339 - 350 Violencia fisica por parceiro.indd 339 Jenny Karol Gomes Sato Sgobero1 Lorenna Viccentine Coutinho Monteschio2 Robsmeire Calvo Melo Zurita3 Rosana Rosseto de Oliveira4 Thais Aidar de Freitas Mathias5 Violência física por parceiro íntimo na gestação: prevalência e alguns fatores associados 1 Enfermeira. Mestre em Enfermagem. Secretaria Municipal de Saúde. jenny-sato@hotmail.com 2 Enfermeira. Mestre em Enfermagem. Hospital Universitário Regional de Maringá. Brasil. helorenn@hotmail.com 3 Enfermeira. Doutoranda. Programa de Pós-graduação em Enfermagem da Universidade Estadual de Maringá (UEM), Maringá. Brasil. Secretaria Municipal de Saúde. robszurita@bol.com.br 4 Enfermeira. Doutoranda. Programa de Pós-graduação em Enfermagem da UEM, Maringá. Brasil. rosanarosseto@gmail.com 5 Enfermeira. Doutora em Saúde Pública. Professora Titular do Departamento de Enfermagem e do Programa de Pós-graduação em Enfermagem da UEM, Maringá. Brasil. tafmathias@uem.br Recibido: 07 de octubre de 2014 Enviado a evaluadores: 15 de noviembre de 2014 Aceptado por evaluadores: 20 de abril de 2015 Aprobado: 21 de abril de 2015 DOI: 10.5294/aqui.2015.15.3.3 Para citar este artículo / To reference this article / Para citar este artigo Sgobero JKGS, Monteschio LVC, Zurita RCM, Oliveira RR, Mathias TAF. Violência física por parceiro íntimo na gestação: prevalência e alguns fatores associados. Aquichan. 2015; 15(3): 339-350. DOI: 10.5294/aqui.2015.15.3.3 Resumo Identificar alguns fatores associados com a violência física por parceiro íntimo na gestação. Estudo transversal, com 358 puérperas residentes no município de Maringá (Paraná), atendidas pelo Sistema Único de Saúde, em que foi utilizado o instrumento World Health Organization Violence Against Women. A análise de associação foi realizada por meio do Odds Ratio OR. A prevalência da violência física por parceiro íntimo na gestação foi de 7,5%, sendo maior entre as multigestas (89%; OR = 6,3; p<0,001). Houve associação significativa da violência física por parceiro íntimo na gestação com não ter religião (OR = 3,1; p = 0,008), ter fumado na gestação (OR = 2,7, p = 0,025) e ter filhos de outro parceiro (OR = 3,4; p = 0,011). Com relação às características do companheiro, houve associação com o companheiro não ter trabalhado durante a gestação (OR = 8,2; p<0,001) e uso de drogas ilícitas (OR = 3,1, p = 0,031). Os profissionais de saúde que atendem no pré-natal devem investigar possíveis ocorrências de violência física na gestação, principalmente em mulheres multigestas, e oferecer atenção multidisciplinar extensiva à família, do planejamento familiar ao cuidado psicossocial. PalavRas-cHave Violência contra a mulher, gestação, saúde da mulher, maus-tratos conjugais, violência doméstica (Fonte: DeCS, BIREME). AÑO 15 - VOL. 15 Nº 3 - CHÍA, COLOMBIA - SEPTIEMBRE 2015 l 339-350 340 AQUICHAN - ISSN 1657-5997 AÑO 15 - VOL. 15 Nº 3 - CHÍA, COLOMBIA - SEPTIEMBRE 2015 l 339-350 Violencia física por el compañero íntimo en el embarazo: prevalencias y algunos factores asociados Resumen Identificar algunos factores asociados a la violencia física por compañero íntimo en el embarazo. Estudio trasversal con 358 puérperas habitantes del municipio de Maringá (Paraná, Brasil), atendidas por el Sistema Único de Salud, en el que se utilizó el instrumento World Health Organization Violence Against Women. El análisis de asociación se realizó por medio del Odds Ratio (OR). La prevalencia de la violen- cia física por compañero íntimo en el embarazo fue de 7,5 %, siendo mayor entre las multigestas (89 %; OR = 6,3; p<0,001). Hubo asocia- ción significativa de la violencia física por compañero