Microsoft Word - 7-Agra_15103.doc 1469 Original Article Biosci. J., Uberlândia, v. 29, Supplement 1, p. 1469-1478, Nov. 2013 INDICADORES PARTICIPATIVOS DE QUALIDADE DO CAFEEIRO CONILON E DO SOLO EM SISTEMA AGROFLORESTAL E CONVENCIONAL PARTICIPATORY INDICATORS OF QUALITY IN CONILON COFFEE AND SOIL IN AGROFORESTRY SYSTEM AND CONVENTIONAL André THOMAZINI1; Humberto Carlos Almeida de AZEVEDO2; Patrick Leal PINHEIRO2; Eduardo de Sá MENDONÇA3 1. Engenheiro Agrônomo, Mestrando em Produção Vegetal, Departamento de Produção Vegetal, Centro de Ciências Agrárias, Universidade Federal do Espírito Santo- UFES, Alegre, ES, Brasil;andre.thz@gmail.com; 2. Graduando em Agronomia - Centro de Ciências Agrárias - UFES, Alegre, ES, Brasil; 3. Departamento de Produção Vegetal – Centro de Ciências Agrárias - UFES, Alegre, ES, Brasil. RESUMO: A avaliação participativa de agroecossistemas é uma técnica rápida e de fácil aplicação para avaliação da sustentabilidade de propriedades de agricultura familiar. Este trabalho teve por objetivo implementar e avaliar, em cinco propriedades rurais de Alegre (ES), uma metodologia prática e de fácil aplicação por agricultores na avaliação participativa de características indicadoras de qualidade do Coffea canephora e do solo. Foram avaliadas cinco áreas com sistemas de manejo convencional e conservacionista agroecológico de cultivo. A partir de observações feitas a campo notas foram atribuídas aos indicadores de qualidade do café e solo. As notas variam de 1 a 10 em 3 intervalos ( 0-5; 5-8 e 8-10). Gráficos em forma de radar foram elaborados, representando o estado de cada indicador, e comparados com as diferentes percepções dos produtores e técnicos da área agrícola. O diagrama da qualidade do café indicou no sistema convencional a alta dependência de insumos externos (nota 2) e grande efeito da radiação solar pela falta de cobertura vegetal na seca de ponteiros (nota 3). Já para a qualidade do solo no sistema conservacionista, notou-se controle da erosão (nota 9), maior profundidade da camada escura (nota 9) e maior diversidade de plantas (nota 9,5). Sistemas conservacionistas agroecológicos de cultivo promovem maior sustentabilidade da agricultura familiar e otimizam a produção agrícola. PALAVRAS-CHAVE: Metodologia participativa, agricultores familiares, manejo agroecológico, sustentabilidade. INTRODUÇÃO A sustentabilidade dos agroecossistemas tem sido estudada nos últimos anos e ganhando importância no cenário agrícola. Para isso, técnicas de manejo agroecológico, como adubação verde, rotação de culturas, consorciamentos, dentre outras, são inseridas no manejo das lavouras, o que gera maior sustentabilidade para os agricultores e para as culturas de interesse. Para garantir a sustentabilidade, o manejo deve promover a otimização de processos como a disponibilidade e equilíbrio no fluxo de nutrientes, proteção e conservação da superfície do solo, preservação e integração da biodiversidade e exploração da adaptabilidade e complementaridade no uso dos recursos genéticos vegetais e animais (MACHADO; VIDAL, 2006). Assim, o uso de indicadores de fácil aplicação permite aos agricultores familiares caracterizar e monitorar seus sistemas, avaliar e tomar decisões, definir ou monitorar a sustentabilidade de sua realidade, determinar os pontos críticos do sistema, avaliar sua realidade e buscar novas tecnologias para promover melhorias na qualidade de seu agroecossistema (ALTIERI; NICHOLS, 1999). Conforme Marzall (1999) há algumas características importantes a serem consideradas na definição desses indicadores. Estes devem ser significativos para a avaliação do sistema; ter validade, objetividade e consistência; ter coerência e ser sensível a mudanças no tempo e no sistema; ser centrado em aspectos práticos e claros, fácil de entender e que contribua para a participação da população local no