Microsoft Word - 20-Bio_13962.doc 810 Original Article Biosci. J., Uberlândia, v. 28, n. 5, p. 810-819, Sept./Oct. 2012 DISTRIBUIÇÃO DE INSETOS GALHADORES EM DIFERENTES FORMAÇÕES VEGETAIS E PAISAGENS DO CERRADO BRASILEIRO GALLING INSECT DISTRIBUTION IN DIFFERENT VEGETATION TYPES AND LANDSCAPES IN THE BRAZILIAN CERRADO Walter Santos de ARAÚJO1; Frederico Augusto Guimarães GUILHERME2 1. Pós-Graduação em Ecologia e Evolução, Departamento de Ecologia, Instituto de Ciências Biológicas, Universidade Federal de Goiás, Campus II, Goiânia, GO, Brasil. walterbioaraujo@yahoo.com.br ; 2. Universidade Federal de Goiás, Campus Jataí - Unidade Jatobá, Parque Industrial, Jataí, GO, Brasil. RESUMO: Nesse estudo, testamos os efeitos da altitude, tipo de vegetação, estrutura da paisagem e tipo de matriz ambiental sobre a riqueza de insetos galhadores. Inventários de insetos galhadores foram realizados em 15 fragmentos de cerrado sensu stricto nos estados de DF, GO, MG e TO. Foram amostradas 1882 plantas pertencentes a 131 espécies e 43 famílias vegetais, sendo que 64 espécies (48,8%) e 31 famílias (72,1%) hospedaram galhas. Registramos 112 espécies de insetos galhadores. Vochysiaceae foi a família vegetal que apresentou a maior riqueza de morfoespécies de galhas (19 espécies). A riqueza de galhas não foi correlacionada com a altitude das áreas. Por outro lado, a riqueza de morfotipos foi significativamente influenciada pelo tipo de vegetação, estrutura da paisagem e tipo de matriz ambiental. Nossos resultados apontam que as diferentes configurações espaciais dos fragmentos podem provocar alterações microclimáticas que influenciam a estrutura da vegetação e aumentam as taxas de ocorrência de insetos galhadores. Concluímos que elementos da paisagem podem ser importantes para explicar os padrões de distribuição de insetos galhadores, principalmente com as crescentes alterações das paisagens naturais. PALAVRAS-CHAVES: Estrutura da vegetação. Galhas. Matriz ambiental. Padrões altitudinais. Paisagens. INTRODUÇÃO A busca por padrões de distribuição de insetos galhadores tem sido o objetivo de muitos estudos nas últimas décadas (FERNANDES; PRICE 1988; BLANCHE; WESTOBY 1996; PRICE et al. 1998; OYAMA et al. 2003). Vários estudos sugerem que características naturais, como a estrutura da vegetação e das plantas hospedeiras podem ter efeitos diretos sobre a riqueza de galhadores (OYAMA et al. 2003; CUEVAS- REYES et al. 2004). Além desses fatores naturais importantes, o interesse na detecção de padrões na distribuição é aumentado diante da crescente substituição dos ambientes naturais por diferentes ecossistemas antropizados (FOLEY et al. 2005). No Cerrado brasileiro a fragmentação de habitats devido aos avanços das fronteiras agropecuárias é uma das principais causas da perda de diversidade (KLINK; MACHADO 2005). Essa fragmentação gera mosaicos entre ecossistemas naturais e antrópicos, afetando os processos ecológicos responsáveis pelos padrões de distribuição de insetos galhadores (JULIÃO et al. 2004; ARAÚJO et al. 2011). Desse modo, investigar os efeitos da paisagem sobre a riqueza de insetos galhadores é um importante caminho para clarificar esses padrões em ecossistemas em mudanças. Segundo Fleck e Fonseca (2007), a riqueza de galhadores na comunidade é influenciada diretamente pela riqueza, abundância e composição de espécies hospedeiras, que por sua vez são influenciadas por aspectos como a latitude e a altitude. O aumento do gradiente altitudinal, por exemplo, afeta inversamente a riqueza de insetos