Microsoft Word - 25-Agra_15197 1513 Original Article Biosci. J., Uberlandia, v. 30, n. 5, p. 1513-1521, Sept./Oct. 2014 CARACTERÍSTICAS MORFOGÊNICAS E ESTRUTURAIS DO CAPIM- BRAQUIÁRIA EM LOCAIS DO MESMO PASTO COM DISTINTOS GRAUS DE PASTEJO MORPHOGENETICAL AND STRUCTURAL CHARACTERISTICS OF SIGNAL GRASS IN THE LOCATIONS OF SAME PASTURE WITH DIFFERENT GRAZING DEGREES Manoel Eduardo Rozalino SANTOS1; Dilermando Miranda da Fonseca2; Virgilio Mesquita GOMES3; Victor Valério de CARVALHO4; Ronan Lopes ALBINO4; Leonardo Santos MOURA5 1. Professor, Doutor, Faculdade de Medicina Veterinária – FAMEV, Universidade Federal de Uberlândia - UFU, Uberlândia, MG, Brasil. manoeleduardo@famev.ufu.br; 2. Professor, Doutor, Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa - UFV, Viçosa, MG, Brasil; 3. Professor do Departamento de Zootecnia da Universidade Estadual de Montes Claros, Montes Claros, MG, Brasil; 4. Zootecnista pela UFV, Viçosa, MG, Brasil; 5. Engenheiro Agrônomo pela UFV, Viçosa, MG, Brasil. RESUMO: Em locais de um mesmo pasto, existem plantas submetidas aos distintos graus de pastejo, o que desencadeia mudanças nas suas características morfogênicas e estruturais, como forma de otimizar o seu crescimento e persistência. Desse modo, objetivou-se avaliar a morfogênese de perfilhos em locais do mesmo pasto de Brachiaria decumbens cv. Basilisk (capim-braquiária) com níveis de pastejo variáveis, quais sejam: local com subpastejo, com pastejo adequado e com sobrepastejo. O capim-braquiária foi manejado em lotação contínua com bovinos e com altura média de 25 cm. Adotou-se o delineamento em blocos casualizados com três repetições. A taxa de aparecimento foliar foi inferior no local subpastejado em relação aos demais locais avaliados. Contudo, o filocrono, a duração de vida da folha, o número de folha morta e as taxas de alongamento de colmo e de senescência foliar foram maiores no local subpastejado, quando cotejado aos locais com pastejo adequado e com sobrepastejo. Os números de folhas expandidas, em expansão e vivas não diferiram entre os locais avaliados. A taxa de alongamento foliar e os comprimentos da lâmina foliar e do pseudocolmo foram menores no local com sobrepastejo em comparação aos outros locais avaliados. O pastejo desuniforme dos bovinos faz com que as características morfogênicas e estruturais dos perfilhos de B. decumbens sejam variáveis no plano horizontal da pastagem, o que resulta na estrutura horizontal do pasto. PALAVRAS-CHAVE: Brachiaria decumbens. Lotação contínua. Perfilho. Variabilidade espacial da vegetação. INTRODUÇÃO Os pastos tropicais geralmente apresentam típica variabilidade espacial da vegetação, que é caracterizada pela ocorrência de plantas forrageiras com distintas características estruturais no plano horizontal da pastagem (BARTHRAM et al., 2005; BRAGA et al., 2007; MOREIRA et al., 2009). Uma das causas dessa heterogeneidade da vegetação é o pastejo seletivo dos ruminantes, que determinam locais na pastagem com diferentes níveis de severidade de desfolhação, mesmo quando o pasto é manejado de forma adequada. Dessa forma, devido à maior possibilidade de seleção pelos animais dos componentes morfológicos do pasto manejado em lotação contínua, é comum ocorrerem locais com subpastejo e, ou superpastejo no mesmo pasto; o que modifica as suas características estruturais e, por conseguinte, influencia a produção primária e secundária da pastagem. Nesse contexto, o estudo da morfogênese das gramíneas forrageiras tropicais em distintos locais do mesmo pasto torna-se relevante e apropriado, pois permite conhecer os mecanismos de desenvolvimento e persistência da planta forrageira em condições variáveis de desfolhação (SBRISSIA; SILVA, 2008). A avaliação da morfogênese permite a compreensão de como ocorre o desenvolvimento dos órgãos das plantas forrageiras e também contribui para o melhor entendimento da dinâmica de produção de forragem nas pastagens (POMPEU et al., 2009; COTRIM Jr et al., 2010; MACEDO et al., 2010) manejadas com diferentes severidades de pastejo. De fato, em grande número de trabalhos de pesquisa, avaliaram-se diferentes severidades de pastejo, cada qual empregada sobre pastos distintos, a fim de se recomendar o manejo do pastejo (CARLOTO et al., 2008; SBRISSIA; DA SILVA, 2008; NANTES et al., 2013). Nestes trabalhos, com plantas forrageiras manejadas em lotação contínua, certamente ocorreu variação espacial e temporal da severidade de desfolhação no plano horizontal de um mesmo pasto, de modo que seus resultados são Received: 12/05/12 Accepted: 05/05/14 1514 Características morfogênicas... SANTOS, M. E. R. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, n. 5, p. 1513-1521, Sept./Oct. 2014 consequências dessa inerente dinâmica de rebrotação e plasticidade fenotípica, que geram as variações na estrutura do pasto. Contudo, ainda são escassos estudos para quantificar as características morfogênicas e estruturais de perfilhos com diferenciados graus de pastejo no mesmo pasto, o que é possível devido à desuniformidade do pastejo animal e à variabilidade espacial da vegetação, processos inerentes ao ecossistema pastagem (HIRATA, 2002; SCHWARTZ et al., 2003). Assim, esse trabalho foi realizado com o objetivo de avaliar as características morfogênicas e estruturais de perfilhos em locais do mesmo pasto de Brachiaria decumbens cv. Basilisk com graus de pastejo variáveis. MATERIAL E MÉTODOS Este trabalho foi conduzido de setembro a dezembro de 2009 numa pastagem de Brachiaria decumbens cv. Basilisk Stapf. (capim-braquiária) estabelecida em 1997, pertencente ao Setor de Forragicultura do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa, em Viçosa-MG (20º45' S; 42º51' W; 651 m). A área experimental foi constituída de três piquetes (repetições) de aproximadamente 0,25 ha cada, além de uma área reserva. O solo da área experimental é Latossolo Vermelho-Amarelo de textura argilosa. A análise química do solo, realizada no início do período experimental, na camada 0-20 cm, apresentou os seguintes resultados: pH em H2O: 5,1; P: 2,9 (Mehlich-1) e K: 85 mg/dm3; Ca2+: 2,05; Mg2+: 0,45 e Al3+: 0,19 cmolc/dm 3 (KCl 1 mol/L). Durante o experimento, os dados climáticos foram registrados em estação meteorológica distante da área experimental aproximadamente 500 m (Tabela 1). As adubações dos pastos foram efetuadas previamente a este experimento. A adubação fosfatada foi efetuada em janeiro de 2009, com a aplicação de 70 kg/ha de P2O5, na forma de superfosfato simples, em toda área experimental. A adubação nitrogenada, na forma de uréia, foi realizada em três aplicações de 50 kg/ha de N ao final da tarde de cada data de aplicação (16/01/2008, 26/02/2008 e 07/04/2008). Tabela 1. Médias mensais da temperatura média diária, insolação, precipitação pluvial total mensal e evaporação total mensal durante os períodos de setembro a dezembro de 2009 Mês Temperatura média do ar (°C) Insolação (horas/dia) Precipitação pluvial (mm) Evaporação (mm) Setembro 21,1 4,9 72,2 86,8 Outubro 21,7 3,8 127,9 68,7 Novembro 23,1 5,6 131,5 85,1 Dezembro 22,4 3,2 333,1 58,5 Desde o final de abril até o início de julho de 2009, os pastos de capim-braquiária permaneceram diferidos (sem animais). Depois desse período, até o fim de setembro de 2009, os pastos diferidos foram utilizados sob lotação contínua com bovinos e taxa de lotação fixa de aproximadamente 3,0 UA/ha. Com o início das primeiras chuvas, a partir do fim de setembro até o final de dezembro de 2009, os piquetes foram manejados sob lotação contínua com taxa de lotação variável a fim de manter a altura do pasto em cerca de 25 cm, de acordo com recomendação de Faria (2009). Para isso, a altura do pasto foi monitorada duas vezes por semana e foram utilizados bovinos machos, em recria, com peso médio de 200 kg. Entre os meses de outubro a dezembro de 2009, foram avaliadas as características morfogênicas do capim-braquiária em locais da mesma pastagem com diferentes graus de pastejo. Para isso, foram identificados três locais no mesmo pasto, avaliados segundo o delineamento em blocos ao acaso com três repetições. Os locais avaliados foram: Subpastejado: local onde o pasto estava com altura, no mínimo, duas vezes superior à sua altura média (com