Microsoft Word - revisado-14-VF.rtf Original Article Biosci. J., Uberlândia, v. 23, Supplement 1, p. 89-93, Nov. 2007 89 QUANTIFICAÇÃO DA PRODUÇÃO DO MEL DE Scaptotrigona aff. depilis (Hymenoptera, Apidae, Apinae) DO MUNICÍPIO DE LUIZ ANTÔNIO, SÃO PAULO, BRASIL QUANTIFICATION OF THE Scaptotrigona aff. depilis (Hymenoptera, Apidae, Apinae) HONEY PRODUCTION FROM LUIZ ANTONIO CITY, SÃO PAULO, BRAZIL. Daniela Yumi YAMAMOTO1; Ivan Paulo AKATSU2; Ademilson Espencer Egea SOARES1 1-Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Universidade de São Paulo - USP. 2. Faculdade de Filosofia Ciências e Letras de Ribeirão Preto- USP RESUMO: O desenvolvimento da meliponicultura no Brasil vem sendo apoiado devido ao sabor diferenciado do mel dessas abelhas, sendo este produto muito utilizado na cura de inúmeras doenças. Além disso, o manejo dessas abelhas sem ferrão tem proporcionado a complementação de renda dos meliponicultores. Em função desse desenvolvimento, o presente trabalho teve como objetivo quantificar a produção de mel de Scaptotrigona aff. depilis. Foram realizados dois tratamentos: a influência do período do ano sobre a produção de mel; e a produção de mel de cada colônia. A análise do primeiro teste sugeriu que não há influência do período do ano sobre a produção de mel. O segundo tratamento sugeriu que as colônias produzem quantidades diferentes de mel, porém, ao analisá-las, duas a duas, verificou-se que um dos pares analisados é responsável pela produção diferencial entre as colônias, e a análise dos outros pares indica que as colônias produzem a mesma quantidade de mel. Há indícios para se afirmar que há variabilidade genética nessa espécie devido à produção diferencial; e que a produção poderia ser maior se houvesse o manejo de tais abelhas. O mel de meliponíneos tem um valor de comercialização considerável e a produção de Scaptotrigona aff. depilis é comparável à produção de outras espécies de abelhas. PALAVRAS-CHAVE: Meliponicultura. Mel. Meliponíneos. Scaptotrigona. Produção. INTRODUÇÃO O mel de Apis mellifera tem representado um item considerável na balança comercial, acarretando a busca de melhorias, por instituições governamentais e não-governamentais, nas condições de produção e comercialização do produto no Brasil. Simultaneamente, observa-se esforços para alavancar o desenvolvimento da meliponicultura: manejo racional de abelhas sem ferrão. A meliponicultura vem recebendo apoio devido ao sabor diferenciado do mel dessas abelhas, caracterizado internacionalmente como “exótico”, além da sua utilização em algumas comunidades para o tratamento de bronquites, resfriadas e de infecções oculares como a catarata e a conjuntivite (VIT; MEDINA; ENRÍQUEZ, 2004). Um outro fator que vem proporcionando o desenvolvimento da meliponicultura é de caráter social. Como incentivo à silvicultura, e o desenvolvimento sustentável, a idéia de manejo de abelhas sem ferrão em caixas racionais está auxiliando a complementação de rendas de inúmeras famílias, principalmente na região norte do país (KERR, et al, 2001). Dessa maneira, o presente trabalho teve como objetivo quantificar a produção de mel de Scaptotrigona depilis, visando apoiar o desenvolvimento da meliponicultura no país. As coletas possibilitam o estudo quantitativo do mel de duas maneiras: influência da estação do ano sobre a quantidade de mel produzido; ou quantidade de mel produzido por colônia. A primeira análise nos possibilita identificar as melhores épocas de colheita de mel; e a segunda fornece informações para investir em melhoramento genético para a meliponicultura. MATERIAL E MÉTODOS As colméias racionais estão instaladas na Estação Experimental de Luiz Antonio (EELA), no município de Luiz Antônio, estado de São Paulo, Brasil a 21º 35’ 16,7”S e 47º 44’ 31,0” W. Received: 14/06/07 Accepted: 10/10/07 Quantificação da produção... YAMAMOTO, D. Y. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 23, Supplement 1, p. 89-93, Nov. 2007 90 Utilizaram-se cinco colônias de Scaptotrigona aff. depilis∗ numeradas de um a cinco, instaladas em caixas racionais que seguem o modelo de Valmir Pedro Züge (MONTEIRO, 1998). Foram realizadas seis coletas, a cada dois meses, entre maio de 2006 e abril de 2007. Para que não ocorresse uma distorção na avaliação do potencial produtivo de tal espécie, foi realizada uma coleta prévia em março de 2006, retirando-se todo o mel. A retirada do mel foi realizada no interior de uma barraca de camping de seis lugares que fornecia abrigo, minimizando o saque de materiais (mel, pólen e resina) por parte de outras abelhas ou mesmo outros animais. A coleta foi realizada por colméia. Os módulos de melgueira de cada colônia foram retirados da caixa racional, e levados para a barraca. A retirada do mel ocorreu furando-se os potes de alimento e entornando-os, de maneira que o mel escorresse num vasilhame limpo. Quando eram observados poucos potes de alimento, retirava-se