ao cuidado. Faz uma avaliação geral do evento e vê como se comportou cada componente envolvido: paciente, equipe de enfermagem, família, equipe de saúde. O objetivo dessa ava- liação reflexiva é auxiliar no aprendizado, na atualização dos cuidadores e na melho- ria do cuidado. As respostas e as atitudes em relação ao cuidado são analisadas para verificar se o paciente obteve algum benefício ou bem-estar. As ações de enfermagem de ordem técnica, planejadas pela própria en- fermagem ou prescritas pela equipe mé- dica, são avaliadas de forma objetiva, em geral por meio de reações físico-químicas de praxe, valores e níveis padronizados de monitorização das funções vitais e das in- formações obtidas pelo próprio paciente. As ações de ordem expressiva, tais como ações educativas, apoio emocional, conforto espiritual, entre outras, são ave- riguadas junto do próprio paciente ou da família e pela observação de sinais subjeti- vos, tais como: relaxamento muscular, dimi- nuição da dor, desconforto e ansiedade, ex- pressão facial e corporal, tom de voz, etc. De forma geral, o processo de cuidar envolve transformação de ambos: o ser cuidado e os cuidadores. No que se refere 93 Atualização do cuidar à cuidadora, o crescimento traduz-se por satisfação, sensação de dever cumprido, realização, melhora da auto-estima, mais segurança e confiança, prazer e bem-es- tar. Mesmo constatando que o cuidado possibilita crescimento para o ser cuidado e para a própria cuidadora, é freqüente esta vivencie estresse, o qual, dependen- do da situação, do envolvimento e da res- ponsabilidade, pode ser maior ou menor. Se as condições do meio ambiente não fo- rem favoráveis, pode haver insatisfação, e a vulnerabilidade aumenta, tornando a profissão fonte de frustração. Em relação ao ser cuidado, é possí- vel perceber que está vivenciando uma experiência única. Ele reflete sobre sua situação e vários questionamentos, dúvi- das e hipóteses são levantadas, mesmo que nem sempre verbalizadas: O que es- tou fazendo aqui? O que está acontecendo comigo? Estou com algo grave? O que fa- rão comigo? Como vou fazer com a minha família, minha casa, meu trabalho? Será que vai doer? Estas pessoas serão com- petentes? E assim por diante. A hospitalização é um evento bastan- te atemorizante para algumas pessoas. A doença é uma ameaça; o sentir-se doente ou estar doente caracteriza-se por uma ruptura na relação do ser humano com o mundo. O paciente se vê privado de uma série de elementos, inclusive de sua pró- pria identidade, privacidade e autonomia. A primeira fase que o ser cuidado apresenta, conforme pode ser acompan- hado pela figura, é a percepção de sua condição de paciente. A aceitação está relacionada à disponibilidade do paciente e à sua decisão de hospitalizar-se, aceitar o tratamento, o cuidado, a sua situação. Essa aceitação torna-se mais fácil se o paciente possuir conhecimento e for in- formado sobre seu estado, assim como na confiança que deposita em seus cuida- dores. O fato de aceitar o cuidado é uma decisão, não querendo significar que o paciente aceite passivamente tudo o que façam com ele. Nesse sentido, a colabo- ração é outro fator que pode denotar a aceitação ou não, e evidentemente depen- de do nível de compreensão, da consciên- cia, do quanto foi informado e solicitado para tal, assim como pela maneira como foi abordado e do seu desejo e motivação para vencer as adversidades. A resposta do ser cuidado pode ser observada através de vários sinais sub- jetivos, tais como queixas, dúvidas e perguntas, ou pelo silêncio, além das res- postas objetivas. A reflexão também está presente, assim como em todos os demais momentos, relacionada a dúvidas e ques- tões concernentes à sua futura condição e ao seu desempenho. O crescimento é considerado, por par- te do ser cuidado, uma atitude mais po- sitiva e serena frente às experiências de doença, perda, incapacidade ou morte. O conhecimento de si e de suas potenciali- dades traz melhor auto-estima, confiança em si e na situação que está vivenciando e coragem, trazendo auto-satisfação. Além desses, ocorre o alívio da dor, o conforto, a tranqüilidade, o relaxamento, a preser- vação da identidade, o bem-estar, entre outros. O sentir-se bem cuidado e acolhi- do irá