Microsoft Word - 4-523OK.doc Original Article Biosci. J., Uberlândia, v. 23, n. 2, p. 25-33, Apr./June 2007 25 COMPOSIÇÃO BROMATOLÓGICA E DIGESTIBILIDADE “IN VITRO” DA MATÉRIA SECA DO CAPIM TANZÂNIA IRRIGADO BROMATOLOGICAL COMPOSITION AND “IN VITRO” DRY MATTER DIGESTIBILITY OF IRRIGATED TANZANIA GRASS Fernando França da CUNHA1, Antônio Alves SOARES2, Odilon Gomes PEREIRA3, Everardo Chartuni MANTOVANI2 Gilberto Chohaku SEDIYAMA2, Franklin Vitor de Souza ABREU4 1. Doutorando, Departamento de Engenharia Agrícola - DEA, Universidade Federal de Viçosa-UFV cunhaff@yahoo.com.br ; 2. Professor Titular, DEA/UFV; 3. Professor Adjunto, Departamento de Zootecnia – DZO/UFV; 4. Graduando em Zootecnia, DZO/UFV RESUMO: Objetivou-se estudar o efeito de diferentes turnos de rega e níveis de irrigação sobre a composição bromatológica e a digestibilidade “in vitro” da matéria seca (DIVMS) de Panicum maximum Jacq. cv. Tanzânia-1. Uma bancada experimental foi montada sob ambiente protegido, onde foram colocados recipientes cultivados com a gramínea. As irrigações foram realizadas com turnos de rega de um, quatro e sete dias e lâminas d’água para restabelecer 50, 75 e 100% da disponibilidade total de água no solo. Foram avaliados os teores de proteína bruta (PB), fibra em detergente neutro (FDN), fibra em detergente ácido (FDA) e DIVMS após o último corte. Foi verificado que o teor de PB foi maior quanto menor foi a quantidade de água aplicada. Os valores de DIVMS foram inversamente proporcionais aos teores de FDA. Conclui-se que o turno de rega pouco influencia nos fatores estudados e que a irrigação elevando o teor de água do solo próximo a capacidade de campo, diminui e aumenta os teores de PB e FDA, respectivamente. PALAVRAS-CHAVE: Pastagem. Nutrição animal. Forragicultura. Forragens tropicais. Turno de rega. INTRODUÇÃO As pastagens, em função de seu baixo custo de produção em relação aos concentrados, representam a forma mais prática e econômica de se fornecer alimentos para os bovinos, constituindo a base de sustentação da pecuária brasileira. O desempenho dos animais está diretamente ligado ao consumo e à qualidade da matéria seca (MS) oriunda das pastagens, determinando a quantidade de nutrientes ingeridos, os quais são necessários para atender as exigências de manutenção e produção dos animais (GOMIDE, 1993). Durante os períodos de veranicos e, principalmente, durante o inverno seco, ocorre queda no valor nutritivo dos pastos, pois perdem o vigor produtivo em detrimento ao reprodutivo. O suprimento de água por meio da irrigação pode alterar a composição bromatológica e o valor nutritivo dessas plantas, e conseqüentemente, no ganho de peso animal. O uso da irrigação de pastagens vem crescendo, principalmente na região Centro-Oeste. Já existem aproximadamente 80 pivôs centrais irrigando áreas de 100 ha cada, em média, na região central do Brasil (VILELA, 1999). Segundo o mesmo autor, 25% das vendas de equipamentos tipo pivô central são destinadas à pecuária. O valor nutritivo da forragem, ao longo do ano, em áreas irrigadas é diferente, quando comparado com a de pastagens não irrigadas. Segundo Gerdes et al. (2000), o conceito do termo “valor nutritivo” refere-se à composição química da forragem e sua digestibilidade. A proteína bruta (PB) das plantas forrageiras inclui tanto a proteína verdadeira quanto o nitrogênio não protéico. A proteína verdadeira, dependendo da maturidade da