Microsoft Word - 34-Sau_22772 304 Original Article Biosci. J., Uberlândia, v. 30, n. 1, p. 304-311, Jan./Feb. 2014 SENSIBILIDADE DE ISOLADOS DE CANDIDA SPP. A ANTIFÚNGICOS POR DISCO-DIFUSÃO EM ÁGAR E MICRODILUIÇÃO EM CALDO ANTIFUNGAL SUSCEPTIBILITY OF ISOLATES OF CANDIDA SPP. BY DISK DIFFUSION AND BROTH MICRODILUTION Reginaldo dos Santos PEDROSO1,2; Ralciane de Paula MENEZES2; Joseane Cristina FERREIRA3; Mário Paulo Amante PENATTI1; Walkiria Machado de SÁ4; Lucivânia Duarte Silva MALVINO4; Regina Celia CANDIDO3; Tomaz de Aquino MOREIRA4 1. Escola Técnica de Saúde, Universidade Federal de Uberlândia - UFU, Uberlândia, MG, Brasil. rpedroso@estes.ufu.br; 2. Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde, Faculdade de Medicina – UFU, Uberlândia, MG, Brasil; 3. Faculdade de Ciências Farmacêuticas de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo, Ribeirão Preto, SP, Brasil; 4. Laboratório de Análises Clínicas, Hospital de Clínicas – UFU, Uberlândia, MG, Brasil. RESUMO: Os testes de sensibilidade aos antifúngicos realizados pelo método de disco-difusão em ágar são práticos e bem conhecidos pelos profissionais do laboratório de microbiologia, entretanto apresentam particularidades que os diferem dos testes realizados para bactérias. O objetivo deste trabalho foi comparar as técnicas de disco-difusão em ágar e microdiluição em caldo na determinação da sensibilidade in vitro de isolados de Candida spp. a antifúngicos. Foram analisados 63 isolados clínicos de leveduras, que incluíram as espécies Candida parapsilosis complex (n = 20), Candida albicans (n = 18), Candida tropicalis (n = 14), Candida glabrata (n = 4), Candida krusei (n = 4), Candida kefyr (n = 2) e Candida lusitaniae (n = 1). As técnicas de disco-difusão em ágar e de microdiluição em caldo foram utilizadas para testar a sensibilidade em relação aos antifúngicos fluconazol, itraconazol e anfotericina B. A sensibilidade ao voriconazol foi determinada somente pela técnica de disco-difusão. Os halos ao redor dos discos de fluconazol variaram de 14 mm a 50 mm, e a CIM de 0,125 µ g/mL a 32 µ g/mL; para itraconazol, os halos variaram de 9 mm a 27 mm e a CIM de 0,03 µ g/mL a 0,25 µ g/mL; para anfotericina B, 9 mm a 21mm e 0,5 µ g/mL a 2 µ g/mL, respectivamente; para voriconazol, o diâmetro dos halos variaram de 19 mm a 50 mm. Para as três espécies, C. albicans, C. parapsilosis e C. tropicalis, a técnica de disco-difusão apresentou boa concordância com a microdiluição, especialmente em relação ao fluconazol, representando, assim, um recurso importante para os laboratórios reportarem os resultados dos testes de sensibilidade dos isolados dessas espécies ao fluconazol. PALAVRAS-CHAVE: Testes de sensibilidade aos antimicrobianos por disco-difusão. Antifúngicos. Concentração inibitória mínima. Candida. INTRODUÇÃO As infecções fúngicas têm sido mais frequentes nos últimos anos, ocorrendo com maior gravidade em pacientes portadores de doenças de base que comprometem o sistema imune e que apresentam outros fatores de risco, como dispositivos invasivos e uso de antibacterianos (ZAITZ et al., 2010). Os profissionais do laboratório precisam estar preparados para identificar os agentes dessas infecções, conhecer os procedimentos analíticos, os cuidados necessários, as variáveis interferentes, as limitações dos métodos e a interpretação dos resultados (AZEVEDO et al., 2011; GUILHERMETTI et al., 2004). As leveduras do gênero Candida são as principais identificadas em laboratórios de análises clínicas, principalmente