galhadores, como mostrado por alguns estudos (e.g. LARA et al. 2002). Esses resultados podem ser explicados por mudanças na distribuição de vegetações escleromórficas ao longo de diferentes altitudes (LARA et al. 2002). Uma interessante questão a ser investigada é se a riqueza de galhas é variável entre áreas com diferentes altitudes, mas com o mesmo tipo de vegetação. As comunidades biológicas também podem ser influenciadas pelo tipo de matriz ambiental na qual os fragmentos de habitat estão inseridos, inclusive matrizes artificialmente delineadas (PICKETT; CADENASSO 1995). Nesse contexto, paisagens antropicamente geradas, que geralmente são mais homogêneas, como uma matriz de monocultura, tendem a ter uma menor diversidade de herbívoros nos fragmentos (THIES et al. 2003). A simplificação do habitat leva à diminuição da diversidade de plantas e aumenta a concentração de inimigos naturais dos herbívoros, como parasitóides e patógenos (MAILAFIYA et al. 2011). Em outros casos, matrizes homogêneas, como centros urbanos, podem não diminuir a riqueza de insetos galhadores (JULIÃO et al. 2005; SUMOSKI et al. 2009), talvez por que nessas condições as plantas tendem a Received: 16/11/11 Accepted: 05/03/12 811 Distribuição de insetos... ARAÚJO, W. S.; GUILHERME, F. A. G. Biosci. J., Uberlândia, v. 28, n. 5, p. 810-819, Sept./Oct. 2012 ocorrer mais agrupadas no tempo e no espaço, favorecendo a colonização dos insetos (MAILAFIYA et al. 2011). Desse modo, tanto a complexidade da paisagem quanto o tipo da matriz podem alterar a ocorrência de insetos galhadores. Nesse estudo, buscamos responder às seguintes questões: Existe efeito da altitude sobre a diversidade de insetos galhadores? De um modo geral, não esperamos efeitos da altitude sobre a riqueza de insetos galhadores, uma vez que, grande parte desses efeitos é indireta via distribuição altitudinal de vegetações escleromórficas, fato controlado pela amostragem de apenas um tipo de vegetação (cerrado sensu stricto). A estrutura da vegetação altera a riqueza de insetos galhadores? Esperamos que a estrutura da vegetação influencie positivamente a riqueza de galhadores, de modo que as vegetações com maior densidade de plantas sejam as mais ricas. As paisagens homogêneas e heterogêneas apresentam riqueza de galhas diferente? Existe efeito do tipo de matriz sobre a diversidade de insetos galhadores? Para essas duas ultimas questões, esperamos uma maior riqueza de galhadores em fragmentos com paisagens heterogêneas e matrizes naturais, respectivamente, pois tais configurações aumentam a diversidade de micro-hábitats e possibilitam uma maior diversidade de plantas, e por conseqüência de insetos. Nesse sentido, o objetivo do estudo foi avaliar os efeitos de características estruturais da paisagem sobre a riqueza e freqüência de insetos galhadores no Cerrado brasileiro. MATERIAL E MÉTODOS O estudo foi realizado através de inventários de insetos galhadores e plantas hospedeiras em 15 áreas do Cerrado brasileiro, nos estados de Goiás, Minas Gerais e Tocantins, além do Distrito Federal (Figura 1). A fitofisionomia estudada foi o cerrado sensu stricto, sendo que esta pode apresentar variações quanto à sua estrutura, principalmente densidade e área basal das plantas por unidade de área (RIBEIRO; WALTER 1998), sendo oito áreas em cerrado típico, três em cerrado denso, duas em cerrado ralo e duas em cerrado com afloramentos rochosos (Tabela 1). A maioria das áreas amostradas é constituída de fragmentos de pequeno e médio tamanho, com exceção das áreas 8 e 