planta, pode representar até 70% da PB nas forragens verdes, ou seja, quando a forragem ainda é nova (HEATH et al., 1985). A irrigação das pastagens propicia aumento do teor de PB, Vanzela et al. (2006) trabalhando com capim mombaça na região Oeste do Estado de São Paulo, observaram que os teores de PB variaram de 9,7 a 13,8% no cultivo em sequeiro e de 10,1 a 14,9% no cultivo irrigado. A digestibilidade é a medida da proporção do alimento consumido que é digerida e metabolizada pelo animal. Em princípio, a digestibilidade potencial de todos os componentes da planta, exceto a lignina, é de 100%, contudo, a digestão completa nunca acontece devido às incrustações de hemicelulose e celulose pela lignina, que tem efeito protetor contra a ação dos microrganismos do rúmen (WHITEMAN, 1980). Segundo Van Soest (1994), a fibra em detergente neutro (FDN) é o componente da forragem mais consistentemente associado ao consumo. Os componentes indigestíveis de um alimento são recuperados na FDN, enquanto o detergente ácido divide a FDN nas frações solúvel Received: 16/03/06 Accepted: 07/1106 Composição bromatologica… CUNHA, F. F. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 23, n. 2, p. 25-33, Apr./June 2007 26 e insolúvel em ácido sulfúrico a 1 N. A fração solúvel em ácido compreende a hemicelulose e as proteínas da parede celular, enquanto o resíduo, ou fibra em detergente ácido (FDA), recupera a lignina, a celulose e as frações não carboidratos menos digestíveis. A digestibilidade “in vitro” da matéria seca (DIVMS) apresenta correlação com o consumo voluntário. Baixa digestibilidade implica em maior tempo de retenção da forragem no rúmen, promovendo limitações de consumo de ordem física. Cerca de 40 a 60% das variações de consumo entre as forrageiras podem ser atribuídas às diferenças na digestibilidade (REIS; RODRIGUES, 1993). A DIVMS das pastagens é afetada pela irrigação, GERDES et al. (2005) cultivando capim aruana exclusivo e sobre- semeado com mistura de aveia preta e azevém esperavam maiores valores de DIVMS no tratamento sobre-semeado, porém esses autores não encontraram diferença significativa, justificando esse efeito pela irrigação submetida ao capim aruana exclusivo. No presente trabalho objetivou-se avaliar os efeitos de diferentes turnos de rega e níveis de irrigação sobre a composição bromatológica e a digestibilidade “in vitro” da matéria seca de Panicum maximum Jacq. cv. Tanzânia-1. MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi realizado no período de janeiro a julho de 2004 na Área Experimental de Irrigação e Drenagem do Departamento de Engenharia Agrícola (DEA) da Universidade Federal de Viçosa (UFV), em Viçosa-MG, localizada a 20° 45’ S e 42° 45’ W. O clima é classificado, pelo método de Köppen, como Cwa, ou seja, temperado quente, com inverno seco e verão chuvoso. Nesta área, uma bancada experimental foi instalada sob condições de ambiente protegido para que a água provinda das precipitações pluviométricas não influenciasse os resultados do trabalho. Nessa estrutura foram colocados recipientes de metal com 0,6 m de diâmetro e 1,0 m de altura com as plantas a serem avaliadas e lisímetros para a estimativa da perda de água. O solo utilizado no experimento foi retirado dos primeiros 50 cm de profundidade de um Latossolo Vermelho-Amarelo distrófico oriundo do campus da UFV. A densidade e a curva de retenção de água no solo, obtida pelo método do extrator