de pacientes hospitalizados. Em decorrência disso, tem surgido cada vez mais a necessidade de avaliação da sensibilidade destes agentes aos antifúngicos. Dessa forma, quando se analisam os testes de sensibilidade disponíveis no mercado, muitos deles são onerosos e inviáveis, especialmente para laboratórios de pequeno porte. Assim, a utilização de técnicas acuradas e reprodutíveis, e de custo compatível com a realidade dos laboratórios hospitalares brasileiros, devem ser cuidadosamente avaliadas antes da implantação (AZEVEDO et al., 2011; COLOMBO; GUIMARÃES, 2003; CROCCO et al., 2004). A candidíase disseminada é uma causa de mortalidade importante em hospitais no Brasil, pois ocorre principalmente em indivíduos acometidos por outras doenças graves, aumentando substancialmente os custos de internação (YAMAMOTO et al., 2012). Nestas condições, é importante identificar as situações ou condutas que ajudam a prevenir a ocorrência da doença, e observar as regras estabelecidas pelo hospital com respeito à Comissão de Controle de Infecção Hospitalar, sobre o uso apropriado de antifúngicos e a correta identificação das espécies de leveduras do gênero Candida. Received: 28/05/13 Accepted: 05/10/13 305 Sensibilidade de isolados... PEDROSO, R. S. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 30, n. 1, p. 304-311, Jan./Feb. 2014 A realização de testes de sensibilidade de leveduras aos antifúngicos não é rotina no laboratório de micologia sendo, no entanto, recomendados em estudos de vigilância epidemiológica e para predizer, ou otimizar, a terapia de pacientes hospitalizados que não respondem ao tratamento, no caso de infecções fúngicas invasivas e infecções recorrentes (TAPIA, 2009). Os testes para determinar a sensibilidade in vitro, como a macro e microdiluição em caldo, ou os testes comerciais, nem sempre estão disponíveis de modo que testes de disco-difusão em ágar são práticos (VASCONCELOS JÚNIOR, 2012), e bem conhecidos dos laboratórios, mesmo que apresentem diferenças técnicas e de interpretação em relação àqueles aplicados para determinar a sensibilidade de bactérias aos antibacterianos. Estas particularidades devem ser conhecidas para apresentarem utilidade clínica. O presente trabalho teve como objetivo comparar as técnicas de disco-difusão em ágar e microdiluição em caldo na determinação da sensibilidade in vitro de isolados de Candida spp. aos antifúngicos fluconazol, itraconazol e anfotericina B. MATERIAL E MÉTODOS Foram analisados 63 isolados clínicos de leveduras, obtidos de sangue, líquido abdominal e ponta de cateter venoso central, que incluíram as espécies Candida parapsilosis complex (n = 20), Candida albicans (n = 18), Candida tropicalis (n = 14), Candida glabrata (n = 4), Candida krusei (n = 4), Candida kefyr (n = 2) e Candida lusitaniae (n = 1). A determinação da sensibilidade aos antifúngicos foi feita pelas técnicas: disco-difusão em ágar e microdiluição em caldo, para os antifúngicos fluconazol, itraconazol e anfotericina B. A sensibilidade ao voriconazol foi determinada somente por disco-difusão em ágar. Os testes foram feitos em duplicata. Os testes de disco-difusão em ágar foram feitos conforme descrito no documento M44-A2 do Clinical and Laboratory Standards Institute (CLSI, 2009): a suspensão de leveduras foi preparada em solução salina fisiológica (NaCl 0,85%) com turbidez equivalente ao tubo 2 da escala de McFarland (106 células/mL), e espalhada com swab esterilizado na superfície do agar Müeller-Hinton (suplementado