15 (Tabela 1 e Figura 1) que ocorreram em um contínuo de vegetação nativa. Muitos desses fragmentos ocorreram em áreas semi-urbanas e/ou propriedades rurais particulares, e por esse motivo tinham certo nível de antropização, como por exemplo, indícios de queimadas e presença de lixo. O clima das áreas, assim como em todo o Cerrado brasileiro é caracterizado pela ocorrência de períodos de invernos secos e verões chuvosos, classificado como Aw de Köppen (tropical chuvoso). Em cada área foram estabelecidas 10 parcelas de 10 × 10 m (totalizando 0,1 ha por área). As parcelas foram distribuídas sem padronização (ao azar), mas de maneira o mais distante possível das bordas dos fragmentos. Em alguns casos, porém, devido ao tamanho reduzido do fragmento, isso não foi possível. Nas parcelas foram amostradas todas as plantas lenhosas com circunferência maior ou igual a 15 cm, a uma altura de 30 cm do solo, nas quais foi verificada a ocorrência de galhas. Tabela 1. Caracterização das áreas de cerrado sensu stricto amostradas no Cerrado brasileiro. N Áreas Cidade UF Alt Paisagem Matriz Tipo Vegetação 1 Fazenda Lageado Jataí GO 756 Homogênea Pastagem Cerrado denso 2 Banana Menina Hidrolândia GO 893 Homogênea Pastagem Cerrado típico 3 Senador Canedo Senador Canedo GO 774 Homogênea Pastagem Cerrado típico 4 Itanhangá Goiânia GO 762 Homogênea Urbana Cerrado típico 5 Bela Vista Bela Vista GO 809 Homogênea Urbana Cerrado típico 6 Bom Sucesso Senador Canedo GO 749 Homogênea Pastagem Cerrado típico 7 UEG Anápolis GO 1097 Homogênea Pastagem Cerrado rochoso 8 Pedreira Pirenópolis GO 840 Heterogênea Nativa Cerrado ralo 9 Fazenda Geraldim Silvânia GO 837 Homogênea Pastagem Cerrado rochoso 10 Caldas Novas Caldas Novas GO 702 Homogênea Urbana Cerrado típico 11 Caça e Pesca Uberlândia MG 864 Homogênea Monocultura Cerrado denso 12 Floresta do Lobo Uberlândia MG 948 Homogênea Monocultura Cerrado denso 13 APA Cafuringa Brasília DF 873 Heterogênea Nativa Cerrado típico 14 REBio Contagem Brasília DF 994 Heterogênea Nativa Cerrado ralo 15 Porto Real Ponte Alta TO 380 Heterogênea Nativa Cerrado típico 812 Distribuição de insetos... ARAÚJO, W. S.; GUILHERME, F. A. G. Biosci. J., Uberlândia, v. 28, n. 5, p. 810-819, Sept./Oct. 2012 Figura 1. Mapa de distribuição das áreas de cerrado sensu stricto amostradas no Brasil. Legenda: 1 = Fazenda Lageado, GO; 2 = Banana Menina, GO; 3 = Senador Canedo, GO; 4 = Itanhangá, GO; 5 = Bela Vista, GO; 6 = Bom Sucesso, GO; 7 = UEG, GO; 8 = Pedreira, GO; 9 = Fazenda Geraldim, GO; 10 = Caldas Novas, GO; 11 = Caça e Pesca, MG; 12 = Floresta do Lobo, MG; 13 = APA Cafuringa, DF; 14 = Rebio Contagem, DF; 15 = Porto Real, TO. Ainda em campo foram coletados dados das plantas hospedeiras (espécie, circunferência e altura) e morfologia das galhas (órgão, cor, forma e tamanho), bem como as coordenadas geográficas e altitude das áreas. Plantas hospedeiras e insetos galhadores foram separados e morfotipados no campo quanto à morfologia da galha e a planta hospedeira (sensu CUEVAS-REYES et al. 2004; CARNEIRO et al. 2009). O uso de morfotipos de galhas como substituto das espécies de insetos galhadores é um parâmetro bastante utilizado, uma vez que, cada morfotipo de galha é específico do inseto galhador (STONE; SCHÖNROGGE 2003), e que cada espécie galhadora é específica quanto à sua planta hospedeira (FERNANDES; PRICE 1988; ABRAHAMSON et al. 1998; ESPÍRITO-SANTO; FERNANDES 2007). Análise de regressão linear foi o método utilizado para relacionar a altitude das áreas com a riqueza de plantas e de