influenciar, sobremaneira, para que a experiência se torne positiva, possibili- tando que o paciente enfrente melhor a sua situação. As variáveis circunstanciais do ser cui- dado constituem fatores importantes para que o processo de cuidar ocorra, e a cuida- dora deve ter, na medida do possível, conhe- cimento dessas variáveis ou circunstâncias. As expectativas incluem a história de vida do paciente, sua história de saúde, seus valores, hábitos, enfim, tudo aquilo que possa interessar para o processo de cuidar no momento. Porém, convém saber discernir que dados serão realmente ne- cessários, principalmente tendo em conta o tempo que se dispõe com o paciente. Mais importante de tudo é saber sobre as condições atuais e o que motivou a in- ternação, e como o paciente está se sen- tindo, ou seja, encorajando-o a verbalizar seus sentimentos e o que relaciona à sua condição atual. O conhecimento da cui- dadora sobre o paciente contribuirá para o processo de cuidar, influenciando as respostas do mesmo no presente, assim como a motivação e suas expectativas. O conhecimento do paciente é outra variável importante quanto a sua situação atual, seu tratamento e sobre os exames e procedimentos a que será submetido. Ao identificar que o paciente não está informado suficientemente, a enfermeira poderá sanar essa falha. A motivação é considerada como a disposição para ser cuidado, para ajudar, colaborando na medida do possível, e o seu desejo de crescer, incluindo desejo e vontade de viver, aumento de conheci- mento e aceitação frente ao inevitável, aos mistérios da vida e da morte. As expectativas e a motivação estão intimamente relacionadas ao conhecimen- to das experiências prévias do ser cuida- do: com saúde, doença, hospitalização e cuidadores. Elas podem ajudar ou dificul- tar o cuidado, e o seu conhecimento pode- rá auxiliar a amenizar estados de ansie- dade, medo e angústia no caso de terem sido negativas. Serenidade, bom humor, carinho, competência, entre outros, con- tribuem para as expectativas positivas e 94 AÑO 8 - VOL. 8 Nº 1 - CHÍA, COLOMBIA - ABRIL 2008 AQUICHAN - ISSN 1657-5997 como resultado, uma melhor aceitação e colaboração com respostas bem mais rá- pidas no sentido de restabelecimento. Os rituais de cuidado constituem os hábitos de saúde e de cuidado, de higiene corporal, mental e englobam os valores pessoais e aqueles que fazem parte de sua história, sua cultura; conhecê-los é importante para assegurar que o cuidado atual seja significativo e personalizado. A família é outra variável de extrema importância. Sua presença junto do pa- ciente e o seu carinho são fundamentais, e a equipe deve estar atenta, esclarecendo, informando, dando apoio, pois assim have- rá grande ajuda para o crescimento do ser cuidado. Famílias ansiosas, em função da gravidade da situação do paciente, ou por falta de informação, por vezes provocam reações negativas por parte da equipe de saúde e podem prejudicar o processo de cuidar. Na verdade, na maioria das vezes, a família também necessita de cuidado e pode, através de seu comportamento, es- tar expressando e solicitando isso. Se a organização valoriza o cuidado, pacientes e familiares reconhecem isso e comportam-se de forma bastante tranqüi- la, pois se sentem seguros, respeitados, informados e sabem que serão tratados com dignidade e consideração. As variáveis da cuidadora, são as com- petências, como pode se ver pela figura e incluem a motivação, a experiência, o con- hecimento, as habilidades técnicas, a capa- cidade para cuidar e o pensamento crítico. A motivação consiste no desejo de cuidar, nos valores, no comprometimen- to e na ética da cuidadora. Está bastante relacionada à experiência e pode ser in- fluenciada pelo meio ambiente da orga- nização, pelas relações, pela valorização e pelo apoio dado à enfermagem, assim como pela valorização do cuidado e pela remuneração, etc. A experiência é conformada pela ex- periência educacional acerca do cuidado, fornecida pela instituição formadora, que influenciará a maneira de cuidar; pelas experiências anteriores adquiridas em re- lação ao sistema de saúde, a relação com superiores imediatos e com a equipe, ou seja, o manejo com a autoridade; expe- riências prévias de cuidar (e também como ser cuidado, quando