com 2% de glicose e 0,5 µ g/ml de azul de metileno). Os discos contendo os antifúngicos fluconazol (25 µ g), itraconazol (10 µ g) e anfotericina B (1 µ g) (Cecon, São Paulo, SP, Brazil), e voriconazol (1 µg) (Bio-Rad, Marnes-la- Coquette, França) foram aplicados na superfície do ágar e incubado a 35°C. Após 18 a 24 h, o halo de inibição do crescimento foi medido. Foi realizada nova leitura após 48 h de incubação quando o crescimento foi insuficiente para a leitura até 24 h. Os pontos de corte para interpretação dos resultados estão descritos na Tabela 1. As cepas Candida parapsilosis ATCC 22019 e Candida albicans ATCC 90028 foram os controles utilizados. Tabela 1. Critérios de interpretação dos testes de sensibilidade aos antifúngicos para os isolados de Candida spp., pela técnica de disco-difusão em ágar. Antifúngico Sensível (mm) Sensível dose- dependente (mm) Intermediário (mm) Resistente (mm) Referência Itraconazol ≥ 20 - 12-19 ≤ 11 CECON, 2010 Fluconazol ≥ 19 15-18 - ≤ 14 CLSI, 2009 Voriconazol ≥ 17 14-16 - ≤13 CLSI, 2009 Anfotericina B ≥ 10 - - < 10 CECON, 2010 A determinação da sensibilidade pelo método de microdiluição em caldo foi realizada de acordo com o documento M27-A3 (CLSI, 2008), com algumas modificações: o meio RPMI-1640 contendo glutamina, sem bicarbonato de sódio, tamponado com MOPS, pH 7, foi adicionado de 18 g/L de glicose. A suspensão de leveduras foi ajustada em uma concentração de 1-5 x 106 células/mL através de contagem em câmara de Neubauer. Candida parapsilosis ATCC 22019 e Candida krusei ATCC 6258 foram utilizados como controle. As placas de 96 poços, de fundo chato, com os antifúngicos fluconazol (Pfizer, Sandwich, UK), itraconazol (Janssen, Beerse, Belgium) e anfotericina B (Fungizon, Bristol Myers Squibb, Brasil), foram inoculadas com as suspensões de leveduras e incubadas a 35ºC durante 48 h. A leitura foi visual, e a concentração inibitória mínima (CIM) para fluconazol e itraconazol foi definida como a concentração de antifúngico capaz de inibir pelo 306 Sensibilidade de isolados... PEDROSO, R. S. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 30, n. 1, p. 304-311, Jan./Feb. 2014 menos 50% do crescimento fúngico em comparação ao poço controle; para anfotericina B, a CIM foi aquela em que houve inibição completa do crescimento microbiano. Para interpretação dos resultados de fluconazol e itraconazol foram adotadas as diretrizes recomendadas pelo CLSI (2002), conforme descritos na Tabela 2. Para anfotericina B foram adotados os critérios sugeridos pela Nguyen et al. (1998). Tabela 2. Critérios de interpretação dos testes de sensibilidade aos antifúngicos para os isolados de Candida spp., pelo método de microdiluição em caldo. Antifúngico Sensível (µ g/mL) Sensível dose- dependente (µ g/mL) Resistente (µ g/mL) Referência Itraconazol ≤ 0,125 0,25-0,5 ≥ 1 CLSI, 2002 Fluconazol ≤ 8 16-32 ≥ 64 CLSI, 2002 Anfotericina B ≤ 1 - ≥ 2 NGUYEN et al., 1998 A concordância categórica (CC) entre os dois métodos foi definida como a porcentagem de isolados classificados na mesma categoria, sensível, resistente ou sensível dose-dependente. A discrepância foi estabelecida como erros muito maiores (VME = very major errors) quando um isolado apresentou-se resistente (R) pela técnica da microdiluição e sensível pela disco-difusão em ágar. Erros maiores (ME = major errors) quando um isolado foi classificado como sensível pela microdiluição e resistente pela técnica de disco- difusão. Foram considerados erros menores (MiE = minor