plantas com mais de 50 cm de altura); Adequado: local em que o pasto estava com sua altura média, ou seja, com plantas de aproximadamente 25 cm; Sobrepastejado: local da pastagem em que o pasto possuía menos de 50% de sua altura média (com plantas com menos de 12,5 cm de altura). A avaliação morfogênica ocorreu em 24 perfilhos por piquete, sendo marcados oito perfilhos em cada local do pasto avaliado. Os locais do pasto foram identificados através do enterrio de 12 hastes metálicas, com aproximadamente 60 cm de comprimento, contendo uma fita plástica colorida em sua ponta. Próximo de cada haste metálica, foram identificados e marcados, por meio de anel plástico colorido, dois perfilhos basais, cada qual 1515 Características morfogênicas... SANTOS, M. E. R. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, n. 5, p. 1513-1521, Sept./Oct. 2014 com cerca de três a quatro folhas no início da avaliação. Estes foram avaliados durante três ciclos de coleta de dados, de no mínimo quatro semanas. Em cada ciclo, novos locais e novos grupos de perfilhos foram selecionados para avaliação. Com o auxílio de uma régua graduada, foram efetuadas medições do comprimento das lâminas foliares e do pseudocolmo dos perfilhos marcados, duas vezes por semana. O comprimento das folhas expandidas foi medido desde a ponta da folha até sua lígula. No caso de folhas em expansão, o mesmo procedimento foi adotado, porém considerou-se a lígula da última folha expandida como referencial de mensuração. Para folhas em senescência, o comprimento correspondeu à distância desde a lígula até a porção da lâmina foliar que ainda apresentava cor verde. O tamanho do colmo foi mensurado como a distância desde a superfície do solo até a lígula da folha mais jovem completamente expandida. A partir dessas informações foram calculadas as variáveis: Taxa de aparecimento foliar: número de folhas surgidas por perfilho dividido pelo número de dias do período de avaliação; Filocrono: inverso da taxa de aparecimento foliar; Taxa de alongamento foliar: somatório de todo alongamento da lâmina foliar por perfilho dividido pelo número de dias do período de avaliação; Taxa de alongamento de colmo: somatório de todo alongamento de colmo e, ou, pseudocolmo por perfilho dividido pelo número de dias do período de avaliação; Duração de vida da folha (DVF): estimada pela equação DVF = NFEx x Filocrono (LEMAIRE; CHAPMAN, 1996), em que NFEx corresponde ao número de folhas expandidas por perfilho; Taxa de senescência foliar: variação média e negativa no comprimento da lâmina foliar, resultado da diminuição da porção verde da lâmina foliar, dividido pelo número de dias do período de avaliação; Número de folhas em expansão por perfilho: número médio de folhas em alongamento por perfilho, cuja lígula ainda não estava exteriorizada; Número de folhas expandidas por perfilho: número médio de folhas por perfilho, cuja lígula já estava exteriorizada; Número de folha morta por perfilho: número médio de folhas por perfilho com mais de 50% da lâmina foliar senescente; Comprimento da lâmina foliar: comprimento médio de todas as folhas expandidas presentes no perfilho; Comprimento do pseudocolmo: comprimento médio dos pseudocolmos. As análises dos dados experimentais foram feitas usando-se o Sistema para Análises Estatísticas - SAEG, versão 8.1 (UFV, 2003). Foi realizada análise de variância e, posteriormente, compararam- se os locais do mesmo pasto pelo teste de Dms, ao nível de 5% de probabilidade para ocorrência do erro tipo I. RESULTADOS E DISCUSSÃO A taxa de aparecimento foliar foi inferior no local subpastejado, quando comparada aos locais com pastejo adequado e sobrepastejado (Figura 1A). Este fato pode ser explicado pelo maior tamanho do pseudocolmo dos perfilhos situados nos locais do pasto com subpastejo (Figura 6B), uma vez que, pseudocolmos de maior comprimento tendem a aumentar o intervalo entre o surgimento de duas folhas consecutivas e, portanto, reduzir a taxa de aparecimento foliar (DURO; DUCROCQ, 2000). 