íntimo en el embarazo con no tener religión (OR = 3,1; p = 0,008), haber fumado en el embarazo (OR = 2,7, p = 0,025) y haber tenido hijo de otra pareja (OR = 3,4; p = 0,011). En relación con las características de la pareja, hubo asociación con el no haber trabajado durante el embarazo OR = 8,2; p<0,001) y el uso de drogas ilícitas (OR = 3,1, p = 0,031). Los profesionales de salud que atienden en el prenatal deben investigar posibles ocurrencias de violencia física en el embarazo, sobre todo en mujeres multigestas, y ofrecer atención multidisciplinaria extensiva a la familia, desde la planeación hasta el cuidado psicosocial. PalabRas clave Violencia en contra de la mujer, embarazo, salud de la mujer, maltratos conyugales, violencia doméstica (Fuente: DeCS, BIREME). 341 Violência física por parceiro íntimo na gestação: prevalência e alguns fatores associados l Jenny Karol Gomes Sato Sgobero e outros Intimate Partner Violence Perpetrated during Pregnancy: Prevalence and Several Associated Factors abstRact The purpose of this research was to identify some of the factors associated with intimate partner violence perpetrated during preg- nancy. This is a cross-sectional study of 358 puerperae residing in the city of Maringa (Parana, Brazil), who were being served by the Uni- fied Health System. The World Health Organization Violence against Women Instrument was used. An association analysis was performed using the Odds Ratio (OR). The prevalence of intimate partner physical violence during pregnancy was 7.5%, being higher among women who have had multiple pregnancies (89%; OR = 6.3; p < 0.001). A significant association was found between intimate partner physical violence during pregnancy and lack of religion (OR = 3.1; p = 0.008), smoking during pregnancy (OR = 2.7, p = 0.025) and having had a child with another partner (OR = 3.4; p = 0.011). As for the characteristics of the couple, there was an association with the male partner not having worked during the pregnancy (OR = 8.2; p <0.001) and with the use of illicit drugs (OR = 3.1, p = 0.031). Health professio- nals who provide prenatal care should investigate possible instances of physical violence during pregnancy, especially among women who have had multiple pregnancies, and offer extensive multidisciplinary care for the family, ranging from planning to psychosocial assistance. KeywoRds Violence against women, pregnancy, women’s health, spousal abuse, domestic violence (Source: MeSH, NLM). AÑO 15 - VOL. 15 Nº 3 - CHÍA, COLOMBIA - SEPTIEMBRE 2015 l 339-350 342 AÑO 15 - VOL. 15 Nº 3 - CHÍA, COLOMBIA - SEPTIEMBRE 2015 AQUICHAN - ISSN 1657-5997 Introdução A gestação é um período em que as mulheres enfrentam muitas mudanças, podendo ser uma fase vulnerável quanto às condições psicológicas, de autonomia e algumas vezes financeira, possibilitando uma predisposição à violência ou ao seu agrava- mento (1). Tem sido relatado que o maior perpetrador de violên- cia contra mulher é o seu parceiro íntimo (2, 3), como expressão da dominação masculina representada por indicadores como o ciúme doentio, o controle e o isolamento da mulher de seu am- biente social (4). A maioria dos países apresenta prevalências de violência físi- ca cometidas por parceiro íntimo na gestação entre 2% e 13,5%, com maior predomínio nos países da África e da América Lati- na (5). O menor índice encontrado foi de 2% em países como a Austrália, Dinamarca, Camboja e Filipinas e os maiores foram de 10,6% na Colômbia, 11,1% na Nicarágua e 13,5% na Uganda (5). As mulheres que sofrem violência física na gestação geralmen- te apresentam escolaridade e renda familiar baixa, referem