errors) aqueles cujos os isolados foram classificados como sensíveis dose-dependentes (ou intermediários) por um dos métodos e sensível ou resistente pelo outro (CLSI, 2008; 2009). RESULTADOS A frequência de isolados resistentes conforme o antifúngico, a faixa do diâmetro dos halos dos discos conforme as espécies, assim como a faixa de CIM podem ser observados na Tabela 3. Os halos dos discos de fluconazol variaram de 14 mm a 50 mm, e a CIM de 0,125 µ g/mL a 32 µ g/mL; para itraconazol, os halos variaram de 9 mm a 27 mm e a CIM de 0,03 µ g/mL a 0,25 µ g/mL; para anfotericina B, 9 mm a 21mm e 0,5 µ g/mL a 2 µ g/mL, respectivamente; para voriconazol, o diâmetro dos halos variaram de 19 mm a 50 mm. O teste de disco-difusão em ágar mostrou que cinco isolados apresentaram resistência a pelo menos um dos antifúngicos testados, sendo quatro de C. krusei (dois a anfotericina B, um a fluconazol e outro a itraconazol) e um de C. kefyr (ao itraconazol). Pela técnica de microdilução em caldo, cinco isolados apresentaram resistência a anfotericina B, sendo dois de C. glabrata, um de C. albicans, um de C. krusei e outro de C. kefyr. Resistência simultânea a dois ou mais antifúngicos foi verificada pela disco-difusão, em dois isolados de C. krusei, sendo que um isolado foi resistente ao fluconazol e itraconazol e outro ao fluconazol, itraconazol e anfotericina B. A concordância categórica entre as duas técnicas está mostrada na Tabela 4. VME foram observados para anfotericina B por sete isolados (um isolado de C. parapsilosis, um C. albicans, dois C. glabrata, dois C. krusei e um C. kefyr). Erros maiores (ME) foram observados para os três antifúngicos: fluconazol (um isolado de C. krusei), itraconazol (um C. krusei e um C. kefyr) e anfotericina B (um C. krusei). MiE foram encontrados para itraconazol (42 isolados: sete C. parapsilosis, 14 C. albicans, 12 C. tropicalis, quatro C. glabrata, três C. krusei, um C. kefyr e um C. lusitaniae) e fluconazol (dois isolados: um C. tropicalis e um C. krusei). 307 Sensibilidade de isolados... PEDROSO, R. S. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 30, n. 1, p. 304-311, Jan./Feb. 2014 Tabela 3. Faixas de halo (mm) para o teste de sensibilidade pelo método de disco-difusão em ágar e concentração inibitória mínima (CIM) pelo método de microdiluição em caldo e frequência de resistência (R) dos isolados de Candida spp. conforme o método utilizado. Espécies (n) Disco-difusão (mm) R1* (n) CIM (µg/mL) R2* (n) C. parapsilosis Fluconazol 27 – 50 0 0,125 – 1 0 (20) Itraconazol 13 – 27 0 0,03 – 0,125 0 Anfotericina B 10 – 21 0 0,5 – 2 0 Voriconazol 28 – 50 0 --- 0 C. albicans Fluconazol 20 – 32 0 0,125 – 0,5 0 (18) Itraconazol 15 – 24 0 0,03 0 Anfotericina B 10 – 19 0 0,5 – 2 1 Voriconazol 20 – 43 0 --- 0 C. tropicalis Fluconazol 17 – 36 0 0,125 – 0,5 0 (14) Itraconazol 12 – 21 0 0,03 – 0,06 0 Anfotericina B 10 – 20 0 0,5 – 1 0 Voriconazol 25 – 40 0 --- 0 C. glabrata Fluconazol 22 – 30 0 0,5 – 4 0 (4) Itraconazol 12 – 18 0 0,03 – 0,25 0 Anfotericina B 13 – 17 0 1 – 2 2 Voriconazol 22 – 28 0 --- 0 C. krusei Fluconazol 14 – 32 1 8 – 32 0 (4) Itraconazol 9 – 19 1 0,03 – 0,125 0 Anfotericina B 9 – 20 1 1 - 2 2 Voriconazol 19 – 36 0 --- 0 C. kefyr Fluconazol 35 – 37 0 0,125 – 0,5 0 (2) Itraconazol 11 – 19 1 0,06 – 0,125 0 Anfotericina B 10 – 12 0 0,5 - 2 1 Voriconazol 31 – 35 0 --- 0 C. lusitaniae Fluconazol 38 0 0,25 0 (1) Itraconazol 19 0 0,03 0 Anfotericina B 15 0 1 0 Voriconazol 39 0 --- 0 R1 e R2: frequência de isolados resistentes