processo de mensuração; permitir enfoque integrador e permitir ampla participação dos atores envolvidos na sua definição. O cultivo de café no estado do Espírito Santo é conduzido em grande parte das lavouras sem a manutenção da cobertura vegetal do solo com altos índices de capina, o que gera exposição do solo e potencializa a perda da matéria orgânica e nutrientes via solo e água no processo erosivo (BRINATI et al., 2008). Entretanto, algumas propriedades com agricultura de base familiar priorizam a manutenção da cobertura do solo. Esses sistemas podem ocorrer com o manejo da vegetação espontânea e em outras formas de cultivo Received: 07/05/12 Accepted: 10/12/12 1470 Indicadores participativos de qualidade… THOMAZINI, A. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, Supplement 1, p. 1469-1478, Nov. 2013 associando com espécies arbóreas e/ou frutíferas. Nesse tipo de manejo, ocorre aporte contínuo de material orgânico que é depositado sobre o solo, diminuindo a susceptibilidade do sistema em perder solo, água e nutrientes. Além disso, ao longo dos anos esse tipo de manejo melhora os atributos químicos e físicos do solo. A relação entre o manejo e a qualidade do solo pode ser avaliada pelo comportamento de suas propriedades físicas, químicas e biológicas (ISLAM e WEIL, 2000; CONCEIÇÃO et al., 2005). O efeito do manejo sobre as propriedades físicas do solo é dependente da sua textura e mineralogia, as quais influenciam a resistência e a resiliência do solo a determinada prática agrícola (MAIA et al., 2006). A falta de manutenção da cobertura vegetal no solo aumenta sua exposição e o potencial erosivo da chuva, que remove parte do horizonte superficial, diminuindo a camada orgânica e retirando nutrientes do sistema, refletindo diretamente nos atributos químicos do solo (FRANCO et al., 2002). Segundo SCHOENHOLTZ et al. (2000) o conceito de qualidade do solo envolve a avaliação das propriedades e dos processos que nele ocorrem e que permitem que o mesmo funcione efetivamente como um componente saudável do ecossistema. O presente trabalho teve como objetivo implementar e avaliar, por meio do uso de indicadores de fácil aplicação pelos agricultores, o impacto de sistemas de manejo de café sobre a qualidade do agroecossistema. MATERIAL E MÉTODOS O trabalho foi realizado em cinco propriedades de agricultura familiar na comunidade Feliz Lembrança, município de Alegre, região do Caparaó, Espírito Santo, área de abrangência do bioma Mata Atlântica. O clima regional é o tropical, chuvoso no verão e seco no inverno, a temperatura média anual é de 22˚ C. A altitude mínima é de 100 m e a máxima de 1326m e pluviosidade média anual de 800-1200 mm. O clima é classificado, segundo a classificação de Köppen, como sendo do tipo Aw, com estação seca no inverno e verão quente e chuvoso. A classe de solo dominante é de Latossolos Vermelho-Amarelo profundos e bem drenados, ácidos e pobres em nutrientes disponíveis (SANTOS, 2010). Os sistemas A e D são tidos como convencionais e os sistemas B, C e E são conservacionistas agroecológicos, conforme caracterização na Tabela 1. Tabela 1. Caracterização do manejo executado ao longo do ano agrícola nos diferentes agroecossistemas. Sistem as Composição anterior Composição atual TA(3) (anos) Idade Café (anos) Adubação CVG( 6) C(9) RO(11) H(13) A Café e Palmito Café, Ingá, Palmito, 2 22 2x/ ano NPK(4) AUS(7 ) R(10) RM(12) NA(14) B Café e Coco Café, Coco, Laranja, Banana, Frutíferas,TR P(2) VE(1), 4 10 NR(5) PRS(8) NR RM NA C Café Café, Trapoeraba 5 8 3x/ano NPK PRS NR RM 2x/an o D Café Café, Banana, Laranja, Mamão 2 12 2x/ano NPK e micro AUS R NR 3x/an o E Café e Acerola Café, Acerola, Brachiaria, VE 1 35 NR PRS NR RM 1x/an o (1) VE: Vegetação espontânea; (2) TRP: Trapoeraba; (3) TA: Tempo de adoção do sistema atual; (4) 2x/ ano NPK: Realiza 2 adubações anuais com NPK baseada na análise do solo;(5)NR: Não realiza; (6) CVG: Cobertura Vegetal; (7) PRS: Presente; (8) AUS: Ausente; (9) C: Capina; (10) R: Realiza; (11) RO: Roçagem; (12) RM: Roçagem; (13) H: Herbicidas; (14) NA: Não aplica. A propriedade A apresenta média de produção de 20 sacas/ha de café, sendo uma lavoura conduzida no espaçamento de 2,5 x 3 m (entre plantas e linhas, respectivamente) em uma área de 6 ha. A vegetação espontânea é controlada via capinas e roçagem. A propriedade B apresenta 1471 Indicadores participativos de qualidade… THOMAZINI, A. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, Supplement 1, p. 1469-1478, Nov. 2013 uma média de produção de 30 sacas/ha de café, sendo uma lavoura conduzida no espaçamento de 2 x 3 m (entre plantas e linhas, respectivamente) em uma área de 5 ha. Trata-se de um sistema agroflorestal com grande diversidade de plantas e produtos produzidos como palmito, laranja. mexerica e madeira para utilização em fornalhas, dentre outros. A propriedade C apresenta média de produção de 40 sacas/ha de café. O agricultor mantém plantas espontâneas na lavoura (principalmente trapoeraba), o café é conduzido no espaçamento de 2 x 2,8 m (entre plantas e linhas, respectivamente) em uma área de 10 ha. A propriedade D apresenta média de produção de 10 sacas/ha de café, é um sistema de consorciamento em que o agricultor não mantém plantas espontâneas na lavoura. O café é conduzido no espaçamento de 2,5 x 2,8 m (entre plantas e linhas, respectivamente) em uma área de 5 ha. A propriedade E apresenta média de produção de 7 sacas/ha de café, apresenta baixa produtividade por ser a lavoura mais antiga (35 anos). O café é conduzido no espaçamento de 2 x 2,5 m (entre plantas e linhas, respectivamente) em uma área de 7 ha. Todas as lavouras não possuem sistemas de irrigação e os cultivos secundários estão dispostos aleatoriamente nas lavouras, sem espaçamentos definidos. Foi realizada uma avaliação por grupo de quatro produtores da região (de base familiar e com ensino fundamental completo) e outra procedida por uma equipe composta de três técnicos (1 Engenheiro agrônomo, 1 Técnico agrícola e graduando em agronomia e 1 Engenheiro agrônomo doutorando). O objetivo foi comparar a visão do produtor com a visão dos técnicos, a fim de avaliar, através de notas, a percepção do agricultor quanto aos sistemas de manejo e indicar por meio das notas quais pontos precisam ser melhorados. A metodologia, proposta por ALTIERI e NICHOLLS (2002) e adaptada por MACHADO e VIDAL (2006) foi apresentada ao grupo de produtores, onde se discutiu os indicadores e como proceder a avaliação. As avaliações foram feitas no final da estação chuvosa (março/2011). Cada grupo atribuiu as notas separadamente, discutindo-as entre os integrantes do grupo, avaliando aleatoriamente 5 pontos da área para cada indicador. Os indicadores aplicados para qualidade do solo (Tabela 2) foram: plantas indicadoras, diversidade de plantas espontâneas, diversidade de plantas cultivadas, cor do solo e teor de matéria orgânica, profundidade da camada escura (medida com auxílio de uma régua graduada), condições dos restos vegetais no solo e cobertura do solo, controle erosão, manejo do mato, atividade biológica, atividade microbiológica, estrutura, maciez, retenção de umidade (teste do funil segundo DEPONTI et al., 2002) e impedimentos físicos à velocidade de infiltração da água. Tabela 2. Indicadores aplicados na avaliação da qualidade do solo Notas Indicadores ------------0-5-------- ----------------5-8--------------- -------------8-10------- Plantas indicadoras (trapoeraba, capim colonião, samambaia) Plantas que indicam solos ácidos, baixa fertilidade, compactado ou poento Plantas que indicam solos com fertilidade parcialmente melhorada ou firmes Plantas que indicam solos férteis e bem estruturados Diversidade de plantas espontâneas Monocultivo