insetos galhadores e a frequência de indivíduos com galhas. Essas variáveis respostas também foram comparadas entre os diferentes tipos de cerrado (vegetações com diferentes estruturas), através de análises de variância (one-way ANOVA). Nesse teste, as unidades amostrais de cerrado com afloramentos rochosos foram analisadas juntamente com as de cerrado ralo, uma vez que, a estrutura e a densidade de plantas são bastante semelhantes. A composição florística e faunística foi comparada entre as diferentes localidades (diversidade beta) através de análises de agrupamento Bray-Curtis. As matrizes de similaridade florística e faunística foram correlacionadas através de teste de Mantel (10.000 permutações). Esse teste utiliza como dados de entrada matrizes de similaridade ou distância (TUOMISTO; RUOKOLAINEN, 2006). Para a construção dos dendrogramas foi utilizado o método de ligação baseado no algoritmo UPGMA. As paisagens foram categorizadas quanto à sua complexidade em homogêneas, com apenas um ecossistema dominante, ou heterogêneas, com vários ecossistemas (PICKETT; CADENASSO 1995). As matrizes ambientais homogêneas foram 813 Distribuição de insetos... ARAÚJO, W. S.; GUILHERME, F. A. G. Biosci. J., Uberlândia, v. 28, n. 5, p. 810-819, Sept./Oct. 2012 caracterizadas de acordo com o habitat predominante, sendo elas: monocultura, pastagem, urbana e natural. Testes de comparação de médias (teste t) foram utilizados para comparar a riqueza de plantas, insetos galhadores e a freqüência de plantas com galhas entre as paisagens homogêneas e heterogêneas. Análise de variância (ANOVA one way) foi o método usado para comparar a riqueza de insetos galhadores entre os diferentes tipos de matriz. O teste de Kruskal-Wallis foi empregado na comparação da riqueza e freqüência de plantas com galhas entre os tipos de matriz, uma vez que, que esses dados tiveram distribuição não-paramétrica. Testes a posterior foram utilizados para comparar os resultados entre as diferentes classes de dados (Teste de Fisher LSD e Teste de Múltipla Comparação, respectivamente). As análises e gráficos foram feitas utilizando os programas R (R- Project 2011) e Statistica 7.1. RESULTADOS Foram amostradas 1882 plantas pertencentes a 131 espécies e 43 famílias vegetais, sendo que 64 espécies (48,8%) e 31 famílias (72,1%) hospedaram galhas. Registramos 112 espécies de insetos galhadores, sendo Vochysiaceae a família de plantas hospedeiras com maior riqueza (19 espécies de galhas), seguida de Fabaceae e Malpighiaceae, com 13 e 12 espécies, respectivamente. A área do Lajeado, GO foi a que apresentou a maior riqueza de galhas com 30 morfotipos, já a REBio Contagem, DF foi a mais pobre com apenas oito morfotipos (média de 16,6 + 6,6). Não encontramos uma correlação significativa entre a altitude e a riqueza de galhas (r2 = 0,007, p > 0,05). A altitude também não influenciou a riqueza de plantas (r2 = 0,03, p > 0,05) e freqüência de indivíduos galhados (r2 = 0,02, p > 0,05). Quanto aos tipos de vegetação, a riqueza de plantas não diferiu entre as formações vegetais estudadas (F(2, 12) = 3,21, p> 0,05). Porém, a riqueza de galhadores diferiu significativamente entre as vegetações (F(2, 12) = 12,79, p < 0,01, Figura 2), sendo que as áreas com cerrado denso apresentaram a maior riqueza de galhadores (28,3 + 1,7 morfotipos), seguido das áreas de cerrado com afloramentos e cerrado ralo (17,2 + 6,9), e cerrado típico (13,8 +3,3). A freqüência de plantas lenhosas com galhas, por outro lado, não variou entre as vegetações estudadas (F(2, 