in vitro respectivamente pela metodologia de disco-difusão em ágar e microdiluição em caldo. Tabela 4. Concordância categórica (CC) dos métodos disco-difusão em ágar e microdiluição em caldo para testes de sensibilidade a antifúngicos de isolados de Candida spp. Species (n) Antifungals Frequência de isolados VME ME MiE CC (n) C. parapsilosis Fluconazol 0 0 0 100 (20) (20) Itraconazol 0 0 7 65 (13) Anfotericina B 1 0 0 95 (19) C. albicans Fluconazol 0 0 0 100 (18) (18) Itraconazol 0 0 14 22,2 (4) Anfotericina B 1 0 0 94,4 (17) C. tropicalis Fluconazol 0 0 1 92,9 (13) (14) Itraconazol 0 0 12 14,3 (2) Anfotericina B 0 0 0 100 (14) C. glabrata Fluconazol 0 0 0 100 (4) (4) Itraconazol 0 0 4 0 (0) Anfotericina B 2 0 0 50 (2) C. krusei Fluconazol 0 1 1 50 (2) (4) Itraconazol 0 1 3 0 (0) Anfotericina B 2 1 0 25 (1) C. kefyr Fluconazol 0 0 0 100 (2) (2) Itraconazol 0 1 1 0 (0) Anfotericina B 1 0 0 50 (1) C. lusitaniae Fluconazol 0 0 0 100 (1) (1) Itraconazol 0 0 1 0 (0) Anfotericina B 0 0 0 100 (1) VME = very major errors; ME = major errors; MiE = minor errors. 308 Sensibilidade de isolados... PEDROSO, R. S. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 30, n. 1, p. 304-311, Jan./Feb. 2014 DISCUSSÃO O progresso tecnológico, aliado ao conhecimento científico, tem possibilitado maior sensibilidade dos métodos diagnósticos e, de modo semelhante, tem facilitado a identificação de uma diversidade de espécies de leveduras no laboratório de análises clínicas ou micologia clínica, diferentes de C. albicans, que é classicamente o agente mais frequente em infecções de modo geral. Dessa forma, espécies como C. glabrata e C. krusei, que apresentam sensibilidade diminuída e resistência, respectivamente, ao fluconazol, e relatos da ocorrência de isolados de Candida spp. resistentes in vitro aos diferentes antifúngicos, tem aumentado o interesse dos pesquisadores para a vigilância da sensibilidade aos antifúngicos de isolados clínicos, para predizer a resposta clínica à terapia, apesar da resistência ser um fenômeno ainda incomum (COLOMBO et al., 2006; PFALLER; DIEKEMA; SHEENAN, 2006; SWINNE et al., 2004; DEMITTO et al., 2012; VASCONCELOS JÚNIOR et al., 2012). A padronização e validação de uma técnica para testes de sensibilidade in vitro de fungos aos antifúngicos, que seja útil, eficaz e possível de ser executada em laboratórios clínicos, especialmente os de menor porte, são requisitos importantes para a implantação, execução e interpretação dos resultados destes testes. A técnica de disco-difusão em ágar é conhecida há anos, por ser utilizada em testes de sensibilidade in vitro de bactérias aos antibacterianos. O aperfeiçoamento e adaptação da metodologia para leveduras ocorreram no início do século XXI, quando o Clinical Laboratory Standards Institute, através dos documentos de referência M44-P, editado em 2003, M44-A, em 2004 e M44-A2, em 2009, aperfeiçoaram e divulgaram a metodologia de disco-difusão que apresentava boa correlação com o método de referência de microdiluição em caldo, utilizado para comparação. Porém, os referidos documentos trazem valores de referência para interpretação somente para os antifúngicos fluconazol e voriconazol (CLSI, 2009). Vários trabalhos compararam as duas metodologias, e ainda outras comerciais (BARRY et al., 2002; PFALLER et al., 2004; PFALLER et al., 2009; VANDENBOSSCHE et al., 2002), para testar a sensibilidade in vitro aos antifúngicos, especialmente de Candida spp. e Cryptococcus spp. Todavia, estudos em nosso país, regionais