Microsoft Word - 37-Agra_18187 346 Original Article Biosci. J., Uberlandia, v. 30, supplement 1, p. 346-353, June/14 BIOATIVIDADE DE PÓS DE ESPÉCIES VEGETAIS SOBRE A REPRODUÇÃO DE Callosobruchus maculatus (FABR. 1775) (COLEOPTERA: BRUCHIDAE) BIOACTIVITY OF POWDERS FROM PLANT SPECIES ON REPRODUCTION OF Callosobruchus maculatus (FABR. 1775) (COLEOPTERA: BRUCHIDAE) Bruno Adelino de MELO1; Adrian José MOLINA-RUGAMA2; Delzuite Teles LEITE1; Maurício Sekiguchi de GODOY2; Elton Lucio de ARAUJO2 1. Engenheiro Agrônomo, Mestre em Engenharia Agrícola, Centro de Tecnologia e Recursos Naturais, Universidade Federal de Campina Grande - UFCG, Campina Grande, PB, Brasil. 2. Professor Adjunto, Doutor em Entomologia, Departamento de Ciências Vegetais – DCV, Universidade Federal Rural do Semi-Árido - UFERSA, Mossoró, RN, Brasil. amolina@ufersa.edu.br; 3. Engenheira Agrônoma, Mestranda em Horticultura Tropical, Centro de Ciências e Tecnologia Agroalimentar, UFCG, Pombal, PB, Brasil. RESUMO: Os inseticidas de origem botânica têm-se mostrado uma alternativa promissora na redução de insetos que atacam grãos armazenados. O objetivo neste trabalho foi avaliar o potencial inseticida de nove espécies vegetais na reprodução de Callosobruchus maculatus (Fabr., 1775) (Coleoptera: Bruchidae). Folhas e ramos das plantas cumaru (Amburana cearensis), marmeleiro (Croton sonderianus), mussambê (Cleome spinosa), jurema-preta (Mimosa tenuiflora), angico (Anadenanthera macrocarpa), pereiro (Aspidosperma pyrifolium), mangirioba (Senna occidentalis), alfazema-brava (Hyptis suaveolens) e juazeiro (Ziziphus joazeiro) foram secos e moídos, separadamente, até obter um pó fino e, posteriormente, aplicados sobre amostras de grãos de feijão-caupi (45 g) contidas em copos plásticos (100 mL). Cada amostra foi infestada com um casal recém-emergido de C. maculatus e registrada a oviposição de cada fêmea. Grãos infestados, mas sem adição de pó foram utilizados como testemunha. O estudo foi realizado em delineamento inteiramente casualizado com cinco repetições, em arranjo fatorial 9 x 2 + 1, correspondente às espécies de plantas, tipos de pó e testemunha, respectivamente. Para cada tratamento foi avaliado o número total de ovos por fêmea, o número de adultos emergidos e a razão sexual de C. maculatus. A sobrevivência dos adultos não foi afetada pela presença de pó quando comparada à testemunha. A média total de ovos variou entre 68,7 e 85,3 e não foi diferente entre os tratamentos. Contudo, grãos tratados com pó de folhas de mussambê e pó de ramos de juazeiro e pereiro tiveram a menor emergência de adultos (entre 68,1 e 70,9%). De forma semelhante, a razão sexual de C. maculatus foi reduzida em grãos tratados com pó de folhas de mussambê e pó de ramos das espécies jurema-preta, angico e pereiro com, aproximadamente, 40% de fêmeas a menos. PALAVRAS-CHAVE: Vigna unguiculata. Pragas de grãos armazenados. Caruncho-do-feijão. Plantas inseticidas. Plantas da Caatinga. INTRODUÇÃO O feijão-caupi, Vigna unguiculata (L.) Walp., é uma leguminosa de grande importância para o desenvolvimento agrícola de muitas regiões tropicais e subtropicais no mundo. No Brasil, as regiões Norte e Nordeste caracterizam-se como as principais produtoras dessa leguminosa, fornecendo à população um alimento rico em proteína e com alto valor energético (FROTA et al., 2008). Embora os grãos de feijão sejam consumidos nas propriedades rurais ou comercializados no mercado