não ter apoio paterno durante a gestação, e frequentemente iniciam o pré-natal tardiamente (6). As complicações da violência para a saúde da mulher vão desde a depressão, vícios nocivos como o uso de álcool, de tabaco e de drogas ilícitas, até o baixo peso ao nasci- mento, prematuridade e desfechos fatais para a mãe e o feto (6). Apesar de a literatura demonstrar como a violência atinge ne- gativamente a gestação para a saúde da mãe e do concepto, ain- da existe uma invisibilidade social desse fenômeno (7) que pode ser minimizada com a realização de estudos sobre esse tema. Identificar a ocorrência de episódios de violência, as característi- cas das mulheres na gestação e de seus companheiros são pos- síveis abordagens que podem contribuir para elaboração de uma assistência mais adequada (8). A análise da violência contribui para legitimar esse agravo como um problema para a área da saúde pública, e necessita ser abordado tanto como tema de pes- quisa como na assistência (9), a fim de suprir a lacuna existente no conhecimento envolvendo a violência física por parceiro íntimo durante a gestação. Assim, foi objetivo deste estudo identificar os fatores asso- ciados à violência física por parceiro íntimo na gestação, em um município de médio porte da região sul do Brasil. Materiais e métodos Trata-se de um estudo transversal com puérperas residentes em Maringá, Paraná, internadas em unidade de alojamento con- junto de dois hospitais de referência do Sistema Único de Saúde —SUS—. A amostra foi calculada considerando os 2.178 partos finan- ciados pelo SUS em residentes no município no ano de 2011, com um nível de confiança de 95% e margem de erro de 4%. A amostra foi composta por 358 puérperas, já considerados 10% para possí- veis perdas. Como não foram identificados estudos na região ou no estado do Paraná sobre violência à mulher na gestação, a pre- valência estimada de 20% foi fundamentada em estudo realizado na cidade do Rio de Janeiro (6) que avaliou a violência física por parceiro íntimo durante a gestação como fator de risco para a má qualidade da assistência pré-natal. A participação de puérperas nesta pesquisa foi voluntária e foram incluídas puérperas em qualquer idade, com conceptos acima de 500g, que estivessem internadas em unidade de aloja- mento conjunto e em condições físicas e mentais para responder ao questionário. O período de coleta de dados ocorreu de 21 de dezembro de 2012 a 6 de abril de 2013 por meio de entrevista às puérperas. A variável dependente foi a ocorrência de Violência Física por Parceiro Íntimo —VFPI— durante a gestação atual ou em ges- tações anteriores investigadas por meio da seguinte pergunta às mulheres: “Houve alguma ocasião na vida em que você foi agre- dida fisicamente por seu companheiro quando estava grávida?”. Foi utilizado o questionário World Health Organization Violence Against Women —WHO VAW—, instrumento multidimensional de pesquisa validado no Brasil (10), sendo acrescentadas outras perguntas também pertinentes ao tema de estudo. As variáveis selecionadas como possíveis fatores associados à violência física durante a gestação contemplaram característi- cas socioeconômicas, hábitos da mãe, antecedentes obstétricos e reprodutivos, e características e hábitos do companheiro atual. As variáveis socioeconômicas pesquisadas foram: idade (10 a 19 anos, 20 a 34 anos e > 35 anos), escolaridade (1 a 4 anos de estudo, 5 a 8 anos de estudo, 9 a 11 anos de estudo e > 12 anos de estudo), ter companheiro (sim ou não), ocupação (do lar/ 343 Violência física por parceiro íntimo na gestação: prevalência e alguns fatores associados l Jenny Karol Gomes Sato Sgobero