ou mesmo locais são importantes, pois geralmente os meios de cultura e os antifúngicos utilizados nos testes, e ainda, os discos de antifúngicos, podem ter diferentes origens, e vários fatores interferem nos resultados de testes de sensibilidade in vitro pela técnica de disco-difusão em ágar. Alguns são bem estabelecidos, como o modo de preparo do meio, a espessura do ágar, a concentração do inóculo, as condições de incubação e leitura dos testes, além de outros, como origem e conservação dos discos, validação de discos preparados in house e controle rigoroso através de cepas-padrão devidamente preservadas. Outro aspecto a ser considerado é que a sensibilidade de certas espécies pode variar conforme diferentes localizações geográficas, o que pode ser importante em estudos epidemiológicos (PFALLER et al., 2008). Estudos de vigilância epidemiológica são importantes para detectar possíveis modificações no padrão de sensibilidade aos antifúngicos. A concordância entre os métodos de difusão em ágar e diluição em caldo está diretamente relacionada à espécie e ao antifúngico. Quando se considera as três espécies C. albicans, C. parapsilosis e C. tropicalis, a concordância, no presente estudo, foi boa para fluconazol e anfotericina B. Os critérios para interpretação dos testes de sensibilidade in vitro ao itraconazol precisam ser revistos, ou ser realizada adequação da técnica de disco-difusão em ágar, com novos critérios para interpretação do halo, considerando que foi o antifúngico que apresentou maior discrepância entre a interpretação dos resultados pelas duas metodologias. Resultados parecidos foram encontrados por Demitto e colaboradores (2012), em relação ao itraconazol, e os autores referem à dificuldade de difusão das moléculas de itraconazol no ágar, como responsável por essa discrepância. Dessa forma, estudos in vitro precisam ser realizados para contornar este problema técnico. Barry et al. (2002) já alertava que novos métodos seriam necessários para melhorar os pontos de definição dos pontos de corte para os testes in vitro com antifúngicos. Estes testes podem ser inovações dos métodos atualmente disponíveis, devidamente comparados com as metodologias de referência, incluindo novas drogas, mas também o itraconazol, por exemplo, na expectativa de melhorar a concordância entre as metodologias. Para o técnica de disco-difusão, o CLSI tem divulgado pontos de corte para discos de fluconazol e voriconazol, que foram os que mostraram maior concordância com a técnica de microdiluição em caldo (CLSI, 2009). O presente estudo apresentou limitação pela não realização de testes de sensibilidade in vitro pela metodologia de microdiluição em caldo para o antifúngico voriconazol, por esta droga não estar disponível no laboratório. Todavia pela disco-difusão todos os isolados foram interpretados como sensíveis em 309 Sensibilidade de isolados... PEDROSO, R. S. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 30, n. 1, p. 304-311, Jan./Feb. 2014 experimentos in vitro a este antifúngico. Estudos futuros pretendem incluir comparação de testes in vitro deste antifúngico, de equinocandinas e discos preparados in house (importante, considerando ainda o alto preço relativo dos discos comercializados no país) em comparação com os comercializados, o que seria uma alternativa para pequenos laboratórios realizarem a triagem inicial de isolados, e posterior envio para laboratórios de referência. Esse procedimento possibilitará ampliar a visualização da situação do