Ate 3 - 4 espécies espontâneas e/ou 1-2 espécies de árvores nativas distantes Alta diversidade de espontâneas e/ ou árvores nativas Diversidade de plantas cultivadas Monocultivo Consorcio com ate 3-4 plantios ou 1-2 espécies de árvores plantadas distantes Alta diversidade de culturas e/ ou árvores plantadas Cor do solo e teor de matéria orgânica Coloração mais clara, teor muito baixo de matéria orgânica Coloração mais escura, média matéria orgânica Coloração bem escura, muita matéria orgânica Profundidade da camada escura 0-5cm 5-15cm > 15 cm Condição dos restos vegetais no solo e cobertura do solo Solo pouco coberto, pouca ou nenhuma palhada, sem sinais de decomposição Fina camada de palha, cobertura do solo acima de 50% Solo bem coberto, restos vegetais em diferentes estágios de decomposição 1472 Indicadores participativos de qualidade… THOMAZINI, A. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, Supplement 1, p. 1469-1478, Nov. 2013 Controle de erosão Erosão severa, clara percepção de escorrimento ou presença de sulcos Erosão difícil de observar, escorrimento não cria sulcos Sem sinais visíveis de erosão Manejo do mato Sem manejo (mato a vontade) ou solo sempre no limpo (descoberto) Roçadas ou capinas insuficientes Roçadas seletivas ou não, com solo protegido Atividade biológica Sem sinais da presença de minhocas e/ou artrópodes Presença de algumas minhocas e/ou artrópodes Abundância de minhocas e artrópodes Atividade microbiológica Nenhuma ou baixa efervescência do solo com aplicação de água oxigenada Média efervescência do solo com aplicação de água oxigenada Elevada efervescência do solo com aplicação de água oxigenada Estrutura(1) Solo poento desestruturado (sem grânulos ou parece pó) Estrutura fraca, desmancha facilmente sob pressão dos dedos Bem estruturado, não desmancha facilmente Retenção de umidade 100ml de solo do funil retém menos que 30 ml de água de 100ml aplicados 100ml de solo do funil retém de 35 - 45ml de água de 100ml aplicados 100ml de solo do funil retém mais que 50 ml de água de 100ml aplicados Impedimentos físicos à velocidade da água Nenhum Apenas Camada de folhas (serrapilheira) Serrapilheira e galhos 1. A estrutura do solo foi apresentada como uma metodologia simples de avaliação da estabilidade dos grânulos e da capacidade da amostra de desintegrar facilmente em pó, conforme DEPONTI et al., (2002). Para indicar a qualidade do cafeeiro (Tabela 3) foram aplicados: vigor, desenvolvimento do cafeeiro, ausência de seca de ponteiros, carga pendente, tamanho dos grãos, uniformidade de maturação, rendimento do cafeeiro atual e potencial, arborização e dependência externa de insumos. O sistema de notas para avaliar esses parâmetros foi feito de acordo com parâmetros e intervalos propostos. Foram atribuídas notas de 0 a 10, sendo que as notas eram distribuídas em intervalos de 0-5, 5-8 e 8-10 de acordo com as características de cada ponto, conforme metodologia proposta por Altieri e Nicholls (2002) e adaptada por Machado e Vidal (2006). . Tabela 3. Indicadores aplicados na avaliação da qualidade do café Notas Indicadores ---------------0-5-------------- - ----------------5-8--------------- - -------------8-10---------- - Vigor plantas fracas, amareladas desfolhadas ou com perda de ramos plagiotrópicos do terço inferior e com baixa carga plantas mais verdes, médio enfolhamento, com boa preservação dos ramos plagiotrópicos do terço inferior e carga razoável de frutos plantas vigorosas, verdes, bem enfolhadas, com ramos plagiotrópicos até no chão e boa carga Ausência de seca de ponteiros Mais de 50 % das plantas apresentam os sintomas 20 - 50 % < 20 % Carga pendente Menos de 2,5 litros de frutos por planta (< Y sacas beneficiadas por ha) 2,5 a 5,9 litros de frutos por planta (Y-X sacas beneficiadas por ha) Mais de 6 litros de frutos por planta (>X sacas beneficiadas por ha) 1473 Indicadores participativos de qualidade… THOMAZINI, A. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, Supplement 1, p. 1469-1478, Nov. 2013 Tamanho dos grãos Pequeno Médio Grande Uniformidade de maturação Desuniforme (presença tanto de verde, maduro ou seco sem predomínio) Intermediário (predominam grãos maduros mas com variações) Uniforme (quase todos os grãos estão maduros) Rendimento do Cafeeiro Baixo em relação a média da região Médio, aceitável Bom a alto Arborização Sem arborização Só uma espécie para arborização ou mais que uma espécie distante uma da outra Duas ou mais espécies para arborização ou uma a duas mais próximas Dependência de Insumos Externos Alto uso de insumos externos Dependência natural de insumos externos Diversificado, com baixo uso de insumos externos Após a avaliação no campo, gráficos em forma de radar foram plotados, de modo a facilitar a visualização dos indicadores, ao mesmo tempo em que permitiu a observação do padrão geral. Nesses gráficos, os valores foram plotados e os pontos ligados, mostrando que quanto mais próximo estiver da borda do círculo (próximo a nota 10), mais sustentável é o sistema. Ao contrário, quanto mais distante da borda o sistema será menos sustentável. Em cada propriedade rural foi realizado um somatório de todas as notas obtidas dos produtores e dos técnicos, tanto para os indicadores de qualidade do cafeeiro quanto do solo. Esses resultados foram comparados com o somatório máximo que pode ser obtido (130 para o solo e 80 para o café), para verificar quais propriedades rurais se diferenciam e se aproximam em termos de pontuação acumulada para todos os indicadores. RESULTADOS E DISCUSSÃO As Figuras 1 e 2 apresentam os resultados da avaliação realizada nas diferenças propriedades rurais pelos produtores e técnicos. Os sistemas de manejo convencional (A e D) apresentam grande dependência de insumos externos, conforme avaliação feita tanto pelos produtores quanto pelos técnicos, obtendo notas de até 2. Esses sistemas apresentaram uniformidade de maturação irregular, menor tamanho dos grãos e carga pendente quando comparado com os sistemas B, C e E, que apresentam maiores notas para essas características (Figura 1). Figura 1. Notas atribuídas pelos produtores rurais como indicadores da qualidade do café conilon. Alegre, ES, 2011. 1474 Indicadores participativos de qualidade… THOMAZINI, A. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, Supplement 1, p. 1469-1478, Nov. 2013 Figura 2. Notas atribuídas pelos técnicos como indicadores da qualidade do café conilon. Alegre, ES, 2011. Entretanto, os sistemas de cultivo convencionais nem sempre apresentaram baixos rendimentos e qualidade inferior na produção. Existem sistemas que apresentaram altas produtividades, porém demandam maior utilização de tecnologias e insumos. Diante disso, fica evidenciada a importância da adoção de sistemas agroecológicos para a sustentabilidade de agricultores familiares, gerando diversidade, renda extra ao longo do ano e diminuindo sua dependência de insumos externos. Esses dados indicam que os sistemas agroecológicos avaliados são menos dependentes de insumos externos e garantem maior diversidade de produtos ao agricultor além do café (VILELA et al., 2011). Os sistemas agroecológicos, como os sistemas agroflorestais, promovem maior uniformidade e qualidade da produção, maior sustentabilidade e geração de renda para agricultores familiares (PONTES et al., 2011; LOVO et al., 2008, GARCIA, et al., 2007). Os sistemas A e D apresentaram menores notas para a arborização e ausência de seca de ponteiros, o que indica um efeito negativo da radiação solar no cafeeiro, provavelmente devido a presença do componente arbóreo reduzindo a entrada de radiação nas plantas (GARCIA et al., 2007). Isso ocorre devido a falta de componente arbóreo nesses sistemas que protege