e outros estudante, carteira assinada, autônoma), raça/cor (preta/parda, branca/amarela) e renda familiar (<3 salários-mínimos e > 3 salários-mínimos). Com relação às variáveis dos hábitos da mãe foram questio- nadas: religião (católica, evangélica, outra e nenhuma), ingesta de bebida alcoólica na gestação, tabagismo na gestação e uso de drogas (todas dicotomizadas em sim ou não). Os antecedentes obstétricos e reprodutivos analisados no es- tudo tiveram as seguintes variáveis dicotomizadas (sim ou não): óbito fetal, aborto, filho prematuro, filho com baixo peso ao nasci- mento, recusa do uso de camisinha, filho de outro pai. A variável idade da primeira relação sexual foi categorizada em <16 anos e ≥16 anos, e a paridade em multigesta e primigesta. Foram investigadas também características e hábitos do com- panheiro atual. As variáveis foram: idade (10 a 19 anos, 20 a 34 anos e ≥35 anos), escolaridade (1 a 4 anos de estudo, 5 a 8 anos de estudo, 9 a 11 anos de estudo e ≥12 anos de estudo), frequên- cia da ingesta de bebida alcoólica (todos ou quase todos os dias, 1 vez na semana, 1 ou duas vezes ao mês, nunca). As variáveis trabalho na gestação, desejava a gestação atual da parceira e uso de drogas foram dicotomizadas em sim e não. Os dados foram tabulados e organizados em planilha eletrô- nica do programa Excel versão 2007, com dupla digitação inde- pendente. Após a verificação de erros e inconsistências, os dados foram analisados por meio de técnicas de estatística descritiva utilizando o software Statística 7. Para o teste qui-quadrado foi utilizado o software Epi Info 7, considerando α=5%. Foi utilizado o Odds Ratio —OR— para mensurar a magnitude da associação entre as variáveis e seu respectivo intervalo de confiança —IC—. A coleta de dados foi realizada por duas enfermeiras capa- citadas previamente. Foi realizado estudo piloto prévio e obser- vadas todas as recomendações éticas e de segurança para a realização de estudos que abordam a violência doméstica contra a mulher (11). As entrevistas foram realizadas em uma sala dos hospitais reservada para esse fim, com o objetivo de garantir privacida- de à mulher, com duração média da entrevista de aproximada- mente 40 minutos. Após a entrevista, foi entregue a todas as puérperas um folheto com os locais de referência no município para assistência em situações de violência, constando o nome das instituições, endereços e telefones, seguido de orientações complementares. O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa En- volvendo Seres Humanos da Universidade Estadual de Maringá, sob o Parecer 170.704/2012. Todas as participantes assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, cumprindo os re- quisitos da Resolução 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. Resultados Das 358 puérperas entrevistadas 27 (7,5%) relataram algum episódio de violência física por parceiro íntimo durante a gestação. Houve associação significativa da violência física na gestação com relato de ser multigesta, não ter religião e ter fumado durante a gestação (OR = 6,3; p=0,001; OR = 3,1; p = 0,008; OR = 2,7, p = 0,025; respectivamente) (tabela 1). Verificou-se que das 27 mulheres que relataram violência fí- sica durante a gestação, 89% eram multigestas (OR = 6,3; p < 0,001). Assim, a partir dessa constatação, e considerando as diferenças entre multigestas e primigestas quanto ao seu per- fil e desfechos maternos e perinatais (12), a análise da tabela 2 foi realizada considerando o grupo de mulheres que já tinham pelo menos uma gestação anterior. Para a análise da tabela 3 considerou-se somente as mulheres que relataram a presença de