cenário nacional com relação às espécies mais frequentes na clínica, especialmente das espécies diferentes de Candida albicans, e do perfil de sensibilidade aos antifúngicos. Os testes de sensibilidade aos antifúngicos têm sido difundidos lentamente no Brasil. Assim, é importante a capacitação e qualificação de recursos humanos para execução de tais testes, pois apesar da praticidade e relativa facilidade na execução, apresentam variáveis que devem ser consideradas na interpretação dos resultados, de forma que possam ser úteis na clínica. Para as três espécies mais frequentes encontradas na clínica, C. albicans, C. parapsilosis e C. tropicalis, a técnica de disco-difusão em ágar apresentou boa concordância com a microdiluição, especialmente em relação ao fluconazol, de forma que representa um recurso importante para os laboratórios reportarem os resultados dos testes de sensibilidade dos isolados dessas espécies ao fluconazol. AGRADECIMENTOS Os autores agradecem ao PROPP-UFU- CNPq pela bolsa de Iniciação Científica concedida a R.P. Menezes, à FAPEMIG (processo nº. APQ- 00464-11) e PROPP-UFU (edital 04/2011) pelo suporte financeiro ao projeto. ABSTRACT: Antimicrobial susceptibility tests performed by disk diffusion method are practical and well known by professionals that work in the microbiology laboratory. The disk diffusion methodology used to verify the susceptibility of fungi to antifungal agents, however, has characteristics that differ from the tests for bacteria. The objective of this study was to evaluate the disk diffusion method to determine the in vitro susceptibility to antifungal agents of Candida species. We analyzed 63 clinical isolates of yeasts, which included Candida parapsilosis complex species (n = 20), Candida albicans (n = 18), Candida tropicalis (n = 14), Candida glabrata (n = 4), Candida krusei (n = 4), Candida kefyr (n = 2) and Candida lusitaniae (n = 1). The susceptibility tests to antifungal drugs was performed by disk diffusion methods and broth microdilution for antifungal fluconazole, itraconazole and amphotericin B. Voriconazole was used to test the susceptibility only by the disk diffusion method. The inhibition halos of growth around disks of fluconazole ranged from 14 mm to 50 mm and the MIC from 0.125 µ g/mL to 32 µ g/mL, for itraconazole, halos ranged from 9 mm to 27 mm and the MIC from 0.03 µ g/mL to 0.25 µ g/mL, for amphotericin B, 9 mm to 21 mm and 0.5 µ g/mL to 2 µ g/mL, respectively. The diameter of voriconazole disks varied from 19 mm to 50 mm. For the three species, C. albicans, C. parapsilosis and C. tropicalis, the disk diffusion method showed good agreement with the microdilution, especially to fluconazole, thus representing an important resource for medical laboratories reporting results of susceptibility testing of isolates of these species to fluconazole. KEYWORDS: Disk diffusion antimicrobial tests. Antifungal agents. Minimum inhibitory concentration. Candida. REFERÊNCIAS AZEVEDO, A. C.; BIZERRA, F. C.; MATTA, D. A.; ALMEIDA, L. P.; ROSAS, R.; COLOMBO, A. L. In vitro susceptibility of a large collection of Candida strains against fluconazole and voriconazole by using the CLSI disk diffusion assay. Mycopathologia, Dordrecht, v. 171, n. 6, p. 411-416, jun. 2011. BARRY, A. L.; PFALLER, M. A.; RENNIE, R. P.; FUCHS, P. C.; BROWN, S. D. Precision and accuracy of fluconazole susceptibility testing by broth microdilution, E-Test and Disk diffusion methods. 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