0,11b 0,14a 0,15a 0 0,02 0,04 0,06 0,08 0,1 0,12 0,14 0,16 Subpastejado Adequado Sobrepastejado fo lh a/ pe rf ilh o. d ia Local do pasto Médias seguidas de letras distintas diferem pelo teste Dms (P<0,05). Figura 1. Taxa de aparecimento foliar do capim-braquiária em locais do mesmo pasto com distintos graus de pastejo. 1516 Características morfogênicas... SANTOS, M. E. R. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, n. 5, p. 1513-1521, Sept./Oct. 2014 Padrão de resposta inverso foi observado para o filocrono, que foi superior no local do pasto com subpastejo em relação àqueles locais com pastejo adequado e sobrepastejado (Figura 1B). Esse resultado é coerente haja vista que o filocrono é o inverso da taxa de aparecimento foliar. Esse mesmo padrão de resposta foi verificado por Santos et al. (2011) em avaliação da B. decumbens cv. Basilisk com alturas variáveis no mesmo pasto, em que plantas com maior altura apresentaram menor taxa de aparecimento foliar e maior filocrono. Considerando que o número de folha viva por perfilho é uma característica genotípica bastante estável na ausência de deficiências hídricas e nutricionais (NABINGER; PONTES, 2001), maior filocrono observado nos perfilhos localizados no local subpastejado poderia levar à inferência de que estes perfilhos levariam mais tempo para atingir o número máximo de folha e, portanto, para iniciar o processo de senescência. Porém, no local subpastejado ocorreu maior taxa de senescência foliar (Figura 2A). 0,33a 0,08b 0,13b 0 0,05 0,1 0,15 0,2 0,25 0,3 0,35 Subpa steja do Adequa do Sobrepa steja do cm /p er fi lh o .d ia Loca l do pa sto A 32,3a 27,7b 26,2b 0 5 10 15 20 25 30 35 Subpa steja do Adequa do Sobrepa steja do D ia Loca l do pa sto B Para cada gráfico, médias seguidas de letras distintas diferem pelo teste Dms (P<0,05). Figura 2. Taxa de senescência foliar (A) e duração de vida da folha (B) do capim-braquiária em locais do mesmo pasto com distintos graus de pastejo. Os perfilhos de capim-braquiária presentes no local subpastejado se desenvolveram, possivelmente, em um microclima mais sombreado, condicionado pela maior altura das plantas nesses locais com menor severidade de pastejo. O maior sombreamento pode ter feito com que as lâminas foliares, principalmente as de nível de inserção inferior no perfilho, ultrapassassem o ponto de compensação luminoso, situação na qual a taxa de fotossíntese é inferior à taxa de respiração foliar, o que resulta em balanço energético negativo e, com efeito, em senescência do órgão (TEIZ; ZEIGER, 2004). Ademais, os perfilhos no local subpastejado, provavelmente, tinham maior idade, o que também justifica sua maior taxa de senescência foliar. A menor taxa de senescência foliar nos locais com sobrepastejo (Figura 2) pode ter ocorrido em razão da maior frequência e intensidade de desfolhação a que esses perfilhos foram submetidos, quando comparado ao local com subpastejo. Com isso, provavelmente, as lâminas foliares foram consumidas antes de iniciarem a senescência. A duração de vida da folha foi superior no local do pasto com subpastejo, quando comparada aos locais com pastejo adequado e com sobrepastejo (Figura 2B). É possível que a lâmina foliar de maior comprimento nos locais com subpastejo, em relação àqueles com sobrepastejo e com pastejo adequado (Figura 6A), tenha demorado mais tempo para que mais da metade de seu comprimento total tornasse senescente e, assim, fosse considerada morta. Isso explicaria a maior duração de vida da folha no local do pasto com subpastejo. A taxa de alongamento de pseudocolmo foi superior no local com subpastejo quando cotejada aos locais com sobrepastejo e pastejo adequado (Figura 3A). A maior taxa de alongamento de pseudocolmo nos locais do pasto com subpastejo pode ser resultado da elevada competição por luz entre os perfilhos. Nessa condição, a planta prioriza a alocação de carbono no alongamento dos entrenós, para posicionar a nova área foliar nas camadas menos sombreadas do dossel (LEMAIRE, 2001). No tocante à taxa de alongamento foliar, seus valores foram menores no local com sobrepastejo, intermediários nos locais com subpastejo e maiores nos locais com pastejo adequado (Figura 3B). Provavelmente, o maior nível de desfolhação ocorrido no local com sobrepastejo causou efeitos adversos ao capim-braquiária, tal como redução da área foliar e da interceptação de luz pela planta, o que pode ter diminuído a fotossíntese e, com efeito, o alongamento foliar. A alta intensidade e, ou, frequência de pastejo no locam sobrepastejo também pode ter resultado em decréscimo na participação relativa das lâminas foliares de maior capacidade fotossintética (PARSONS et al., 1988), o que também concorre 1517 Características morfogênicas... SANTOS, M. E. R. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, n. 5, p. 1513-1521, Sept./Oct. 2014 para a inferior taxa de alongamento foliar nesse local do pasto. 0,31a 0,15b 0,12b 0 0,05 0,1 0,15 0,2 0,25 0,3 0,35 Subpa steja do Adequa do Sobrepa steja do cm /p er fi lh o .d ia Loca l do pa sto A 1,2a b 1,79a 0,93b 0 0,2 0,4 0,6 0,8 1 1,2 1,4 1,6 1,8 2 Subpa steja do Adequa do Sobrepa steja do cm /p er fi lh o .d ia Loca l do pa sto B Para cada gráfico, médias seguidas de letras distintas diferem pelo teste Dms (P<0,05). Figura 3. Taxas de alongamentos de colmo (A) e de folha (B) do capim-braquiária em locais do mesmo pasto com distintos graus de pastejo. Além disso, em locais com maior frequência de desfolhação, é possível que o crescimento das lâminas foliares possa ter sido subestimado, na medida em que a frequência de desfolhação dos perfilhos pode ter sido superior à frequência com que os mesmo foram mensurados. Por outro lado, a maior taxa de alongamento foliar no local com pastejo adequado foi consequência da apropriada adaptação do capim- braquiária ao nível de desfolhação que estava ocorrendo nesse local do pasto, com plantas de 25 cm de altura. Realmente, para o capim-braquiária, a manutenção do pasto com altura média de 25 cm caracteriza um nível de desfolhação compatível com a capacidade de resistência e tolerância dessa planta forrageira ao pastejo, conforme demonstram os trabalhos de Faria (2009). Com relação às características estruturais do capim-braquiária, constatou-se que os números de folhas expandidas (NFEx) e em expansão (NFEmEx), que constituem as folhas vivas do perfilho, não foram modificados (P>0,05) pelo local do pasto avaliado (Figura 4). Segundo Lemaire e Chapman (1996), o número de folha viva por perfilho, apesar de determinado geneticamente, pode variar com as condições de ambiente. Portanto, o número constante de folha viva em perfilhos nos locais avaliados do mesmo pasto pode ser resultado de condições de meio insuficientes para promover mudanças nesta variável. 3,7a 3,9a 3,9a 0 1 2 3 4 Subpa steja do Adequa do Sobrepa steja do N ° fo lh a/ p er fi lh o Loca l do pa sto A 1,0a 0,9a 1,0a 0 1 2 3 4 Subpa steja do Adequa do Sobrepa steja do N ° fo lh a/ p er fi lh o Loca l do pa sto B Para cada gráfico, médias seguidas de letras distintas diferem pelo teste Dms (P<0,05). Figura 4. Números de folhas expandidas (A) e em expansão (B) do capim-braquiária em locais do mesmo pasto com distintos graus de pastejo. Em adição, os números constantes de folhas expandidas e em expansão por perfilho podem ter sido decorrentes da plasticidade fenotípica do capim-braquiária, que pode ter alterado sua morfogênese por meio de ajustes nas taxas de aparecimento foliar e duração de vida das folhas (Figuras 1A e 2B) de forma a manter relativamente estável o número de folha viva por perfilho. Os valores de NFEx e NFEmEx (Figura 4) foram similares àqueles obtidos por Fagundes et al. (2006), em trabalho com a mesma planta forrageira sob lotação contínua e adubada com nitrogênio. Neste trabalho, o capim-braquiária apresentou, em 1518 Características morfogênicas... SANTOS, M. E. R. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, n. 5, p. 1513-1521, Sept./Oct. 2014 média, aproximadamente 3,9 e 1,1 folhas expandidas e em expansão por perfilho, respectivamente. Dessa forma, existem evidências de que, para a B. decumbens cv. Basilisk, o valor de NFEmEx é relativamente constante em torno de uma unidade. De outro modo, o número de folha morta por perfilho foi superior no local do pasto com subpastejo em relação aos locais com pastejo adequado e sobrepastejo (Figura 5). Esse resultado pode ser explicado pela maior taxa de senescência foliar ocorrida no local com subpastejo (Figura 2A). 