o mel através de uma seringa. Todas as colônias possuíam três módulos de melgueira, exceto a colônia 4, com quatro módulos, e a colônia 5, com dois. Essa estrutura foi mantida para que não ocorressem alterações bruscas nas colônias. Destarte, todo o material retirado foi armazenado individualmente, sendo transportado para instalações da Universidade, onde foi realizada a filtragem em malha fina e quantificação volumétrica dos méis de cada colônia. Todas as amostras foram armazenadas em recipientes de vidro com boa vedação, e guardados em geladeira para melhor conservação. Utilizou-se o teste de Kruskal-Wallis para verificar se existe diferença na produção entre as colônias, bem como para averiguar diferença entre os períodos de coleta. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os resultados obtidos da quantificação de mel de cada módulo de melgueira das colônias de Scaptotrigona aff. depilis foram compilados na Tabela 1. O teste de Kruskal-Wallis apresentou valor p < 0,05 (valor P= 0,0107), o que indica que a produção por colônia variou significativamente. Utilizou como ∗ Informação pessoal João Maria Franco de Camargo, Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto, novembro de 2006. teste post hoc o teste U de Mann-Whitney. O valor P de significância escolhido foi 0,05. Para o ajustamento dos valores P, utilizou-se o método de Bonferroni e Holm (HOLM, 1979). Desta forma, observa-se que a colônia 2 produz mais que a colônia 3 sob o nível de significância valor P = 0,039, que corresponde ao 10º posto. A produção total do mel de cada colônia, apresentada na Tabela 2, foi averiguada no período de um ano (entre maio de 2006 e abril de 2007). O teste de Kruskal-Wallis apresentou valor p>0,05 (valor p= 0,2211). Isto indica que a produção bimestral não apresentou variação significativa. Logo, pode-se inferir que a produção de mel foi semelhante ao longo do tempo. Os estudos realizados com Apis mellifera indicam que a produção de mel é muito variável, dado que as considerações ecológicas (MANRIQUE e SOARES, 2002), ou seja, variáveis como temperatura, pluviosidade e floração, alteram a produção de mel. Portanto, é plausível que a produção do mel de meliponíneos também pudesse variar ao longo do ano e dos anos segundo estes fatores. Apesar dessas variáveis, observou-se que a produção de mel de Scaptotrigona não variou ao longo do ano nas condições da Estação Experimental de Luiz Antônio, sendo um indicativo que as colônias se mantiveram estáveis, fator interessante ao produtor que consegue obter aproximadamente a mesma quantidade de mel a cada retirada. O meliponário está localizado próximo a uma área nativa em recuperação, onde existe uma riqueza vegetal que provavelmente possibilite diferentes períodos de floração. Infere-se tal fato pois a EELA proporciona néctar às abelhas durante o ano inteiro, tendo em vista que o mel e a resina (para outro trabalho) eram retirados das colméias, e mesmo assim ainda houve uma produção bimestral de mel. E também, observou-se através do ano, a alteração da cor, o que pode indicar origens florais distintas. Infere-se, também, que poderia ocorrer uma maior produção se fosse retirado apenas o mel das abelhas de Scaptotrigona. Os apicultores manejam a extração dos produtos de Apis mellifera, retirando um único produto de cada vez (pólen, geléia real, mel ou própolis) (BREYER, 1996; ALVES, 1996). Esse fato indica a rusticidade por parte de Scaptotrigona aff depilis. Quantificação da produção... YAMAMOTO, D. Y. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 23, Supplement 1, p. 89-93, Nov. 2007 91 Tabela 1. Volume médio de mel (mL) coletado nas melgueiras das cinco colônias de Scaptotrigona aff. depilis, no período de 31/03/2006 a 04/04/2007. Tabela2. Produção de mel (mL) nas colônias de Scaptotrigona aff. depilis durante um ano. 2/6/2006 3/8/2006 4/10/2006 6/12/2006 5/2/2007 4/4/2007 Colônia 1 0 128,5 55 265 0 93 Colônia 2 345 375 445 700 345 255 Colônia 3 44 250 195 235 95 130 Colônia 4 0 150 175 405 315 355 Colônia 5 35 0 0 305 0 14 TOTAL 424 903,5 870 1910 755 847 O teste de Kruskal-Wallis apresentou valor p>0,05 (valor p= 0,2211). Isto indica que a produção bimestral não apresentou variação significativa. Logo, pode-se inferir que a produção de mel foi semelhante ao longo do tempo. Os estudos realizados com Apis mellifera indicam que a produção de mel é muito variável, dado que as considerações ecológicas (MANRIQUE; SOARES, 2002), ou seja, variáveis como temperatura, pluviosidade e floração, alteram a produção de mel. Portanto, é plausível que a produção do mel de meliponíneos também pudesse variar ao longo do ano e dos anos segundo estes fatores. Apesar dessas variáveis, observou-se que a produção de mel de Scaptotrigona não variou ao longo do ano nas condições da Estação Experimental de Luiz Antônio, sendo um indicativo que as colônias se mantiveram estáveis, fator interessante ao produtor que