Microsoft Word - 9-Agra_21996.doc 1823 Original Article Biosci. J., Uberlândia, v. 29, n. 6 , p. 1823-1831, Nov./Dec. 2013 INTERFERÊNCIA DA INCORPORAÇÃO DE MATÉRIA ORGÂNICA NO SOLO NO CONTROLE DA PODRIDÃO NEGRA DA MANDIOCA, CAUSADA POR Scytalidium lignicola INTERFERENCE OF INCORPORATION OF SOIL ORGANIC MATTER IN CONTROL OF CASSAVA BLACK ROOT, CAUSED BY Scytalidium lignicola Cataliny Andreza Duarte SILVA1; Erika Valente de MEDEIROS2; Cidney Barbosa BEZERRA3; Wendson de Moraes SILVA3; Jamilly Alves de BARROS3; Uemeson José dos SANTOS3 1. Agrônoma, mestre em Produção Agrícola pela Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE, Garanhuns, PE, Brasil. cataliny_andreza@hotmail.com; 2. Bióloga, Professora, Doutora, UFRPE, Garanhuns, PE, Brasil; 3. Graduandos em Agronomia pela UFRPE, Garanhuns, PE, Brasil. RESUMO: A mandioca é de grande relevância para países do Sudeste da Ásia, África e América do Sul. Em Pernambuco as podridões vem induzindo a queda na produção e reduzindo as áreas de cultivo ao longo do tempo. O combate a essa doença ainda é um desafio, pois não existe fungicida registrado para o controle ou prevenção da doença e por ser causada por fitopatógenos habitantes do solo. Dentre a gama de fungos causadores de podridões está o Scytalidium lignicola, causador da podridão negra. Este trabalho teve como objetivo verificar o efeito de doses e fontes de matéria orgânica incorporados à solos arenosos com inoculação de Scytalidium lignicola sobre a podridão negra da mandioca cv. Pai Antônio. O experimento foi realizado com os materiais orgânicos, cama de aviário (CA) e esterco caprino (EC), incorporados ao solo arenoso nas concentrações (10, 20 e 30%) (v/v). As variáveis analisadas foram: severidade da doença, respiração basal do solo, carbono da biomassa microbiana das amostras, atributos químicos (pH, P, Na e K) e atributos bioquímicos fosfatase ácida e alcalina e urease. Os tratamentos com maiores poderes supressivos à podridão negra da mandioca foram EC 10 e 20% e CA 20 e 30%. A dose e o material orgânico que apresentou melhor desempenho sobre a supressividade da podridão negra da mandioca foi EC 10 e 20%. PALAVRAS-CHAVES: Manihot esculenta. Cama de aviário. Esterco caprino. Supressividade. INTRODUÇÃO A mandioca (Manihot esculenta Crantz) pertencente à família Euphorbiaceae é de grande relevância para países do Sudeste da Ásia, África e America do Sul (NWEKE et al., 2002). É utilizada para o consumo por mais de 500 milhões de pessoas, principalmente as de baixa renda (EL- SHARKAWY, 2006). Estudos realizados pelo Programa Regional estratégico para as doenças da mandioca no centro, leste e sul da África CaCESA, (2010) estima que 20 a 25% da população africana utiliza a mandioca como principal item da alimentação. Na África o cultivo da mandioca é realizado principalmente em pequenas propriedades sendo utilizada como principal produto cultivado. Na América da Sul, o Brasil representa grande relevância na produção de mandioca por contribuir com cerca de 70 a 75% da produção no continente (GROXKO, 2011). Pesquisa realizada pelo IBGE em março de 2012 registrou produção de mais 26 milhões de toneladas. A região Nordeste foi responsável por mais de 8,3 milhões de toneladas, cerca de 32% da produção nacional. Pernambuco obteve mais de 401,3 mil toneladas representando 1,5% da produção no nordeste (IBGE, 2012). A mandioca é uma planta que apresenta características rústicas. Esta cultura possui resistência às intempéries climáticas, adapta-se bem em solos de baixa fertilidade e com poucos tratos culturais (NWEKE et al., 2002). Por isso sua produção concentra-se na agricultura familiar na qual utiliza manivas com baixa qualidade fisiológica e fitossanitária devido à constante multiplicação, o que pode aumentar a vulnerabilidade a pragas e fitopatógenos, afetando direta e/ou indiretamente o desenvolvimento da cultura. Segundo Cavalcante (2001) várias doenças afetam a produtividade da mandioca no Brasil, sendo com maior frequência as doenças sistêmicas (grupo IV de McNew), pois se propagam também através de material vegetativo (manivas) contaminados. Dentre as doenças a que tem se destacado devido à severidade, na qual é avaliada em relação ao número de lesões, está a podridão radicular, causada por fungos fitopatogênico. Os prejuízos causados por esta doença podem chegar a 100% em ataques mais severos (FUKUDA, 1991). Os gêneros fúngicos mais citado na literatura como Received: 11/03/13 Accepted: 01/08/13 1824 Interferência da incorporação... SILVA, C. A. D. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, n. 6 , p. 1823-1831, Nov./Dec. 2013 causadores de podridão são Fusarium., Phytophthora, (FUKUDA, 1991), Diplodia e Scytalidium. (EMBRAPA, 2013). Este último vem causando muitos prejuízos em Pernambuco, Alagoas, Maranhão e Pará (FUKUDA, 1991 e SERRA et al., 2009). Em Pernambuco as podridões vêm induzindo queda na produção e reduzindo as áreas de cultivo ao longo do tempo. Dentre os fungos causadores de podridões em mandioca, o Scytalidium lignicola Pesante vem sendo relatado como agente causal da podridão negra, sendo registrado pela primeira vez em Pernambuco em 1994 (LARANJEIRA et al.,1994). Em trabalho de prospecção dos agentes causais de podridões radiculares em mandioca, houve prevalência de S. lignicola em todas as propriedades estudadas localizada no munícipio de Caétes, em Pernambuco (NOTARO, 2012). É uma doença de difícil manejo, pois ainda não existem fungicidas registrados pelo Ministério da agricultura, pecuária e abastecimento (MAPA) para esse patossistema. Além disso, o fungo é um fitopatógeno habitante do solo, fato que torna o controle químico ineficiente devido às interações que as moléculas dos fungicidas podem apresentar com componentes do solo, causando sérios danos ambientais, além de alto custo para produtores. Tais dificuldades têm levado os pesquisadores e produtores a procurarem formas alternativas de manejo da doença que preconizem práticas sustentáveis, mais acessíveis aos agricultores e menos agressivas ao meio ambiente. Neste sentido, a supressividade de solos à doenças vem se tornando de interesse para o desenvolvimento de estratégia de manejo sustentável de doenças de plantas (BAKER; COOK, 1974, CHANDRANI; BAKER, 1979). Vários fatores estão envolvidos diretamente e indiretamente na supressividade do solo, como parasitismo, antibiose e competição. Diversos grupos de micro-organismos atuam no processo de supressividade, que pode ocorrer de forma geral ou específica. Em geral os fatores biológicos são os mais envolvidos na supressividade do solo (GHINI et. al., 2002). Em estudos sobre a supressividade de solos do Cerrado cultivados com sorgo, feijão, cana-de- açúcar e vegetação nativa à Rhizoctonia solani, os autores observaram que os solos que apresentaram maior capacidade supressiva à doença foram os solos com as culturas de cana-de-açúcar, pastagem e solos com vegetação natural do Cerrado. Os autores atribuíram esse resultado a grande diversidade microbiológica, e melhores condições de antibiose devido ao seu histórico de uso (CORRÊA et al., 2000), demonstrando diferenças entre a capacidade de diferentes solos em interferir no manejo do fitopatógeno. A matéria orgânica no solo também pode influenciar na supressividade de doenças. Tal matéria pode ser enquadrada em dois grupos, fração húmica e não humificada (CANELLAS et al., 2001). Atuando diretamente nas características biológicas do solo e pode ser utilizada como fonte de energia, nutrientes e de carbono para o metabolismo microbiano (SANTOS; CAMARGO, 1999). Como as informações sobre a podridão negra da mandioca ainda são incipientes e como esta doença vem se tornando de grande importância econômica para os países produtores de mandioca, este trabalho teve como objetivo verificar o efeito de doses e fontes de matéria orgânica incorporadas a solo arenoso sobre a podridão negra da mandioca cv. Pai Antônio. MATERIAL E MÉTODOS Coleta do solo e da matéria orgânica O solo utilizado neste experimento foi coletado em área proveniente de