companheiro, independentemente da paridade. A tabela 2 mostra que para as mulheres multigestas a VFPI na gestação esteve associada com o fato de a mulher ter um ou mais filhos de outro companheiro que não o atual (OR = 3,4; p = 0,011). Ressalta-se ainda que a violência física foi mais frequente para al- guns desfechos indicativos de risco obstétrico, tais como o óbito fetal, aborto e filhos anteriores nascidos com baixo peso, como também o início da atividade sexual antes dos 16 anos de idade e a recusa do uso de camisinha pelo parceiro. Quanto às características do companheiro, houve asso- ciação da violência física durante a gestação com o fato de o companheiro não ter trabalhado durante a gestação (OR = 8,2; p < 0,001) e ter usado ou usar drogas ilícitas (OR = 3,1, p = 0,031) (tabela 3). 344 AÑO 15 - VOL. 15 Nº 3 - CHÍA, COLOMBIA - SEPTIEMBRE 2015 AQUICHAN - ISSN 1657-5997 Tabela 1. Violência física na gestação segundo características socioeconômicas, hábitos maternos e paridade. Maringá, PR, Brasil, 2012-2013 Violência na gestação Sim (n=27) Não (n=331) Características n % n % OR IC p* Idade 0,704 10 a 19 3 4,4 65 95,6 0,8 0,1-4,9 20 a 34 22 8,7 232 91,3 1,6 0,4-7,2 ≥35 2 5,6 34 94,4 - Escolaridade 0,160 1 a 4 anos 2 15,4 11 84,6 4,4 0,3-53,4 5 a 8 anos 12 9,8 110 90,2 2,6 0,3-21,1 9 a 11 anos 12 6,1 186 93,9 1,5 0,2-12,4 ≥12 anos 1 4,0 24 96,0 - Companheiro 0,954 Sim 24 7,6 293 92,4 1 0,29-3,61 Não 3 7,3 38 92,7 - Ocupação 0,912 Do lar/estudante 11 7,8 130 92,2 1 0,3-3,3 Carteira assinada 4 7,8 47 92,2 - Autônoma 12 7,2 154 92,8 0,9 0,3-2,3 Raça/cor 0,749 Preta/parda 14 8,0 161 92,0 1,1 0,5-2,5 Branca/amarela 13 7,1 170 92,9 - Renda** 0,180 < 3 salários 22 8,8 229 91,2 2 0,7-5,3 ≥ 3 salários 5 4,7 102 95,3 - Religião 0,008 Católica 6 4,2 136 95,8 - Evangélica 11 8,3 122 91,7 2 0,7-5,7 Outras 1 11,1 8 88,9 2,8 0,3-26,4 Nenhuma 9 12,2 65 87,8 3,1 1,1-9,2 Tabagismo 0,025 Sim 8 17,4 38 82,6 2,7 1,1-6,5 Não 19 6,1 293 93,9 - 345 Violência física por parceiro íntimo na gestação: prevalência e alguns fatores associados l Jenny Karol Gomes Sato Sgobero e outros Tabela 2. Violência física na gestação em multigestas segundo antecedentes obstétricos e reprodutivos. Maringá-PR, Brasil, 2012-2013 *Teste Qui-quadrado. A significância estatística foi fixada em p≤0,05. **Renda familiar baseada em no salario-mínimo no Brasil em 01/01/2013: R$678,00. Violência na gestação Sim (n=27) Não (n=331) Características n % n % OR IC p* Ingesta de bebida alcoólica 0,0 0,628 Sim 3 5,9 48 94,1 0,7 0,2-2,5 Não 24 7,8 283 92,2 - Uso de drogas 0,385 Sim 2 13,3 13 86,7 2 0,4-9,1 Não 25 7,3 318 92,7 - Paridade 0,001 Multigesta 24 11,5 185 88,5 6,3 1,9-21,4 Primigesta 3 2,0 146 98,0 - Violência na gestação Sim (n=24) Não (n=185) n % n % Total OR IC p * Óbito fetal 0,130 Sim 3 25,0 9 75,0 12 2,8 0,7-11,1 Não 21 10,7 176 89,3 197 - Aborto 0,595 Sim 8 13,3 52 86,7 60 1,3 0,5-3,2 Não 16 10,7 133 89,3 149 - Filhos prematuros 0,494 Sim 1 6,3 15 93,7 16 0,5 0,1-3,9 Não 23 11,9 170 88,1 193 - Filhos baixo peso 0,562 Sim 2 16,7 10 83,3 12 1,6 0,3-7,7 Não 22 11,2 175 88,8 197 - Idade da primeira relação sexual 0,599 <16 12 12,8 82 87,2 94 1,3 0,5-2,9 ≥16 12 10,4 103 89,6 115 - 346 AÑO 15 - VOL. 15 Nº 3 - CHÍA, COLOMBIA - SEPTIEMBRE 2015 AQUICHAN - ISSN 1657-5997 Tabela 3. Violência física na gestação em multigestas segundo características e hábitos do companheiro. Maringá-PR, Brasil, 2012-2013 Violência na gestação Sim (n=24) Não (n=185) n % n % Total OR IC p * Recusa uso de camisinha** 0,503 Sim 6 15,4 33 84,6 39 1,4 0,5-4,0 Não 13 11,3 102 88,7 115 - Filhos de outro pai*** 0,011 Sim 16 17,8 74 82,2 90 3,4 1,3-9,2 Não 6 5,9 95 94,1 