local, muitos agricultores armazenam esse produto para ser utilizado durante a época da seca ou como sementes no plantio da estação chuvosa. Sob essa condição, diversos grupos de insetos também utilizam esse recurso como fonte de alimento, reduzindo a quantidade e a qualidade de grãos durante o armazenamento (GALLO et al., 2002). O caruncho-do-feijão, Callosobruchus maculatus (Fabr., 1775) (Coleoptera: Bruchidae), é considerado o inseto de maior importância para o feijão-caupi (OFUYA, 1986; EHLERS; HALL, 1997; BRITO et al., 2006). O ataque dessa praga pode ocorrer ainda quando a cultura encontra-se no campo, principalmente, quando as fêmeas ovipositam nos grãos expostos ou quando estas voam até os locais de depósitos nas propriedades rurais. A injúria é causada quando as larvas penetram nos grãos, alimentando-se do seu conteúdo interno provocando a perda de peso, redução do valor nutritivo e do poder germinativo das sementes. Além disso, a presença de excrementos, de ovos e de adultos na massa de Received: 19/09/12 Accepted: 05/02/14 347 Bioatividade de pós de espécies... MELO, B. A. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, supplement 1, p. 346-353, June/14 grãos reduz o seu valor comercial (OLIVEIRA et al. 1984). Em decorrência disso, os agricultores realizam medidas de controle de pragas antes e durante o armazenamento, já que pequenas infestações, entre 3% e 5%, são suficientes para provocarem grandes perdas de grãos (MAINA; LALE, 2004). O uso de produtos químicos de diversas classes toxicológicas é o método de controle mais empregado contra o C. maculatus. Apesar do baixo custo e da alta eficiência que esses produtos apresentam no manejo de insetos que atacam produtos armazenados (ZETTLER; ARTHUR, 2000), o uso intensivo pode provocar diversos problemas como, por exemplo, o surgimento de insetos resistentes, acúmulo de resíduos tóxicos nos alimentos de consumo humano, contaminação do ambiente e, ainda, o aumento nos custos de produção (MARTINAZZO et al. 2000; PIMENTEL et al. 2010). Uma alternativa ao controle químico é a utilização de plantas que atuam como inseticidas naturais, podendo ser empregados na forma de pó, extratos e óleos (ISMAN, 2006, AZEVEDO et al. 2007.). Diferentes dos inseticidas sintéticos, os produtos de origem botânica são vantajosos, pois, apresentam um custo reduzido, facilidade de obtenção e utilização, não exigem pessoal qualificado para a sua aplicação e, ainda, apresentam pouco ou nenhum impacto ao ser humano e ao meio ambiente (MAZZONETTO; VENDRAMIM, 2003; ISMAN, 2006). A procura por espécies vegetais com propriedades inseticidas às pragas de grãos armazenados tornou-se uma linha de pesquisa promissora (SILVA et al. 2012). Nesse sentido, muitas espécies de plantas que são utilizadas para o tratamento homeopático de doenças na saúde humana e animal têm contribuído na obtenção de compostos com atividade inseticidas (PASCUAL- VILLALOBOS; BALLESTA-ACOSTA, 2003; RAJENDRAN; SRIRANJINI, 2008). Substâncias com ação fumigante e de contato contra o gorgulho- do-milho, Sitophilus zeamais Motsch., 1855 (Coleoptera: Curculionidae), foram detectadas em plantas da espécie Artemisia vestita Wall (Asteraceae) a qual é amplamente utilizada na medicina tradicional (CHU et al., 2010). Tendo em vista os problemas causados pelo emprego de inseticidas sintéticos, os danos provocados pelo ataque de C. maculatus e a importância do feijão-caupi para alimentação humana, o objetivo