mata nativa do município de São João- PE. Os atributos químicos foram avaliados e apresentaram os seguintes resultados: pH(H2O 1:2,5)= 4,5; P (16,6 mg Kg -1); Mg (0,8 cmolc dm -3); Ca (0,8 cmolc dm -3); Al (0,15 cmolcdm -3); Na (0,28 cmolc Kg -1); K (0,15 cmolc Kg - 1) e H + Al (1,8 cmolc dm -3) através de análise realizada de acordo com (EMBRAPA, 2009). Tal solo apresentou 880 g Kg-1 de areia, 40 g Kg-1 de argila e 80 g Kg-1 de silte, sendo considerado solo arenoso. As fontes de matéria orgânica (M.O.) esterco caprino e cama de aviário foram selecionadas pelo critério de disponibilidade na região. Esses materiais foram coletados na Clínica de bovinos da UFRPE em Garanhuns-PE e em Brejão-PE, respectivamente. Obtenção do inóculo Foi selecionado S. lignicola (CA 008) isolado de material coletado em fazendas produtoras de mandioca no Município de Caetés-PE (8° 46′ 22″ S, 36° 37′ 22″ O), o qual está depositado na coleção de culturas de fungos fitopatogênicos da UAG/UFRPE. O inóculo do fitopatógeno foi preparado através da adição de discos de 8 mm contendo micélio de S. lignicola com 21 dias de crescimento. Tais discos foram adicionados à frascos contendo 250 g de arroz parborizado descascado e 150 mL de 1825 Interferência da incorporação... SILVA, C. A. D. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, n. 6 , p. 1823-1831, Nov./Dec. 2013 água destilada, previamente esterilizados em autoclave (120ºC, 30 min). Posteriormente o inóculo foi seco, triturado e pesado em alíquota de 0,5 g para adição no solo. O número de unidades formadoras de colônias (UFC) foi estimado pelo método de diluição em série proposto por Johson; Curl (1972), sendo quantificadas em 1000 UFC em 0,5 g de inóculo. Condução do Experimento As fontes de matéria orgânica esterco caprino (EC) e cama de aviário (CA) foram curtidos, isto é, foram colocados em pilhas de 5 cm com água que eram removidas a cada três dias, durante um mês. Tais fontes foram testadas nas concentrações (10, 20 e 30 %). O tratamento controle consistiu da utilização de solos sem adição de matéria orgânica (0%). Após 3 dias de incorporação da matéria orgânica foram adicionadas 0,5 g do inoculo do fungo, seguido da homogeneização da mistura. Depois de 14 dias, duas manivas de mandioca cv. Pai Antônio foram plantadas nos vasos. As manivas foram previamente desinfestadas com hipoclorito de sódio a 3% e colocadas para secar em ambiente protegido. Essas mediam 8-10 cm de comprimento e apresentavam 2- 3 gemas. O desbaste foi realizado após 30 dias. Após 90 dias, as plantas foram analisadas por 3 avaliadores. A avaliação foi feita através da constatação de sintomas externos, tais como amarelecimento e murcha e posteriormente seccionamento do caule e das raízes presentes para avaliação de sintomas internos evidenciados pela coloração escura no tecido vascular da planta. A severidade da doença foi mensurada por uma escala e o índice de doença foi calculado de acordo com McKiney (1923), utilizando a atribuição de notas para os sintomas apresentados. 0= plantas sem sintomas; 1= plantas com menos de 10% até 25% com lesões; 2= plantas com 25% até 50%; 3= plantas com 50% até 75%; 4= 75% até 100% (plantas mortas). Foram coletadas duas amostras de 500 g da mistura solo e matéria orgânica contidos em cada vaso, sendo uma amostra imediatamente refrigerada à 4°C para análises enzimáticas (fosfatase ácida e alcalina e urease) e a outra amostra encaminhada para secagem ao ar (TFSA), destorroadas e peneiradas em malha de 2 mm para análises microbianas (respiração basal do solo e carbono da biomassa microbiana) e químicas (pH, P, Na e K). Atributos microbianos Respiração basal da população microbiana no solo foi determinada pela quantificação do dióxido de carbono (CO2) liberado no processo de respiração microbiana (evolução de CO2) pelo método de adsorção alcalina, com a umidade das amostras de solo ajustadas para 60% de sua capacidade de campo (ANDERSON; DOMSCH, 1985). Das amostras de solo foram retiradas alíquotas de 30 g e colocadas em