é o caso). No concer- nente ao tempo de prática, a experiência é relevante. Estreitamente relacionado a ela, menciona-se o desenvolvimento da intuição como um componente essencial. O conhecimento representa não só aque- le adquirido na academia, como também a relação deste com a experiência e o interesse em manter-se atualizada. As escolas fornecem o conhecimento básico, sendo sugerido que cuidadoras busquem a complementação do conhecimento, atualizando-o e aprimorando-o. A reflexão que ocorre antes, durante e após a ação de cuidar revela esse comprometimento com o conhecimento. A cuidadora, a cada novo encontro, se enriquece e sua experiência torna-se mais rica, pois cada ser é um universo com sin- gularidades próprias. Por isso é importan- te cuidar fora dos parâmetros do modelo tradicional, das estandardizações e classi- ficações, para perceber que cada ser rea- ge à experiência vivida e não à patologia e a ela de forma bastante peculiar. As habilidades técnicas compõem uma das competências com a qual a cuidadora está bastante familiarizada. No entanto, vale lembrar que realizar procedimentos no paciente é diferente de realizar proce- dimentos para e com o paciente, intera- gindo com o mesmo. A capacidade para cuidar inclui o au- toconhecimento da cuidadora. Somente com o conhecimento do que se é pode-se mostrar o que se quer ser. Em adição a isso, o autoconhecimento favorece con- hecer o outro ser. Outras capacidades envolvem a responsabilidade, a obrigação moral e a energia. As cuidadoras neces- sitam de energia para cuidar, pois, além de se fortalecerem a si próprias, podem atuar como meios facilitadores para mobi- lizar as energias dos pacientes e de seus familiares. A honestidade é um atributo importante que capacita para o cuidado, além de sentimentos; entre estes, pode- se mencionar a compaixão, o amor, o res- peito, a tolerância e a solidariedade. O pensamento crítico é uma compe- tência que se sugere que seja desenvolvi- da no período de formação, contudo pode também ser desenvolvida em qualquer momento. O pensamento crítico compre- ende a capacidade de questionar, anali- sar, emitir hipóteses, refletir e criticar al- ternativas, além de facilitar a criatividade, a flexibilidade, a confiança e a intuição. Relações de cuidado O sucesso no processo de cuidar deve-se, em grande parte, às relações de cuidado que são travadas em todas as instâncias da cultura organizacional, ou seja, desde a recepção até a unidade de internação e em todos os setores. Englo- ba não só as relações entre cuidadora e ser cuidado, mas de todas as pessoas que entram em contato com o paciente e sua família, assim como entre as equipes (7). As relações de cuidado compreendem “aquelas que se distinguem pela expres- são de comportamentos de cuidar, que as pessoas compartilham, tais como con- 95 Atualização do cuidar fiança, respeito, consideração, interesse, atenção, entre outros” (7: 133). As relações de cuidado podem se ca- racterizar por relações em nível de sujei- to-sujeito e sujeito-isto ou sujeito-coisa, considerando-se que não se cuida ape- nas de pessoas, mas de coisas, objetos, animais, plantas. As relações de cuidado na dimensão sujeito-sujeito podem se apresentar de duas formas: sujeito-self e sujeito-outro. O sujeito-self se caracteri- za pelo cuidado pessoal e compreende o cuidar de si. Esse cuidar de si inclui o con- hecimento de si, de suas potencialidades, necessidades e limitações. Compreende também o cuidar da saúde, do espírito, do intelecto, de seu tempo, do lazer e assim por diante. Ainda no âmbito pessoal ou privado, encontra-se a forma de relação sujeito-outro e que incluem as relações genuínas ou de cuidado natural e que se caracterizam por relacionamentos mais íntimos, com a família e amigos. A forma de relação sujeito-outro pode ser de tipo social ou público e compreen- de as relações dirigidas a pessoas com as quais não existe nenhum vínculo de paren- tesco ou afetivo, mas nelas se evidenciam o respeito, a consideração e a solidarieda- de, por exemplo. Também neste tipo de re- lação encontram-se as relações de cuida- do profissional, caracterizadas por ocorrer entre ser que necessita de cuidado e ser que tem, legalmente, a obrigação moral de cuidar, implicando um comportamento