consegue obter aproximadamente a mesma quantidade de mel a cada retirada. O meliponário está localizado próximo a uma área nativa em recuperação, onde existe uma riqueza vegetal que provavelmente possibilite diferentes períodos de floração. Infere-se tal fato pois a EELA proporciona néctar às abelhas durante o ano inteiro, tendo em vista que o mel e a resina (para outro trabalho) eram retirados das colméias, e mesmo assim ainda houve uma produção bimestral de mel. E também, observou-se através do ano, a alteração da cor, o que pode indicar origens florais distintas. Infere-se, também, que poderia ocorrer uma maior produção se fosse retirado apenas o mel das abelhas de Scaptotrigona. Os apicultores manejam a extração dos produtos de Apis mellifera, retirando um único produto de cada vez (pólen, geléia real, mel ou própolis) (BREYER, 1996; ALVES, 1996). Esse fato indica a rusticidade por parte de Scaptotrigona aff depilis. Verificou-se que a produtividade de Melipona scutellaris alcança oito litros de mel por colônia por ano (SILVA; LAGES, 2001). Porém, segundo o trabalho de SILVA; LAGES (2001), realizado na Área de Proteção Ambiental da Ilha de Santa Rita em Alagoas, 60% dos produtores retiraram abaixo de 2 L de mel por caixa/ano, 13% de 2 a 3 L, apenas 5% de 3 a 4 L, 5% acima de 4 L e 17% não haviam realizado a retirada do mel. A produção média de mel da abelha Melipona subnitida por colônia/ano é de 2 litros, segundo um estudo realizado no município de Jandaíra, estado do Rio Grande do Norte (CÁMARA et al., 2004). Scaptotrigona aff. depilis chegou a produzir pouco mais de 3 litros em um ano. Através das análises estatísticas, há indicativos que elas produzam Colônia 1 Colônia 2 Colônia 3 Colônia 4 Colônia 5 2/6/2006 0 115 15 0 17,5 3/8/2006 43 125 83 37,5 0 4/10/2006 18 148 65 44 0 6/12/2006 88 233 78 101 152,5 5/2/2007 0 110 31,7 105 0 4/4/2007 31 85 43,3 88,8 7 TOTAL 280 1046 481 448,8 269,5 Quantificação da produção... YAMAMOTO, D. Y. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 23, Supplement 1, p. 89-93, Nov. 2007 92 quantidades diferentes de mel. Ao produtor seria interessante o selecionamento genético das colônias mais produtoras, aumentando assim o lucro final com o meliponário. Porém é necessário um estudo mais aprofundado da variabilidade genética, tendo em vista a interpretação da história natural do grupo. Deve-se levar em consideração que o presente trabalho não fez nenhuma alteração na estrutura nas colméias, ou seja, não acrescentou nenhum módulo de melgueira em possíveis épocas de aumento de biomassa da população das colônias referidas. Portanto, é possível retirar uma maior quantidade de mel anualmente. A abelha Apis mellifera produz aproximadamente 25 kg de mel ao ano (ALMEIDA, MANRIQUE; SOARES, 2002). Apesar de essas abelhas produzirem uma quantidade de mel numericamente maior que o mel dos meliponíneos, observa-se que o preço de mercado de tal mel é muito inferior que de abelhas sem ferrão. Um quilograma de mel de Apis mellifera é vendido de R$10,00 a R$15,00 reais, enquanto que um litro de mel de meliponíneos pode variar de R$ 20,00 a R$100,00 reais no mercado (ALVES et al., 2005). Segundo ALVES et al. (2005), o custo de implantação de um meliponário é quase o dobro do custo de um apiário. Porém o valor agregado de tal mel no mercado, é muito maior devido ao seu sabor exótico e baixa oferta no mercado. ABSTRACT: The development of stingless bee keeping in Brazil has been supported due to the differentiated flavor of this bee honey, which is used to heal several illnesses. Moreover, the handling of these stingless bees has provided the complementation of families income. In function of this development, the present work had the aim of quantifying the Scaptotrigona aff. depilis honey production. Two treatments were carried out: the period of the year influence on the honey production and the production of each colony honey. The analysis of the first test suggested that the period of the year doesn’t influence the honey production. The second treatment suggested that the colonies produce different amounts of honey, however analyzing them two by two, it was verified that only one analyzed pair is responsible for the differential production between the colonies, and the analysis of the others pairs indicates that the colonies produce the same amount of honey. There are evidences to affirm that there is genetic variability in this species due to differential production; and that the production might be bigger if it the handling of such bees was practiced. The honey of stingless bees has a considerable value in commercialization and the production of Scaptotrigona aff. depilis is comparable to the production of other species of bees. KEYWORDS: Meliponiculture. Honey. Stingless bee. Scaptotrigona. Production. REFERÊNCIAS ALMEIDA, R.; MANRIQUE, A. J.; SOARES, A. E. Egea. 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