12) = 3,61, p > 0,05). Figura 2. Riqueza de insetos galhadores (média + desvio padrão) em vegetações de cerrado sensu stricto com diferentes estruturas. A distância entre as áreas influenciou a similaridade florística (composição de plantas hospedeiras), sendo apresentados agrupamentos diferenciados para áreas situadas no DF, MG e GO (Figura 3a). A área mais afastada, Porto Real, TO, foi aquela com composição florística mais diferenciada em relação às demais, com apenas 29,1% de similaridade. As localidades com maior similaridade florística foram Senador Canedo, GO e Bela Vista, GO com 53,3%. Já a similaridade faunística não apresentou um agrupamento tão evidente de proximidade das localidades (Figura 814 Distribuição de insetos... ARAÚJO, W. S.; GUILHERME, F. A. G. Biosci. J., Uberlândia, v. 28, n. 5, p. 810-819, Sept./Oct. 2012 3b). O local com composição de espécies de galhadores mais diferenciada foi Bom Sucesso, GO (20,9%) e os mais similares foram Senador Canedo, GO e Itanhangá, GO (45,5%). O teste de Mantel mostrou uma correlação positiva entre as matrizes de similaridade florística e faunística (r = 0,67; p < 0,01). Figura 3. Diagrama de agrupamento (UPGMA) para A) similaridade de espécies de plantas hospedeiras e B) similaridade de espécies de insetos galhadores entre diferentes áreas de cerrado sensu stricto. O tipo de paisagem influenciou a riqueza de plantas hospedeiras (t = 2,28, p < 0,05). Paisagens homogêneas apresentaram em média 35,8 (+ 5,7) espécies, enquanto que as paisagens heterogêneas tiveram apenas 27,0 (+ 7,5). Por outro lado, a riqueza de insetos galhadores e a frequência de plantas com galhas não foi afetada pelo tipo de paisagem (t = 1,78, p > 0,05 e t = 1,22, p > 0,05, 815 Distribuição de insetos... ARAÚJO, W. S.; GUILHERME, F. A. G. Biosci. J., Uberlândia, v. 28, n. 5, p. 810-819, Sept./Oct. 2012 respectivamente). A riqueza de espécies de plantas (H(3,15) = 4,72, p > 0,05) e a freqüência de plantas com galhas (H(3,15) = 6,16, p > 0,05) não diferiram entre os tipos de matrizes estudados. Já a riqueza de insetos galhadores foi maior em fragmentos inseridos em matriz de monocultura (27,5 + 1,5), do que nos demais tipos de matriz (16,1 + 5,8) (F(1, 11) = 7,95, p < 0,05, Figura 4). Figura 4. Riqueza de insetos galhadores (média + desvio padrão) em áreas de cerrado sensu stricto com diferentes tipos de matriz. DISCUSSÃO O presente estudo corrobora outros trabalhos que indicam que a região tropical apresenta uma das mais elevadas riquezas de insetos galhadores do mundo (GAGNÉ 1994; CUEVAS- REYES et al. 2003; NIEVES-ALDREY et al. 2008). Além da grande riqueza, a frequência de ocorrência de galhas observada nesse estudo foi alta, sendo que quase metade das espécies de plantas amostradas apresentou galhas (48,8%). Gonçalves-Alvim e Fernandes (2001) observaram galhas em 29% das plantas das savanas neotropicais do Sudeste brasileiro. Para as formações florestais tropicais do México, os insetos galhadores podem colonizar até 69,8% das espécies de plantas (OYAMA et al. 2003). Estudos prévios indicam que padrões altitudinais podem influenciar a distribuição de insetos galhadores (e.g. FERNANDES; PRICE 1988). A maioria dos resultados tem mostrado que a riqueza de insetos galhadores diminui com o aumento da altitude (FERNADES; PRICE 1988; FERNANDES; LARA 1993; LARA et al. 2002), mas também existem resultados que apontam maior diversidade em altitudes intermediárias (BLANCHE; LUDWIG 2001). Neste estudo, a altitude não influenciou a riqueza de plantas nem a diversidade