recipientes hermeticamente fechados, individualmente, onde o CO2 produzido foi capturado por solução de NaOH 0,5 mol L-1. Após 72 horas de incubação, o CO2 foi quantificado por titulação com HCl 0,25 mol L-1, utilizando fenoftaleína 10% diluída em 100 mL de álcool etílico (95%, v/v) como indicador. Para determinação do carbono da biomassa microbiana (CBM) as amostras foram submetidas ao processo de irradiação conforme a metodologia descrita por Mendonça; Matos (2005). A extração da biomassa foi realizada de acordo com Vance et al. (1987) e Tate et al. (1988), utilizando-se como extrator K2SO4 0,5 M. Para cada 20 g de solo foi adicionado 80 mL de K2SO4 0,5 M. O carbono nos extratos de K2SO4 foi determinado por colorimetria (BARTLETT et al., 1988). Atributos químicos As amostras foram submetidas à análises de atributos químicos pH em água (1:2,5), P disponível, K, Na, conforme EMBRAPA (2009). O P, Na e K foram extraídos por Mehlich I, sendo o P lido por fotocolorimetria, enquanto que Na e K determinados por fotometria de chama. Atividade da fosfatase ácida e alcalina As Atividades da fosfatase ácida e alcalina foram estimadas conforme adaptação de Tabatabai (1994). Em amostras de 1 g para as concentrações 10 e 20% e 0,3 g para as concentrações 30%. Às amostras de solo foram adicionados 4 mL de tampão MUB (pH 6,5) para realização da atividade fosfatase ácida e 4 mL de tampão MUB (pH 11) para realização da atividade fosfatase alcalina. Após incubação (37 ºC, 1 hora) foram adicionados 1 mL de CaCl2 0,5 M e 8,0 mL de NaOH 0,5 M à suspensão de solo, e filtradas (Whatman n1). Nos controles, a solução de p-NPP 0,025 M foi acrescentada 1 mL de CaCl2 0,5 M e 4 mL de NaOH 0,5 M. A leitura foi realizada a 400 nm de absorbância. A curva padrão foi realizada a partir de uma solução estoque, seguindo o mesmo procedimento adotado em relação às amostras. Os resultados foram expressos em mg de p-nitrofenol por grama de solo seco por hora (mg de p-nitrofenol g-1 solo h-1). O resultado foi calculado através de Kandeler; Gerber (1988). As análises foram realizadas em triplicata, de cada repetição. 1826 Interferência da incorporação... SILVA, C. A. D. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, n. 6 , p. 1823-1831, Nov./Dec. 2013 Urease A atividade da urease foi determinada conforme Kandeler; Gerber (1988). Foram pesadas amostras de 5g de solos,e adicionados 2,5 mL de uréia, incubadas por 2 horas a 37°C. A leitura foi realizada em espectrofotômetro 690 nm. Os resultados foram expressos em (µ g NH4-N g -1 de solo 2 h-1). As análises foram realizadas em triplicata, de cada repetição. Delineamento e análise estatística O delineamento experimental foi inteiramente casualizado, distribuído em esquema fatorial 2 x 3 + 1, sendo o primeiro fator fontes de matéria orgânica (cama de aviário e esterco caprino), o segundo as concentrações (10, 20 e 30%) e um tratamento controle: sem matéria orgânica (0%), com três repetições. Os dados de severidade de doença foram submetidos à análise descritiva de média para obtenção da dose e fonte mais eficiente em suprimir a doença. Visando comparar os atributos dos solos envolvidos na supressividade e/ou conducividade da doença, os dados de severidade foram confrontados com as variáveis microbianas, químicas e bioquímicas, através da correlação linear de Pearson, ao nível de 5% de probabilidade pelo programa ESTATISTICA 7.0 (STATISTICA, 2011), sendo separados os tratamentos mais supressivos dos mais conducivos. RESULTADOS E DISCUSSÃO As plantas de mandioca infestadas com S. lignicola apresentaram valores de severidade variando de 10% a 100% (Figura 1). Pela análise realizada todos os tratamentos contendo as fontes de matéria orgânica EC e CA apresentaram efeito supressivo, diferenciando apenas as dosagens, exceto os que receberam o tratamento de CA a 10%. Figura 1. Severidade de Scytalidium lignicola quanto ao aparecimento de sintomas da podridão negra da mandioca cultivadas em solos com adição de fontes e doses de matéria orgânica. CA(cama de