neste trabalho foi avaliar o potencial inseticida de nove espécies vegetais na reprodução de C. maculatus. MATERIAL E MÉTODOS Local do Experimento O experimento foi conduzido no Laboratório de Entomologia da Unidade Acadêmica de Ciências Agrárias, da Universidade Federal de Campina Grande (UFCG), Campus de Pombal, Pombal (PB). Obtenção dos grãos de feijão-caupi Os grãos de feijão-caupi utilizados no experimento foram obtidos no comércio local, e para garantir que os resultados do experimento não fossem interferidos por possíveis infestações provenientes do campo, os grãos foram acondicionados em sacos plásticos e mantidos em um freezer sob temperatura de -10ºC, durante sete dias. Em seguida, os grãos foram retirados dos sacos plásticos e acondicionados em recipientes plásticos por um período de dez dias para atingirem o equilíbrio higroscópico (PEREIRA et al., 2008). Criação de Callosobruchus maculatus Para a criação do caruncho foram coletados adultos em grãos de feijão-caupi provenientes de cultivos locais e identificados como C. maculatus, segundo as características descritas por Athié e Paula (2002). Posteriormente foram preparados dez recipientes plásticos, com capacidade para 500 mL, contendo 100 g de feijão-caupi, do tipo sempre verde. Em cada recipiente foram introduzidos dez casais de C. maculatus, com idade desconhecida. Em seguida, os recipientes foram fechados com tampa revestida internamente com tecido organza para facilitar a troca gasosa no interior do recipiente de criação. Após cinco dias da infestação, os carunchos foram retirados com o auxílio de peneiras e descartados do local de criação. Os recipientes contendo os grãos com posturas de C. maculatus foram acondicionados em estantes de aço e cobertos por uma lona preta até a emergência de novos adultos. Esse procedimento foi realizado durante todo o experimento para manutenção dos carunchos em laboratório (temperatura de 25 ± 3 oC e U.R. de 60 ± 10%). Coleta das espécies vegetais As espécies de plantas (Tabela 1) foram coletadas em áreas de Caatinga no município de Pombal, obtendo-se folhas e ramos de plantas adultas. A retirada das folhas e ramos foi realizada aleatoriamente utilizando-se uma tesoura-de-poda. Os materiais coletados foram acondicionados individualmente em sacos plásticos, identificados e levados ao laboratório, onde foi realizada uma 348 Bioatividade de pós de espécies... MELO, B. A. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, supplement 1, p. 346-353, June/14 lavagem simples com água para retirada de impurezas e, em seguida, colocados para secagem com exposição à luz solar durante um período de sete dias. Tabela 1. Espécies arbóreas e arbustivas coletadas em área da Caatinga em Pombal (PB). Nome Comum Nome Científico Família Cumaru Amburana cearensis (Allemão) A.C. Smith Fabaceae Marmeleiro Croton sonderianus Müll. Arg. Euphorbiaceae Mussambê Cleome spinosa Jacq. Capparidaceae Jurema-preta Mimosa tenuiflora (Willd.) Poiret Fabaceae Angico Anadenanthera macrocarpa (Benth.) Brenan Fabaceae Pereiro Aspidosperma pyrifolium Mart. Apocynaceae Mangirioba Senna occidentalis (L.) Fabaceae Alfazema-brava Hyptis suaveolens (L.) Poit. Lamiaceae Juazeiro Ziziphus joazeiro Mart Rhamnaceae Preparação e armazenamento dos pós de espécies vegetais Após secagem dos materiais coletados (folhas e ramos) efetuou-se a moagem individualmente em moinho manual de cereais para obtenção do pó fino. Para cada espécie vegetal