2a 0,9b 1,3b 0 1 2 3 4 Subpa steja do Adequa do Sobrepa steja do N ° fo lh a/ p er fi lh o Loca l do pa sto Para cada gráfico, médias seguidas de letras distintas diferem pelo teste Dms (P<0,05). Figura 5. Número de folhas mortas do capim-braquiária em locais do mesmo pasto com distintos graus de pastejo. Como os locais mais altos do mesmo pasto tendem a serem submetidos às menores frequências e intensidades de desfolhação, enquanto que os locais mais baixos do mesmo pasto, em geral, são pastejados de forma mais intensa e frequente pelos bovinos (CARVALHO et al., 2001), os menores comprimentos de lâminas foliares e pseudocolmos observados em plantas mais baixas pode ser uma resposta morfológica de adaptação dos perfilhos às condições de desfolhação vigentes nesses locais do pasto. De fato, os perfilhos de plantas mais baixas, nos locais com sobrepastejo, apresentaram pseudocolmos e lâminas foliares de menor tamanho em comparação aos perfilhos situados nos locais com pastejo adequado e com subpastejo (Figura 6). Essas adaptações morfológicas, que caracterizam a plasticidade fenotípica do capim-braquiária, ocorrem para diminuir a probabilidade e a intensidade de desfolhações futuras nas lâminas foliares das plantas com menor altura no mesmo pasto de capim-braquiária. Contudo, como em lotação contínua é permitida maior oportunidade de seleção ao animal, essas folhas podem ser novamente desfolhadas. 8,4a 8,3a 7,3b 0 2 4 6 8 10 Subpa steja do Adequa do Sobrepa steja do cm Loca l do pa sto A 10,3a 8,9a b 7,7b 0 2 4 6 8 10 12 Subpa steja do Adequa do Sobrepa steja do cm Loca l do pa sto B Para cada gráfico, médias seguidas de letras distintas diferem pelo teste Dms (P<0,05). Figura 6. Comprimento da lâmina foliar (A) e do pseudocolmo (B) do capim-braquiária em locais do mesmo pasto com distintos graus de pastejo. O menor comprimento da lâmina foliar no local com sobrepastejo pode ser explicado pelo inferior tamanho dos perfilhos nesses locais do pasto. Em perfilhos menores, as folhas mais novas precisam fazer curto percurso no pseudocolmo para se exporem. Com isso, a distância percorrida pela folha desde o ponto de conexão com o meristema até a extremidade do pseudocolmo é menor, resultando no seu menor comprimento (SKINNER; NELSON, 1995). O comprimento do pseudocolmo também foi menor no local com sobrepastejo em relação 1519 Características morfogênicas... SANTOS, M. E. R. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, n. 5, p. 1513-1521, Sept./Oct. 2014 àqueles com pastejo adequado e subpastejo (Figura 6B). O menor sombreamento, comum nos locais com plantas mais baixas (sobrepastejados), também podem justificar o inferior alongamento dos colmos nesses locais (Figura 3A), conforme discutido anteriormente. A própria desfolhação mais severa nesses locais do pasto impede que os perfilhos alcancem maior tamanho e, com isso, seus colmos são mais curtos. Os dados apresentados nesse trabalho permitem afirmar que, em um pasto submetido ao mesmo critério de manejo do pastejo, as características morfogênicas e estruturais dos perfilhos são variáveis no plano horizontal da pastagem. Essa variabilidade da morfogênese no pasto é resultado da estrutura horizontal do pasto, que gera microclimas distintos ao longo da área da pastagem. Este microclima, por sua vez, altera as respostas morfogênicas e a estrutura dos perfilhos individuais, o que contribui para a existência e manutenção da sua estrutura horizontal. Os padrões de resposta das características morfogênicas e estruturais do capim-braquiária, de acordo com o grau de desfolhação vigente no mesmo pasto (Figuras 1 a 6), foram semelhantes aos verificados em outros trabalhos de pesquisa, em que os graus de desfolhação foram estudados em pastos diferentes, cada com um nível de severidade de desfolhação (PINTO et al., 2001; PONTES et al., 2003; FARIA, 2009). Isso indica que as respostas morfogênicas e estruturais da planta forrageira são