de insetos galhadores, como nós esperávamos. Segundo Fleck e Fonseca (2007) a relação entre riqueza de galhadores e altitude só é clara para ambientes xéricos, o que sugere que a presença e o tipo de vegetação esclerófila exerça um efeito mais pronunciado sobre a riqueza de galhadores do que o gradiente altitudinal em si (LARA et al. 2002; RIBEIRO; BASSET 2007). Logo, quando controlamos esse efeito vegetacional, amostrando apenas formações esclerófilas, os efeitos da altitude sobre a diversidade de galhadores foram diluídos. Insetos galhadores apresentam distribuição diferencial que depende do habitat e do tipo vegetacional (GONÇALVES-ALVIM; FERNANDES 2001; Mendonça et al. 2010). Mecanismos que podem determinar isso estão relacionados à composição de espécies e à estrutura das plantas (CUEVAS-REYES et al. 2004). No nosso estudo, os quatro subtipos de cerrado sensu stricto estudados (cerrado típico, cerrado ralo, cerrado denso e cerrado com afloramentos rochosos) apresentam basicamente a mesma composição de espécies, mas diferem quanto a sua estrutura, conforme também discutido por Ribeiro e Walter (1998). O subtipo que apresentou maior riqueza e 816 Distribuição de insetos... ARAÚJO, W. S.; GUILHERME, F. A. G. Biosci. J., Uberlândia, v. 28, n. 5, p. 810-819, Sept./Oct. 2012 frequência de galhas, como esperado, foi o cerrado denso, que é justamente aquele com maior densidade de plantas. O número de indivíduos de plantas é um fator relacionado à disponibilidade e concentração de recursos que incrementa a diversidade de insetos galhadores (GONÇALVES- ALVIM; FERNANDES 2001; CUEVAS-REYES et al. 2003). Esses fatores relacionados à diversidade de plantas podem influenciar significativamente a ocorrência das galhas. Interações entre espécies são responsáveis por grande parte dos processos que conhecemos sobre estruturação de comunidades biológicas (BEGON et al. 2006). Comunidades locais de insetos galhadores geralmente são estruturadas a partir da comunidade de plantas ocorrentes no local, que representam uma gama de possíveis hospedeiras (MENDONÇA, 2007). Como observado nesse estudo, a similaridade de plantas hospedeiras foi fortemente influenciada pela proximidade entre as áreas estudadas. A similaridade de galhas, por outro lado, não sofre efeitos tão importantes da distância entre as localidades (MEDIANERO et al. 2010). Isso decorre do fato de insetos galhadores serem altamente especializados e dependerem da presença e da qualidade da planta hospedeira para o estabelecimento (WEIS et al. 1988). Por esse motivo, a similaridade entre faunas de galhadores são reflexos da similaridade de plantas hospedeiras ocorrentes na região (MEDIANERO et al. 2010). Esses resultados apontam que fatores locais são determinantes para a composição de insetos galhadores (OYAMA et al. 2003), incluindo não só aqueles relacionados à composição de plantas hospedeiras, mas também à características do habitat, e ao tipo de paisagem e de matriz ambiental. Nós avaliamos tanto o efeito da complexidade da paisagem quanto do tipo de matriz e encontramos uma maior riqueza de insetos galhadores em paisagens homogêneas e em locais onde a matriz predominante foi monocultura, contrariando nossas expectativas. Esses resultados também vão contra a ideia mais geral de que as paisagens homogêneas diminuem a riqueza de insetos herbívoros (THIES et al. 2003). Uma razão para isso é que a simplificação do habitat pode aumentar a concentração local das plantas hospedeiras, favorecendo a colonização dos insetos e aumentando o