101 - *Teste Qui-quadrado. A significância estatística foi fixada em p≤0,05. **Cinco mulheres não quiseram informar sobre a aceitação do uso de camisinha pelo parceiro. *** Duas mulheres não quiseram informar sobre a existência de filhos de outro pai. Violência na gestação Sim (n=24) Não (n=293) N % N % Total OR IC p * Idade 0,936 10 a 19 - - 20 100,0 20 - 20 a 34 19 8,0 218 92,0 237 1,0 0,3-2,7 ≥35 5 8,3 55 91,7 60 - Escolaridade 0,634 1 a 4 anos - - - - - - - 5 a 8 anos 8 6,6 113 93,4 121 0,7 0,1-3,4 9 a 11 anos 14 8,2 157 91,8 171 0,8 0,2-4,0 ≥12 anos 2 9,5 19 90,5 21 - Trabalho na gestação 0,001 Não 3 37,5 5 62,5 8 8,2 1,8-36,8 Sim 21 6,8 288 93,2 309 - Desejava esta gestação 0,353 Não 11 10,1 99 90,8 109 1,5 0,63-3,5 Sim 13 6,3 194 94,2 206 - 347 Violência física por parceiro íntimo na gestação: prevalência e alguns fatores associados l Jenny Karol Gomes Sato Sgobero e outros Discussão A prevalência de violência física na gestação encontrada nes- te estudo foi de 7,5%, valor semelhante aos resultados descritos em pesquisa realizada com puérperas em uma maternidade no ABC paulista, estado de São Paulo com prevalência de 7,6% para gestantes e puérperas em duas maternidades públicas munici- pais (13). Menor prevalência foi encontrada em estudo com ges- tantes em atendimento de consultas de pré-natal na rede pública de saúde em Campinas, São Paulo, com 5,7% (14). Por outro lado, a prevalência de 7,5% deste estudo foi inferior à verificada na cidade do Rio de Janeiro (20%) (6), resultado de estudo realizado em três hospitais públicos daquele município. Essa diferença na prevalência de violência física na gestação, en- tre as mulheres residentes em Maringá e no município do Rio de Janeiro, mostra, em primeiro lugar, a necessidade de que estu- dos desta natureza sejam realizados em diferentes regiões e mu- nicípios do país, pois as condições de vida, de acesso a serviços públicos e as condições socioeconômicas diferenciadas influen- ciam nesses resultados. Por outro lado, é importante considerar que essas diferenças podem estar associadas a características da região relativas a investimentos em políticas públicas de incen- tivo às denúncias, maior disponibilidade de serviços de referência às mulheres e suas famílias, investimentos em campanhas de di- vulgação que possibilitem maior visibilidade desse agravo, e tam- bém mudança de valores e a conscientização por parte da mulher, acerca de seus direitos. Esses fatores podem propiciar melhoria nas notificações dos casos e das formas de monitoramento de tal tipo de evento, acentuando as diferenças observadas nas preva- lências de violência física na gestação. Destaca-se ainda que esse diferencial nas prevalências de violência física na gestação pode refletir o uso de diferentes ins- trumentos de pesquisa para identificação dos casos, além de con- textos historicamente construídos por ideologias que legitimam e classificam homens e mulheres com papéis sociais desiguais e com relações assimétricas de dominação masculina (15). Esses fatores devem ser considerados quando os resultados das pesqui- sas são comparados entre si. Assim, enfatiza-se que os profissio- nais de saúde devem estar cientes da real situação desse agravo no seu município para melhor orientar suas ações junto à comuni- dade em geral, e no atendimento ao pré-natal em particular. Considerando que a violência raramente inicia-se durante a gestação, já que com frequência configura-se um padrão regular e sistemático de relacionamento do casal, é fundamental que o tema seja abordado desde a primeira consulta de pré-natal nos serviços de saúde, buscando-se identificar as famílias que