foram feitos dois tipos de pós, um proveniente de folhas e outro de ramos. Os materiais obtidos foram armazenados separadamente em recipiente de vidro (1 L), com tampa de rosca e acondicionados em geladeira a uma temperatura de 5oC, garantindo a qualidade do material ao longo do estudo. Efeitos dos pós vegetais sobre a reprodução de C. maculatus Para determinar a bioatividade dos pós de cada espécie vegetal na reprodução do caruncho foram selecionados da criação 95 casais recém- emergidos. Em seguida, cada um desses casais foi confinado em um copo plástico (100 mL), com tampa, contendo 45 g de grãos de feijão-caupi previamente tratados com pó (2 g) de uma das espécies vegetais. Como testemunha utilizaram-se grãos de feijão-caupi infestados, mas sem a adição de pó das espécies vegetais. Os carunchos foram mantidos nos recipientes plásticos até o fim de sua longevidade e, posteriormente, realizada a contagem dos ovos e dos machos e fêmeas emergidos em cada recipiente. A percentagem de adultos emergidos (PAE) e a razão sexual (Rsex) foram determinadas para cada tratamento, através das formulas PAE = 100 (no ovos/no adultos emergidos) e RSex = n o fêmeas/no machos + no fêmeas, respectivamente (SILVEIRA NETO et al., 1976). Delineamento experimental e Análise estatística O experimento foi conduzido em delineamento inteiramente ao acaso com cinco repetições no arranjo fatorial de 9 x 2 + 1, correspondendo às nove espécies de plantas, dois tipos de pós (folhas e ramos) e uma testemunha (sem adição de pó), respectivamente. Os dados foram submetidos à análise de variância pelo teste F ao nível de 5% de significância e em caso de diferenças, as médias foram comparadas pelo teste de Tukey (α = 5%) utilizando o software SAEG 9.0. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os pós vegetais aplicados aos grãos de feijão-caupi não afetaram a sobrevivência e o comportamento de oviposição do caruncho-do- feijão. De acordo com a análise de variância, o número médio de ovos de C. maculatus foi semelhante entre fêmeas provenientes de grãos tratados com pós de folhas e ramos das diferentes espécies de plantas e aqueles oriundos da testemunha (F= 0,02; GL= 1, 76; p≥ 5%). De forma semelhante, não houve efeito dos grãos tratados na análise dos principais fatores: tipos de pós (F= 2,04; GL= 1, 76; p≥ 5%) e espécies de plantas (F= 0,86; GL= 8, 76; p≥ 5%), bem como a sua interação (F= 0,8; GL= 8, 76; p≥ 5%) na oviposição de C. maculatus. Em geral, o número médio de ovos por fêmea de C. maculatus variou entre 68,7 a 85,3 ovos (Tabela 2). Apesar de não ocorrer efeito dos grãos tratados com pó sobre a capacidade de oviposição das fêmeas de C. maculatus, verificou-se que a percentagem de adultos emergidos foi diferente entre os tratamentos. Houve efeito entre o experimento fatorial e a testemunha (F = 8,55; GL = 1, 76; p< 1%) e na interação dos fatores estudados (tipos de pós e diferentes espécies de plantas) (F = 3,33; GL = 8, 76; p< 1%). Esse é um aspecto positivo para o manejo de pragas, pois indica o potencial dessas espécies de plantas para reduzir o número de descendentes de C. maculatus na massa de grãos de feijão-caupi. Observou-se que a 349 Bioatividade de pós de espécies... MELO, B. A. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, supplement 1, p. 346-353, June/14 percentagem de adultos emergidos variou com a espécie vegetal e com o tipo de pó estudado dentro de cada espécie de planta (Tabela 3). Tabela 2. Número médio de ovos de Callosobruchus maculatus ovipositados em grãos de feijão-caupi tratados com pós obtidos de espécies vegetais coletadas na região da Caatinga no município de Pombal (PB). Espécies vegetais Número de Ovos* Cumaru 79,1 ± 5,99 Marmeleiro 68,7 ± 8,67 Mussambê 81,4 ± 9,60 Jurema preta 77,7 ± 5,34 Angico 85,3 ± 5,14 Pereiro 84,4 ± 10,39 Mangirioba 75,6 ± 4,53 Alfazema-brava 69,1 ± 6,31 Juazeiro 70,1 ± 4,21 Testemunha** 75,4 ± 3,74 * Não significativo pelo teste F (= 5%); ** Sem adição de pó (C.V.= 29,1%). Tabela 3. Percentagem de adultos de Callosobruchus maculatus emergidos em grãos de feijão-caupi tratados com pós de folhas ou ramos de diferentes espécies vegetais coletadas na região da Caatinga no município de Pombal (PB). Espécies vegetais Adultos emergidos (%) em grãos de feijão-caupi tratados* Pós de Folhas Pós de Ramos Cumaru 85,6 ± 2,51 ABa 77,3 ± 3,56 ABa Marmeleiro 80,3 ± 4,29 ABa 79,7 ± 2,11 ABa Mussambê 68,1 ± 8,95 Bb 90,4 ± 2,09 Aa Jurema-preta 81,3 ± 4,99 ABa 82,0 ± 5,62 ABa Angico 76,2 ± 1,87 ABa 73,9 ± 3,13 ABa Pereiro 88,1 ± 2,35 Aa 70,9 ± 5,28 ABb Mangirioba 88,5 ± 3,31 Aa 85,6 ± 2,98 ABa Alfazema-brava 80,2 ± 4,24 ABa 81,1 ± 3,90 ABa Juazeiro 83,6 ± 5,09 ABa 69,3 ± 2,30 Bb Testemunha** 86,2 ± 2,89** *Médias seguidas por uma mesma letra maiúscula na coluna ou minúscula na linha não diferem entre si pelo teste de Tukey ( = 5%); ** Média obtida no tratamento sem adição de pó (C.V.= 12,4%). Grãos tratados com pó de folhas da espécie mussambê apresentaram menor percentagem de adultos emergidos (68,1%), enquanto que as espécies pereiro e mangirioba tiveram as maiores percentagem de emergência (88,1 e 88,5%, respectivamente). Entretanto, nos grãos tratados com pós provenientes de ramos, a espécie de juazeiro foi a que apresentou menor percentagem de emergência (69,3%) e a de mussambê a maior percentagem de adultos emergidos (90,4%) (Tabela 3). Além disso, ao se comparar o tipo de pó, dentro de cada espécie, destacaram-se os tratamentos com os pós de ramos de juazeiro e pereiro os quais apresentaram as menores percentagens de adultos emergidos (entre 69 e 71%) em relação àquele tratado com pós de folhas da mesma espécie de planta (88,1%) (Tabela 3). Esses resultados sugerem a presença de alguma substância com propriedade inseticida que interfere no desenvolvimento desse inseto e que a provável ocorrência da mesma varia com a parte da planta e tipo de espécie vegetal avaliado. Assim, na espécie mussambê os pós de folhas foram melhores do que os pós de ramos para reduzir significativamente a emergência de adultos de C. maculatus (entorno de 22%) e no caso das espécies pereiro e juazeiro foram os pós oriundos de ramos e não os de folhas os que reduziram a quantidade de carunchos emergidos (entre 14 e 17% a menos, respectivamente). Embora sejam necessários mais estudos, não se pode descartar a presença de possíveis compostos bioativos presentes nas folhas da espécie mussambê e nos ramos das espécies pereiro e juazeiro os quais reduziram a quantidade 350 Bioatividade de pós de espécies... MELO, B. A. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, supplement 1, p. 346-353, June/14 de adultos emergidos e conseqüentemente a perda de grãos devido ao ataque de C. maculatus. Vários estudos demonstram que os produtos derivados de plantas inseticidas podem atuar na biologia dos insetos como repelentes, inibidores de alimentação, de oviposição, de quitina ou como perturbadores do crescimento, desenvolvimento, reprodução e inclusive causar a morte nas diversas fases do desenvolvimento (ROEL, 2001; AGUIAR- MENEZES, 2005; SILVA et al. 2012). A importância do estudo de plantas como agentes biocidas de insetos de grãos armazenados foi relatada por Tavares e Vendramim (2005). Esses autores observaram que o efeito inseticida da erva- de-santa-maria, Chenopodium ambrosioides L. (Chenopodiaceae) sobre o gorgulho-do-milho, S. zeamais, concentrou-se nos frutos dessa espécie e que o efeito variou com a dosagem de pó aplicada. Raja e William (2008) relataram que óleos voláteis de plantas das famílias Poaceae [Cymbopogon winterianus Jowitt, C. flexuosus (D.C.) Stapf, C. martinii (Roxb.) Wats e Vetiveria zizanioides (L.) Nash] e Myrtaceae [Corymbia citriodora (Hook) (ex Eucalyptus citriodora)] tiveram esse tipo de ação inseticida sobre a eclosão dos ovos de C. maculatus. Resultados semelhantes foram obtidos para o gorgulho-do-arroz Sitophilus oryzae (L., 1763) (Coleoptera: Curculionidae), os quais tiveram redução significativa da prole quando os ovos foram expostos a pós de diferentes partes da planta Cyperus iria L. (Cyperaceae) (CAPPS et al., 2010). Portanto, a redução na quantidade de adultos emergidos nos grãos tratados com pós de mussambê (folhas), pereiro e juazeiro (ramos) poderia estar associada a uma possível ação letal desses pós sobre a fase de ovos e/ou larvas de C. maculatus. Em relação à razão sexual, a análise de variância não detectou efeito significativo entre o experimento fatorial e a testemunha (F = 1,91; GL = 1, 76; p≥ 5%). No entanto, a interação dos principais fatores de estudo (tipos de pós e espécies de plantas) foi significativa (F = 4,87; GL = 8, 76; p< 1%). Ao se comparar as diferentes espécies vegetais, dentro de cada tipo de pó, a razão sexual não diferiu entre si, obtendo um valor médio de 0,43. Porém, ao se comparar a parte da planta utilizada (folhas ou ramos) observou-se que a razão sexual foi diferente em algumas espécies de planta. Pós de folhas de mussambê e pós de ramos de jurema-preta, angico e pereiro reduziram a razão sexual de C. maculatus para um valor de 0,31, ou seja, 40% de fêmeas a menos em relação à testemunha (Tabela 4). Isso é importante uma vez que cada fêmea do caruncho pode ovipositar cerca de 80 ovos ao longo de sua sobrevivência e, portanto, qualquer estratégia que permita interferir na proporção de machos e fêmeas reduziria provavelmente o crescimento populacional de C. maculatus na próxima geração, mas isso merece ser corroborado. Tabela 4. Razão sexual de Callosobruchus maculatus obtida em grãos de feijão-caupi tratados com pós de folhas ou ramos de diferentes espécies vegetais coletadas na região de Caatinga no município de Pombal (PB). Espécies vegetais Razão sexual obtida nos Grãos de feijão-caupi tratados* Pó de Folhas Pó de Ramos Cumaru 0,48 ± 0,04 Aa 0,37 ± 0,08 Aa Marmeleiro 0,53 ± 0,03 Aa 0,53 ± 0,03 Aa Mussambê 0,30 ± 0,11 Ab 0,54 ± 0,02 Aa Jurema-preta 0,51 ± 0,04 Aa 0,30 ± 0,07 Ab Angico 0,49 ± 0,02 Aa 0,33 ± 0,03 Ab Pereiro 0,49 ± 0,02 Aa 0,32 ± 0,09 Ab Mangirioba 0,37 ± 0,05 Aa 0,48 ± 0,03 Aa Alfazema-brava 0,40 ± 0,07 Aa 0,53 ± 0,02 Aa Juazeiro 0,34 ± 0,05 Aa 0,47 ± 0,04 Aa Testemunha** 0,50 ± 0,02** *Médias seguidas por uma mesma letra maiúscula na coluna ou minúscula na linha não diferem entre si pelo teste de Tukey ( = 5%); ** Média obtida no tratamento sem adição de pó (C.V. = 