semelhantes, independentemente se o ambiente de desfolhação é avaliado em todo o pasto ou em locais com áreas restritas dentro do mesmo pasto. Como consequência, existe a possibilidade de se realizar mudança metodológica na idealização de experimentos com avaliação de gramíneas forrageiras sob pastejo, de modo que os efeitos de distintas severidades de desfolhação sobre a planta forrageira poderiam ser avaliados em um mesmo pasto, aproveitando-se da sua inerente variabilidade espacial da vegetação causada pelo pastejo seletivo dos ruminantes. Essa hipótese, que ainda precisa ser melhor avaliada, é diferente dos atuais protocolos de experimentação vigentes na pesquisa nacional, onde as severidades de desfolhação sobre a planta forrageira são implementadas e avaliadas em toda a área da pastagem. Quando as severidades de desfolhação são avaliadas em diferentes locais do mesmo pasto manejado em lotação contínua, reduz-se consideravelmente o tamanho da área experimental e, com isso, os custos e o trabalho com a pesquisa; porém não é possível obter importantes respostas de desempenho animal e produção animal por área. Por outro lado, a avaliação da severidade de desfolhação em toda a área da pastagem resulta na necessidade de maior área experimental, com possibilidade de obtenção das resposta dos animais em pastejo. A variabilidade espacial da severidade de pastejo no mesmo pasto de B. decumbens cv. Basilisk, modifica o fluxo de tecidos e a estrutura da gramínea forrageira, o que possibilita a avaliação de distintas severidades de pastejo sobre a planta forrageira no mesmo pasto. AGRADECIMENTOS Ao Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa, pela concessão da infraestrutura necessária ao desenvolvimento da pesquisa. ABSTRACT: In areas the same pasture, there are plants of different grazing degrees, which triggers changes in their morphogenetic and structural characteristics as a way to optimize their growth and persistence. Thus, this study was conducted to evaluate the morphogenesis of tillers in areas of same Brachiaria decumbens cv. Basilisk pasture (signalgrass) with variable grazing levels, namely: undergrazed site, site with proper grazing and overgrazed site. The signalgrass was managed with grazing cattle and with an average height of 25 cm. The randomized block design with three replications was adopted. The leaf appearance rate was lower in undergrazed site compared to other sites evaluated. However, the phyllochron, the leaf lifespan, the dead leaf number and stem elongation and leaf senescence rates were greater in undergrazed site when comparing the sites with proper and over grazing. The numbers of expanded, expanding and live leaves did not differ between the sites evaluated. The leaf elongation rate and the leaf and stem lengths were lower in overgrazed site compared to other sites evaluated. The uneven grazing of cattle causes variability in morphogenetic and structural characteristics of B. decumbens tillers in horizontal plane of pasture, resulting in the horizontal structure of pasture. KEYWORDS: Brachiaria decumbens. Continuous stocking. Spatial variability of vegetation. Tiller. 1520 Características morfogênicas... SANTOS, M. E. R. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, n. 5, p. 1513-1521, Sept./Oct. 2014 REFERÊNCIAS BARTHRAM, E.; DUFF, G. T. I.; ELSTON, D. A.; GRIFFITHS, J. H.; COMMON, T. G.; MARRIOTT, C. A. Frequency distributions of sward height under sheep grazing. Ltd. Grass and Forage Science, Inglaterra, v. 60, p. 4-16, 2005. BRAGA, G. J.; PEDREIRA, C. G. S.; HERLING, V. R.; LUZ, P. H. C. Eficiência de pastejo de capim- marandu submetido a diferentes ofertas de forragem. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 49, n. 11, p. 1641-1649, 2007. CARLOTO, M. N.; EUCLIDES, V. P. B.; MONTAGNER, D. B. et al. Desempenho animal e características de pasto de capim-xaraés sob diferentes intensidades de pastejo, durante o período das águas. Pesquisa Agropecuária Brasileira, Brasília, v. 43, n. 3, p. 429-435, 2008. CARVALHO, P. C. F.; RIBEIRO FILHO, H. M. 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