aviário), EC (esterco caprino) Em trabalho realizado por Ghini et al. (2001) com adubos nitrogenados na supressividade de solos a fitopatógenos utilizando sete tipos de adubos, uréia, nitrato de cálcio, nitrato de amônio, nitrato de sódio, sulfato de amônio, fosfato de amônio dibásico e fosfato de amônio monobásico e três isolados Rhizoctonia solani, Sclerotium rolfsii e Sclerotinia clerotiorum, observaram que ocorreu efeito significativo das fontes de N na supressividade do solo aos fitopatógenos avaliados. A adição dos fertilizantes contendo NO-3 e NH + 4 aumentaram o crescimento micelial do R. solani em relação a uréia. E para a S. rolfsii a uréia aumentou a germinação de escleródios em relação aos NO-3 e NH+4. Isso também foi verificado no presente trabalho, pois as duas fontes de material orgânico apresentaram efeito supressivo, em todas as doses exceto cama de aviário a 10%. Em estudo sobre a supressividade de Pythium spp. utilizando solarização e as fontes cama de aviário, lodo de esgoto e casca de Pinus, a fonte de matéria orgânica que mais se destacou na supressividade ao fitopatógeno foi a cama de aviário (GHINI et al., 2002). Esta fonte também foi eficiente no presente trabalho, confirmando a eficiência da cama de aviário sobre a supressividade de algumas doenças radiculares, como a podridão radicular da mandioca, por S. lignicola As misturas de solo e matéria orgânica consideradas conducivas foram CA com 10% e EC 1827 Interferência da incorporação... SILVA, C. A. D. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, n. 6 , p. 1823-1831, Nov./Dec. 2013 com 30%. Nesses tratamentos, o aumento da atividade microbiana pela respiração basal do solo (RBS), aumento dos teores de K, atividade da fosfatase ácida (FOAC), urease (URE) foi acompanhado pela diminuição da severidade da podridão negra da mandioca, causada por S. lignicola com coeficientes de correlação de RBS (r = -0,97), K (r = -0,73), FOAC (r = -1,00) e URE (r = -0,75) (Tabela 1). Tabela 1. Coeficientes de correlação entre a severidade de Scytalidium lignicola e as variáveis microbianas, químicas e bioquímicas das misturas de solo com diferentes fontes e doses de matéria orgânica para avaliação da supressividade do solo à podridão negra da mandioca. Variáveis Severidade Supressivos Conducivos RBS -0,20ns -0,97* CBM 0,78* -0,34ns pH 0,96* -0,24ns P 0,97* -0,30ns Na 0,72* -0,19ns K 0,27ns -0,73* FOAC 0,12ns -1,00* FOAL 0,86* 0,68* URE -0,58* -0,75* RBS= respiração basal do solo (C-CO2mg Kg-1 de solo); CBM= carbono da biomassa microbiana (µg g-1 de solo); P= mg Kg-1;Na e K= cmolc dm -3; FOAC= fosfatase ácida (mg PNP g-1 de solo h-1); FOAL= fosfatase alcalina (mg PNP g-1 de solo h-1); URE= uréase (µ g N- NH3 g -1 de solo seco 2h-1). *=Significativo de acordo com a correlação de Pearson, ao nível de 0,05; ns= não significativo. Tratamentos conducivos (CA 10% e EC 30%) Tratamentos supressivos (EC 10 e 20% e CA 20 e 30%) Andrión (2009) em trabalho realizado com supressividade do feijão caupí a Rhizoctonia, constatou correlação negativa entre os níveis de CO2 evoluído e severidade da doença, corroborando com o presente trabalho nos tratamentos considerados conducivos. O mesmo autor obteve correlação positiva entre a severidade de murcha- de-fusarium do caupi e o CO2 liberado. O autor relaciona a correlação positiva entre severidade e a murcha- de- fusarium do caupi a fatores que não foram detectados pelas análises realizadas. Alguns autores associam solos que apresentaram altos índices de respiração basal ao decréscimo da incidência e severidade de doenças radiculares (JANVIER et al., 2007), assim como foi constatado na podridão negra da mandioca submetida à fontes e doses de matéria orgânica. Em solos supressivos, não houve correlação significativa entre os níveis de K do solo e a severidade, sugerindo que o excesso desse nutriente possa ter desbalanceado outros nutrientes essenciais para a ocorrência da supressividade (ZAMBOLIM et al., 2005). O K é de extrema importância nutricional, pois é responsável