27,7%). De forma geral, conclui-se que os pós de folhas ou ramos das nove espécies avaliadas não afetaram o comportamento e capacidade de oviposição das fêmeas de C. maculatus. Entretanto, os pós de folhas de mussambê e os pós de ramos oriundos de juazeiro, pereiro, jurema-preta e angico apresentaram potencial bioativo na biologia de C. maculatus, reduzindo significativamente a quantidade de adultos emergidos e a proporção de machos e fêmeas de C. maculatus. O uso de produtos de origem vegetal geralmente demanda pouco investimento, é de fácil utilização e com 351 Bioatividade de pós de espécies... MELO, B. A. et al. Biosci. J., Uberlandia, v. 30, supplement 1, p. 346-353, June/14 baixo risco a saúde humana e meio ambiente (CORRÊA; SALGADO, 2011). Neste trabalho, as plantas que mostraram indícios bioativos são encontradas em diversas áreas na região do semiárido e representam uma alternativa promissora para ser implementada no manejo de insetos que ocorrem em ambientes de grãos armazenados, mas novos estudos são ainda necessários. AGRADECIMENTOS Ao Programa de Iniciação Científica do CNPq/UFCG pela bolsa concedida ao primeiro autor. Aos revisores anônimos pelas críticas e sugestões que contribuíram a melhorar a qualidade do manuscrito. ABSTRACT: Botanical insecticides have been employed successfully against some stored product insects. In this study, the insecticidal potential of nine plant species was evaluated on the reproduction of Callosobruchus maculatus (Fabr., 1775) (Coleoptera: Bruchidae). Leaves and stems of “cumaru” (Amburana cearensis), “marmeleiro” (Croton sonderianus), “mussambê” (Cleome spinosa), “jurema-preta” (Mimosa tenuiflora), “angico” (Anadenanthera macrocarpa), “pereiro” (Aspidosperma pyrifolium), “mangirioba” (Senna occidentalis), “alfazema-brava” (Hyptis suaveolens) and “juazeiro” (Ziziphus joazeiro) were dried and ground, separately, into a fine powder which was thoroughly mixed with 45 g of cowpea beans in a plastic cup (100 mL). Each sample was infested with a pair of newly emerged C. maculatus and the numbers of eggs and emerged adults and sex ratio were registered. Infested cowpea grains without any powder were used as a control treatment. The experiment was carried out in completely randomized design with five replicates in a factorial arrangement of 9 x 2 + 1, corresponding to plant species, types of powders and control treatment, respectively. Powders from different plant species have not significant effect on survival of C. maculatus adults when compared with the control. Similarly, the total number of eggs was not different between plant species studied and this number ranged between 68.7 and 85.3 eggs per female. However, powder from “mussambê” leaves or “juazeiro” and “pereiro” stems had the lowest adult emergence between 68.1% and 70.9%. With regard to sex ratio of C. maculatus, powder from “mussambê” leaves and that from “jurema-preta”, “angico” and “pereiro” stems reduced the number of female emerged in approximately 40%. KEYWORDS: Vigna unguiculata. Stored-product pests. Cowpea bruchid. Botanical insecticides. Caatinga plants. REFERÊNCIAS AGUIAR-MENEZES, E. L. Inseticidas botânicos: seus princípios ativos, modo de ação e uso agrícola. Seropédica: Embrapa Agrobiologia, 2005. 58 p. ATHIÉ, I.; PAULA, D. C. Insetos de grãos armazenados: aspectos biológicos e identificação. 2. ed. São Paulo: Varela, 2002. 244p. 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