viven- ciaram conflitos conjugais, mesmo antes da atual gestação. Da mesma forma, identificar situações de violência deveria fazer parte da rotina de internação e atendimentos das maternidades, especialmente quanto às gestantes que iniciaram tardiamente e/ ou tiveram um número reduzido de consultas pré-natais (6). *Teste Qui-quadrado. A significância estatística foi fixada em p≤0,05. Violência na gestação Sim (n=24) Não (n=293) N % N % Total OR IC p * Ingesta de bebida alcoólica 0,169 Todos/quase todos os dias 2 8,0 23 92,0 25 0,8 0,2-3,8 Uma vez na semana 6 5,4 105 94,6 111 0,5 0,2-1,4 Uma ou duas vezes no mês 4 6,8 55 93,2 59 0,7 0,2-2,2 Nunca 12 9,9 110 90,2 122 - Uso de drogas 0,031 Sim 5 17,9 23 82,1 28 3,1 1,1-9,0 Não 19 6,6 270 93,4 289 - 348 AÑO 15 - VOL. 15 Nº 3 - CHÍA, COLOMBIA - SEPTIEMBRE 2015 AQUICHAN - ISSN 1657-5997 Ao interpretar os resultados aqui apresentados devem-se considerar ainda as dificuldades em abordar o tema da violência por parceiro íntimo. Existe a possibilidade de graus variados de constrangimento da mulher ao assumir ter sido vítima de alguma violência, fato que depende tanto da sua percepção do que seja a violência, quanto da coragem de confirmar algo que para ela pode ser humilhante e embaraçoso. Assim, é possível que todos esses fatores contribuam para a variabilidade das prevalências em diferentes cenários socioculturais e municípios diversos. A religião foi um fator com associação significativa à ocorrên- cia de violência física na gestação. As mulheres que relataram ter alguma religião apresentaram menor prevalência de VFPI na gestação do que as mulheres que disseram não ter religião, asso- ciação importante que deve ser considerada e melhor explorada em futuras pesquisas. É necessário ponderar, entretanto que a religião constitui uma variável de interpretação difícil por envolver dogmas religiosos que interferem no relato da violência. Assumir não ter religião pode ser tabu na sociedade cristã, e assumir ser vítima de violência também pode ter esse caráter. Tal fato deve ser considerado como possível dificuldade da mulher que relata ter religião admitir a ocorrência de violência pelo parceiro. A violência física mostrou associação com o tabagismo da mulher durante a gestação, o que pode ter algumas interpre- tações como uma possível perda da autoestima que leva a mulher a adquirir comportamentos de risco, como o hábito de fumar para aliviar o estresse e o sofrimento causados pela violência (16), as- sim como a convivência com parceiros tabagistas exercendo uma importante influência quanto a não cessação do hábito durante a gestação (17). Lembrando que as associações aqui encontradas não podem ser consideradas uma relação de causa e efeito, devi- do o delineamento do estudo. O fato de a violência física ser mais frequente em mulheres multigestas, resultado encontrado no presente estudo, concorda com outros autores (18). Considera-se que as mulheres com mais filhos são mais suscetíveis à violência supondo que um maior nú- mero de filhos pode aumentar o estresse na família. Indo mais adiante pode acontecer que essas mulheres que sofrem violência física também são vitimas de outras formas de violência gerando uma situação de submissão, que por sua vez levaria a um menor poder de negociação no cotidiano como, por exemplo, na relação sexual e quanto ao uso de meios contraceptivos o que as deixam mais suscetíveis à gravidez tornando-as mães de vários filhos (19). A associação da violência física na gestação e filhos de ou- tro parceiro encontrada neste estudo, também foi relatada em um estudo realizado no México, o qual faz referência à violência no período gestacional