a planta do efeito da radiação solar. Isso fica evidenciado pela nota 9 para arborização e nota 8 para ausência de seca de ponteiros aplicada pelos técnicos no sistema agroflorestal B. O efeito da copa das árvores em sistemas agroflorestais reduz a entrada da radiação solar e projete a planta contra o excesso da radiação solar, aumentando a qualidade dos grãos de café (SALGADO, 2004). As Figuras 3 e 4 apresentam as notas obtidas pelos diferentes sistemas para a avaliação da qualidade do solo. O manejo convencional apresentou menor diversidade de plantas (indicadoras, espontâneas e cultivadas), com notas chegando a 4,5; 5 e 5, respectivamente. No controle da erosão foi evidenciado que o manejo convencional deixa o solo desprotegido, o que aumenta o risco potencial ao processo erosivo. Os sistemas A e D obtiveram notas até 2 e 4, respectivamente para redução a erosão, mostrando o potencial de perda de solo, água e nutrientes nessas propriedades. Quando observamos as propriedades com manejo agroecológico (B, C e E) as notas foram superiores (9, 9 e 8, respectivamente), evidenciando que o manejo promove a cobertura do solo e reduz o potencial erosivo desses locais. O processo erosivo gera redução do horizonte A, como evidenciado pelas menores notas para a profundidade da camada escura para o manejo conservacionista (A=3; D=5,5). O manejo agroecológico atua na manutenção da fertilidade do solo e é considerado como um fator direto no controle da erosão. Ele gera a proteção devido à manutenção da cobertura do solo e do papel das árvores como barreira ao escoamento superficial, o que aumenta a espessura do horizonte superficial e reduz sua perda (FRANCO et al., 2002). Além disso, a menor cobertura vegetal nesses sistemas reduz a atividade biológica e microbiológica, acarretando menor sustentabilidade conforme verificado pelo comportamento dos sistemas A e D (Figuras 3 e 4). 1475 Indicadores participativos de qualidade… THOMAZINI, A. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, Supplement 1, p. 1469-1478, Nov. 2013 Figura 3. Notas atribuídas pelos produtores como indicadores da sustentabilidade do solo. Alegre, ES, 2011. Figura 4. Notas atribuídas pelos técnicos como indicadores da sustentabilidade do solo. Alegre, ES, 2011. A Tabela 4 apresenta os somatórios das notas para cada sistema, obtidos pelas notas individuais dos produtores e técnicos. Tanto nos indicadores da qualidade do cafeeiro quanto do solo, os sistemas conservacionistas (B, C e E) se aproximam da nota máxima que pode ser obtida (80 e 130, respectivamente). Isso mostra o grande potencial desses sistemas na melhoria da sustentabilidade da produção cafeeira e da conservação do solo (SALGADO, 2004; FEIDEN, 2007). Na avaliação da qualidade do cafeeiro e do solo, as propriedades rurais A e D apresentaram menor somatório total, sendo que as propriedades com manejo agroecológico (B, C e E) o somatório total das notas dos indicadores aproximaram-se da pontuação máxima (80 para os indicadores de café e 130 para os de solo). As diferenças entre as notas dos produtores e técnicos foram dentro do coeficiente de variação dos grupos de avaliadores, indicando que não houve diferenças significativas entre os grupos. As pequenas diferenças estão relacionadas a avaliação de alguns critérios mais específicos dentro de cada propriedade rural, porém as avaliações mostraram que essa metodologia pode ser utilizada como ferramenta pelos agricultores e técnicos extensionistas na avaliação de agroecossistemas (ALTIERI; NICHOLLS, 2002). 1476 Indicadores participativos de qualidade… THOMAZINI, A. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, Supplement 1, p. 1469-1478, Nov. 2013 Tabela 4. Somatório das notas para cada indicador aplicado em cada propriedade rural obtidas pelas avaliações dos técnicos e produtores. Indicadores Cafeeiro Avaliador A B C D E Produtores 44,00 77,00 68,00 52,00 64,50 Técnicos 40,50 76,50 63,00 51,00 64,00 Indicadores Solo Produtores 69,50 122,50 116,50 82,00 104,50 Técnicos 64,00 116,00 114,50 78,50 104,00 Médias seguidas por uma mesma letra nas colunas não diferem entre si, ao nível de 5% de significância. Os sistemas conservacionistas agroecológicos, como o agroflorestal, se mostram como bons indicadores quanto à maior sustentabilidade do agroecossistema. Para que haja melhora na sustentabilidade dos agroecossistemas, estes devem ser desenhados para se aproximarem dos ecossistemas naturais em termos de características, como diversidade de espécies e ciclagem de nutrientes (GLIESSMAN, 2005; FEIDEN, 2007). A formação de serapilheira apresenta-se como um importante passo na melhoria da qualidade e sustentabilidade dos agroecossistemas. Ela promove aumento da cobertura vegetal, aumenta os teores da matéria orgânica do solo, promove ciclagem de nutrientes, reduz potencialidade do processo erosivo, aumenta retenção de umidade e promove melhores condições físicas ao desenvolvimento das plantas no solo (CAMPANHA et al., 2007). CONCLUSÕES A sustentabilidade do café nos sistemas agroecológicos avaliados mostrou-se uma alternativa para os agricultores para diversificação da produção, menor utilização de insumos externos e na contribuição para gerar rendar extras ao longo do ano. Foram observadas várias melhorias nos indicadores físicos, químicos e biológicos dos solos cultivados sob manejo agroecológico. A metodologia foi empregada com facilidade pelos agricultores e é uma forma simples e prática para os mesmos monitorarem seus sistemas de cultivo. AGRADECIMENTOS Aos agricultores pelo interesse no trabalho, ao CNPq pela bolsa de iniciação científica dos dois primeiros autores e pela bolsa de produtividade em pesquisa do último autor. ABSTRACT: Participatory evaluation of agroecosystems is a fast and easy application for assessing the sustainability of family farming properties. This study aimed to implement in five farms in Alegre (ES), a practical and easily applied by farmers in participatory evaluation of quality characteristics Coffea canephora and soil. Five sites were evaluated with conventional management system agroecological farming and conservation. From observations made in the field notes were assigned to the indicators of quality of coffee and soil. The scores range from 1 to 10 in 3 steps (0-5, 5-8 and 8-10). Graphics in the form of radar were plotted, representing the state of each indicator and being compared with the different perceptions of producers and technicians of the agricultural site. The diagram indicates the quality of coffee in the conventional high dependence on external inputs (note 2) and large effect of solar radiation by the lack of vegetation in dry hands (note 3). As for the soil quality in conservation system showed better erosion control (note 9), increased depth of the dark layer (note 9) and more diversity of plants (note 9.5). Agroecological farming systems conservationists promote greater sustainability of family farming and optimize agricultural production. KEYWORDS: Participatory methodology. Farmers. Agroecological management. Sustainability. 1477 Indicadores participativos de qualidade… THOMAZINI, A. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, Supplement 1, p. 1469-1478, Nov. 2013 REFERÊNCIAS ALTIERI, M. A.; NICHOLS, C. I. Agroecologia: teoria y aplicaciones para una agricultura sustentable. Berkeley: University California, 1999, p.115. ALTIERI, M. A.; NICHOLLS, C. I. Un método agroecologico rapido para la evaluación de la sostenibilidad de cafetales. Manejo Integrado de Plagas y Agroecologia, Costa Rica, v. 64, p. 17-24, 2002. BRINATE, S. V. B.; NOGUEIRA, N. O.; MARTINS, L. D; TOMAZ, M. A.; ANDRADE, F. V ; PASSOS, R. R. 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