tamanho das populações (ROOT, 1973). Além do mais, mudanças na configuração espacial dos fragmentos vegetacionais podem provocar alterações microclimáticas que aumentam as taxas de ocorrência de insetos galhadores, por aumentarem a vulnerabilidade das plantas ao ataque de herbívoros (ARAÚJO et al. 2011). Entretanto, não podemos descartar que efeitos amostrais podem ter influenciado esses resultados. Por exemplo, a maior riqueza de galhadores em matrizes de monocultura pode ter sido decorrente do fato dos dois pontos amostrais dessa categoria ter vegetação do tipo cerrado denso (vegetação mais rica em galhadores). Por esse motivo, encorajamos que novos estudos repitam esse tipo de análise com um maior esforço amostral e número de réplicas., para testar a robustez dessas observações. A importância da ecologia de paisagens para insetos ainda é pouco conhecida e vários fatores podem influenciar na riqueza e abundancia de insetos nas paisagens (HUNTER, 2002). Um fator importante é a diversidade de plantas hospedeiras, que deve ser mantida ou aumentada pela matriz ambiental (DAUBER et al. 2003). Essa é uma condição indispensável para que os insetos galhadores se mantenham em paisagens homogêneas. Segundo Pickett e Cadenasso (1995) a abordagem mais comum sobre paisagens ecológicas é a elucidação das interações entre os fragmentos e os elementos da matriz ambiental adjacente. Confirmando isso, alguns estudos apontam que determinados tipos de uso do solo e de matriz ambiental podem manter uma alta riqueza de plantas (COUSINS; ERIKSSON 2002; DAUBER et al. 2003). Concluímos que elementos da ecologia da paisagem podem ser importantes para entender os padrões de distribuição de insetos galhadores, principalmente com as crescentes alterações que as paisagens naturais vêm sendo modificadas. AGRADECIMENTOS Os autores são gratos a três revisores anônimos pelas valiosas sugestões para melhoria desse trabalho; à Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa ao primeiro autor, e ao CNPq pela Bolsa de Produtividade para FAG Guilherme. ABSTRACT: We tested the effects of altitude, vegetation type, landscape structure and environmental matrix type on diversity of galling insect. Surveys of galls were realized in 15 fragments of neotropical savanna (cerrado sensu stricto) in the states of DF, GO, MG and TO. Were sampled 1882 plants of 131 species and 43 families of plants, being that 64 species (48.8%) and 31 families (72.1%) hosted galls. We recorded 112 galling insect species and Vochysiaceae 817 Distribuição de insetos... ARAÚJO, W. S.; GUILHERME, F. A. G. Biosci. J., Uberlândia, v. 28, n. 5, p. 810-819, Sept./Oct. 2012 the host plant family with more galling (19 species). The galling richness was not related with altitude. On other hand, the galls diversity was significant influenced by vegetation type, landscape structure and environmental matrix type. Our results points that changes in the spatial configuration of vegetation fragments may cause microclimatic and structural modifications that increase the occurrence rates of galling insects. We conclude that landscape elements can be important to understand the distribution patterns of galling insects, main with increasing changes on natural landscapes. KEYWORDS. Environmental matrix. Galling. Landscape. Altitudinal patterns. Vegetation structure. REFERERÊNCIAS ABRAHAMSON, W. G.; MELIKA, G.; SCRAFFORD, R.; CSÓKA, G. Gall-inducing insects provide insights into plant systematic relationships. 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