pela abertura e fechamento dos estômatos, auxilia na eficiência enzimática, acúmulo e translocação de carboidratos. A deficiência desse nutriente acarreta diminuição na síntese de proteínas, aminoácidos, amidas e nitrato (MALAVOLTA, 2006). A atividade da urease obteve correlação negativa com a severidade em tratamentos considerados conducivos (r = -0,75). Segundo Cenciane et al. (2008) em trabalho sobre atividade enzimática microbiana e efeito térmico em solo tropical tratado com materiais orgânicos, observaram que a atividade da urease iniciou 76 dias da adição dos compostos, os autores sugerem que tenha ocorrido esse comportamento devido a mineralização de azoto existentes no resíduo de esgoto (MASCIANDARO; CECCANTI, 1999), pois os materiais apresentavam quantidades pequenas de ureia. Outro composto, o esterco bovino, apresentou atividade intensa de urease aos 91 dias, por apresentar predomínio de resíduos sólidos e urina. A diminuição da atividade do carbono da biomassa microbiana foi observada pela diminuição da severidade da podridão negra em tratamentos supressivos, com coeficiente de correlação significativa para CBM (r = 0,78), pH (r = 0,96), Na (r = 0,72), P (r = 0,97) e FOAL (r = 0,86), (Tabela1). Os resultados corroboram com Notaro (2012) em trabalho com biomassa, atividade microbiana e atributos de solos arenosos sob diferentes sistemas de uso no semiárido de 1828 Interferência da incorporação... SILVA, C. A. D. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, n. 6 , p. 1823-1831, Nov./Dec. 2013 Pernambuco, a autora obteve correlação positiva para Na e P, para os diferentes usos e tipos de cobertura. Andrión (2009) em trabalho com murcha- de-fusarium e rizoctoniose observou variação entre os solos analisados que foram de altamente conducivos a fortemente supressivos. Nas duas doenças analisadas, o autor relata que esse comportamento ocorre devido a supressividade ser independente para cada doença, uma vez que não foi observado pelo autor correlação significativa entre os níveis de severidade das doenças. Justificando os resultados encontrados sem que a diminuição da atividade dos micro-organismos resultasse no aumento da severidade em solos supressivo. Assunção et al. (2003) em trabalho para caracterização de solos quanto a supressividade da murcha do caupi, avaliaram dez solos no estado de Pernambuco, sendo que os autores observaram que o pH elevado pode ter contribuído para a supressividade de um dos solos analisados. Machado et al. (2003) não encontraram resultados semelhantes em trabalho com murcha de fusario do tomateiro, onde o pH e as características químicas, físicas e microbiológicas não influenciaram na incidência da doença. Discordando com os resultados encontrados no presente estudo, em que se pode observar que o pH contribuiu para diminuição da severidade da podridão negra nos tratamentos supressivos (Tabela 1). O fósforo confere resistência à planta impedindo ou dificultando a penetração do patógeno, acelera a maturação da cultura e aumenta o balanço nutricional na planta (ZAMBOLIM et al., 2005). Andrión (2009) relata que alguns nutrientes existentes no solo são importantes para a supressividade da murcha- de- fusário e rizoctoniose no feijão caupi, como altos teores de fósforo, potássio e sódio e na conducividade altos níveis de saturação de alumínio para a murcha de fusário. O aumento fósforo da mistura de solo e matéria orgânica no presente estudo contribuiu para o aumento da severidade. Para a atividade enzimática fosfatase ácida e alcalina os solos conducivos apresentaram correlação negativa, confirmando os resultados de Notaro (2012) que constatou correlação negativa entre as atividades fosfatase ácida e alcalina. O trabalho foi realizado com vinte solos de diferentes regiões de Pernambuco e diferentes sistemas de cultivo e manejo, com Scytalidium e a cultivar branquinha. A autora também verificou uma relação direta e indireta do pH com a atividade da fosfatase. Batola et al. (2004) relacionam a correlação negativa e