como um padrão mais grave de violência, que além de comprometer a saúde da mulher, pode comprometer futuramente também a infância, quando a violência passa a ser exercida por seu parceiro também em seus filhos (19). Com relação às características do companheiro, a VFPI na gestação foi mais frequente quando este estava desempregado durante a gestação. O fato de estar sem renda pode resultar na percepção do companheiro de que a esposa é financeiramente in- dependente ou que pode se tornar chefe de família aumentando a chance de episódios de violências, incluindo a violência física (20). Outro resultado deste estudo foi a associação da violência fí- sica e o uso de drogas pelo parceiro, corroborando com achados de outros estudos (14, 21). Na cidade de Campinas, no estado de São Paulo, foi descrito o uso de drogas pelo companheiro como fator preditivo para violência (14). Recentemente, na cidade de Pelotas, estado do Rio Grande do Sul, um estudo apontou que o uso de drogas lícitas ou ilícitas no meio familiar pode gerar confli- tos e resultar em atos de violência (21). Este estudo apresenta dados úteis para orientar as iniciativas dos gestores e de profissionais da saúde visando à melhoria da qualidade da atenção a mulher durante a gestação. Entretanto, é importante ressaltar algumas limitações, principalmente aquelas decorrentes da dificuldade de abordagem do tema, pois a preva- lência de violência física durante a gestação foi estimada tendo como fonte o relato da mulher. Considera-se que essa resposta envolve fatores culturais e emocionais podendo ser enfrentada com dificuldade, possibilitando a algumas mulheres omitirem a ocorrência desse agravo. Finalmente, mesmo considerando que um estudo do tipo transversal como o presente não tem poder de estabelecer re- lação de causalidade da violência com as variáveis analisadas, a complexidade e a importância da violência como um problema de saúde pública presente na comunidade remetem à necessidade de se conhecer os fatores envolvidos com fins de legitimar esse agravo no âmbito da atenção à saúde. Embora tenha sido observado aumento da produção científica sobre a violência nos últimos anos, ainda existem lacunas do con- hecimento, sendo necessário investigar outros contextos desse 349 Violência física por parceiro íntimo na gestação: prevalência e alguns fatores associados l Jenny Karol Gomes Sato Sgobero e outros agravo como, por exemplo, aspectos psicológicos das gestantes vítimas de violência, experiências positivas de redes de apoio às mulheres e seus companheiros, e a efetividade dos serviços de saúde no cuidado e assistência às vítimas. Conhecer os fatores que se associam à ocorrência da vio- lência física permite instrumentalizar os profissionais da saúde, especialmente o enfermeiro, a identificar essas características na mulher e sua família priorizando um atendimento mais próxi- mo, com equipe multiprofissional e abordagem interdisciplinar, a fim de elaborar uma assistência direcionada e específica para encaminhamentos necessários no sentido de proteger a mulher, seus filhos e sua família. Sugere-se que o agravo da violência seja considerado e incorporado definitivamente aos serviços para que seja investigado pelos profissionais de saúde na rotina do atendi- mento à mulher "em geral" e durante o pré-natal em, particular. Referências 1. Makayoto LA, Omolo J, Kamweya AM, Harder VS, Mutai J. Prevalence and associated factors of intimate partner violence among pregnant women attending Kisumo district hospital, Kenya. Matern Child Health J. 2013;17:441-47. 2. World Health Organization. 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