de responsabilidade e o uso de conhecimento e habilidades aprendidas formalmente em uma instituição formadora. Pode ocorrer uma forma de relação sujeito-objeto e nesta, o ser que cuida não estará visualizando o ser cuidado como um ser integral, genuíno e digno. Nesta forma pode ocorrer uma relação de não cuidado, já que o ser está sendo conside- rado um objeto. Ao se criarem relações de cuidado e ao serem exercitadas, cria-se automaticamen- te, um ambiente ou clima de cuidado, no qual os valores de cuidado são enaltecidos. Em um ambiente de cuidado, “as pessoas sentem-se bem, reconhecidas e aceitas como são; conseguem se expressar de for- ma autêntica e se preocupam umas com as outras no sentido de atualizar informações, fornecendo e trocando idéias, oferecendo apoio e ajuda e se responsabilizando e comprometendo com a manutenção desse clima de cuidado” (7: 131-2). Considerações finais Exposto neste artigo, uma síntese das idéias da autora acerca do cuidado huma- no, processo de cuidar e cuidado em en- fermagem. O cuidado humano é visto como uma forma de cuidar que os seres humanos ex- pressam, consigo mesmos, entre si e com o Universo. Para a autora o ato de cuidar humaniza o ser, significando com isso, que é através do cuidado que o ser se distin- gue como humano. O cuidado, visto dessa forma, pressupõe valores e elementos que são imprescindíveis no sentido de ser exercido de forma plena, tais como o res- peito pelo outro, pela Natureza, pela vida, a compaixão, a solidariedade, entre outros que compõem atitudes éticas. Também são imprescindíveis a busca, a criação e o aprimoramento do conhecimento, a valo- rização da cultura e da história, o amor, a fraternidade, e assim por diante. Na enfermagem o cuidado se profissio- naliza e é exercido, tendo em vista aquilo que é previsto por lei e engloba uma série de competências, entre as quais: habili- dades manuais ou técnicas, pensamento crítico, além de conhecimento e intuição. Contudo, estas competências não são su- ficientes para que o profissional seja um verdadeiro cuidador, dado que ele neces- sita um componente afetivo, relacional, de maneira que interaja, se relacione com o ser cuidado, seja através de palavras, seja através do silêncio, por meio do toque, de um olhar, de um gesto. O cuidado prescinde a preocupação, o interesse, o envolvimento, a solicitude, conforme Martin Heidegger. Como visto no texto, a ação de cuidar tem, ou deveria ter sempre, uma conotação no sentido de prover, de favorecer o bem para o outro ser. É necessário, todavia, dis- cernir o que é melhor para o paciente, pois nem sempre coincide com o que ele gos- taria. Por vezes, a necessidade de cuidado não é reconhecida pelo ser e quem está próximo ou habilitado para cuidar identifica a necessidade e se movimenta em direção à satisfação da mesma. Para que o cuidado ocorra é necessário “consciência de cuida- do” (9). A consciência de cuidado engloba discernimento, intuição, pensamento críti- co, decisão e sensibilidade. O ser que cuida precisa conquistar a confiança do paciente para que ele aceite e colabore no cuidado. Como também apresentado no texto, o cuidado, no seu real sentido, promove o crescimento de ambos: o ser que cuida e o ser que é cuidado. Na enfermagem, o cuidado como sua ação primordial, pode ser considerado sua essência. 96 AÑO 8 - VOL. 8 Nº 1 - CHÍA, COLOMBIA - ABRIL 2008 AQUICHAN - ISSN 1657-5997 REFERÊNCIAS 1. Waldow VR. Cuidado: uma revisão teórica. Rev Gaúcha de Enferm 1992; 13(2): 29-35. 2. Waldow VR. Cuidar/cuidado: o domínio unificador da enfermagem. In: Waldow VR et al., organizado- res. Maneiras de cuidar, maneiras de ensinar: a en- fermagem entre a escola e a prática profissional. Porto Alegre: Artes Médicas; 1995. p. 7-30. 3. Leininger M. Culture care diversity and universal- ity: a theory of nursing. New York: National League for Nursing; 1991. 4. Watson J. Nursing: human science and human care. A theory of nursing. New York: National League for Nursing; 1988. 5. Roach SS. The human act of caring: a blueprint for the health professionals. Ottawa: Canadian Hospi- tal; 1993. 6. Waldow VR. Cuidado humano: o resgate necessário. Porto Alegre: Sagra Luzzatto; 1998. 7. Waldow VR. 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