aumento da atividade ao manejo do solo, por alterar as características químicas e físicas do solo. Outros autores relacionam a fertilidade do solo com a atividade enzimática e esse aumento da atividade está atrelado ao aumento da biomassa do solo, levando a crer que os micro-organismos existentes no solo mineralizam os nutrientes (KUMARI; SINGARAM, 1995). A atividade fosfatase é inversamente proporcional aos teores de P, quanto maior fósforo presente no solo menor a atividade fosfatase (DICK et al., 1994). Os tratamentos considerados conducivos à podridão negra em mandioca apresentaram média de RBS (0,96), K (0,73), FOAC (123), URE (76,33), (Tabela 2). Os tratamentos considerados supressivos a podridão negra apresentaram médias CBM (452,42), pH (6,82), Na ( 0,48), P (488,13) e FOAL ( 0,86), (Tabela 2). Tabela 2. Média de atributos microbianos, químicos e bioquímicos de solos e matéria orgânica envolvidos na supressividade e/ou conducividade da podridão negra da mandioca, causada por Scytalidium lignicola. Supressivos Conducivos RBS 0,96 1,21 CBM 566,85 452,42 pH 7,4 6,82 P 788,10 488,13 Na 0,62 0,48 K 0,73 0,58 FOAL 43,08 25,11 FOAC 123 56,78 URE 76,33 41,44 RBS= respiração basal do solo (C-CO2mg Kg-1 de solo); CBM= carbono da biomassa microbiana (µg g-1 de solo);P= mg Kg-1; Na e K= cmolc dm -3; FOAC= fosfatase ácida (mg PNP g-1 de solo h-1); FOAL= fosfatase alcalina (mg PNP g-1 de solo h-1); URE= uréase (µ g N- NH3 g -1 de solo seco 2h-1). 1829 Interferência da incorporação... SILVA, C. A. D. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 29, n. 6 , p. 1823-1831, Nov./Dec. 2013 Este é o primeiro registro de formas alternativas de manejo da podridão negra da mandioca, causada por um fitopatógeno que está se tornando de grande importância econômica em áreas produtoras de mandioca no Brasil e no mundo, o S. lignicola. Nesse sentido, recomenda-se a adição de esterco caprino nas doses de 10 e 20% e cama de aviário a 20 e 30% para a supressividade da podridão negra da mandioca cv. Pai Antônio, causada por S. lignicola; CONCLUSÃO Em solos arenosos, adicionado à doses de cama de aviário e esterco caprino, o aumento nos teores de carbono microbiano, P, Na, pH e atividade da fosfatase alcalina diminuem a capacidade supressiva desses à podridão negra da mandioca e podem ser utilizados como ferramenta para tomada de decisão sobre a melhor forma de manejo. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao CNPq e à Fundação de Amparo de Ciência e Tecnologia do Estado de Pernambuco FACEPE pelo apoio financeiro (APQ-1077-5.01/10) e pelas bolsas concedidas. ABSTRACT: Cassava is of great relevance to countries in Southeast Asia, Africa and South America In Pernambuco the rot comesin ducing drop in production and reducing the area under cultivate o nover time. Thefight against this disease remainsa challenge because there is no fungi cideregistered for the control or prevention of disease, is a disease caused by pathogen present in the soil. A mongthe range o ffungi that causerotis Scytalidium lignicola causes black rot. Thisstudy aimed to verify the effectof doses and sources of organic matterin corporated into sandy soil sinoculated with Scytalidium lignicola on the black rotof cassava cv.Father Antonio. The experimentwas conducted withorganic materials, litter (CA) andgoat manure(EC) incorporated into thesandy soilconcentrations(10, 20 and 30%) (v / v). The variables analyzed were: disease severity, soil basal respiration, microbial biomass carbonsamples, the chemical (pH, P, Na andK) and biochemical attribute sand alkaline phosphatase and urease. The suppressive treatments with greater powers to black rotof cassava were EC 10and 20%and CA20 and 30%. The dose and organic material that performed bettering the suppressiveness of cassava black root, caused by Scytalidium lignicola was EC 10 and 20%. KEYWORDS: Manihot esculenta. Poultry litter. Goat manure. Suppressiveness. REFERÊNCIAS ANDERSON, T. H.; DOMSCH, K. H. 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