de Richards, foram determinadas no Laboratório de Água e Solo do DEA-UFV. Os resultados de capacidade de campo, ponto de murchamento e densidade foram de 38%, 23% e 1,05 g cm-3, respectivamente. A análise química do solo foi realizada no Laboratório de Química de Solo, do Departamento de Solos da UFV, e os resultados foram: pH em H2O = 5,0; Al 3+ = 0,0 cmolc.dm -3; H + Al3+ = 1,65 cmolc.dm -3; Ca2+ + Mg2+ = 0,6 cmolc.dm -3; Ca2+ = 0,5 cmolc.dm -3; K+ = 18,0 mg.dm-3; P = 0,5 mg.dm- 3; SB = 0,65 cmolc.dm -3; CTC (t) = 0,65 cmolc.dm - 3; CTC (T) = 2,3 cmolc.dm -3; V = 28%; e MO = 0,91 dag.kg-1. A partir dos resultados da análise química do solo foram feitas correções da acidez e fertilidade, segundo recomendações da CFSEMG (1999). A adubação foi constituída de uma dose de 75 mg dm-3 (150 kg ha-1) de P2O5, na forma de superfosfato simples, antes da semeadura, e de doses de 50 mg dm-3 (100 kg ha-1) e 40 mg dm-3 (80 kg ha-1) de N e K2O, respectivamente, no estabelecimento do experimento e no corte 1 e de 100 mg dm-3/corte (200 kg ha-1/corte) e 80 mg dm- 3/corte (160 kg ha-1/corte) nos cortes 2 e 3. As fontes de N e K2O foram o sulfato de amônio e o cloreto de potássio, respectivamente. Em trabalhos utilizando vasos, os pesquisadores utilizam doses altas de fertilizantes, pois a quantidade de solo explorado pelas raízes é limitante e a planta sofre estresse facilmente na falta de fertilidade do solo. Os turnos de rega propostos para o trabalho eram de um, quatro e sete dias e os níveis de irrigação, que definiram o teor de água máximo no solo, foram de 50, 75 e 100% da disponibilidade total de água no solo. Foi fixado um nível de água no solo a ser atingido após cada irrigação, definido conforme a equação 1. Equação 1: PM TPMCC U SAI +�� � �� � −= 100 )( sendo, USAI = Umidade do solo após a irrigação (% em peso); CC = Capacidade de campo do solo (% em peso); PM = Ponto de murchamento (% em peso); T = Tratamento, fator nível de irrigação (%). Para a determinação da evapotranspiração da cultura (ETc), utilizaram-se quatro lisímetros de drenagem. As irrigações nesses lisímetros foram realizadas à noite e a cada 24 horas, ocasião em que se media a percolação, determinando-se a ETc, conforme a equação 2. A lâmina aplicada correspondia à evapotranspiração mais 10% para garantir que o solo se mantivesse próximo à capacidade de campo. Equação 2: iii LPLAETc −= −− 11 sendo, ETci-1 = Evapotranspiração da cultura no dia i-1 (mm); LAi-1 = Lâmina de água aplicada no dia i-1 Composição bromatologica… CUNHA, F. F. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 23, n. 2, p. 25-33, Apr./June 2007 27 (mm); LPi = Lâmina de água percolada medida no dia i (mm). A ETc correspondeu ao tratamento de turno de rega de um dia e nível de irrigação de 100%. Para os outros tratamentos, a lâmina de irrigação aplicada foi determinada conforme a equação 3: Equação 3: �� −− == i TRi i TRi i KsETcETajcLA sendo, Etajc = Evapotranspiração ajustada da cultura (mm); Ks = Coeficiente de umidade do solo (adimensional). O valor de Ks foi calculado por meio da equação 4, proposta por Bernardo et al. (2005): Equação 4: )1( )1( + + = CTALn LAALn Ks sendo, CTA = Capacidade total de água do solo (mm); LAA = Lâmina atual de água no solo (mm). A LAA e a CTA foram obtidas pelas equações 5 e 6, respectivamente, sugeridas por BERNARDO et al. (2005): Equação 5: ZDa PMUa LAA 10 )( − = Equação 6: ZDa PMCC CTA 10 )( − = sendo, Ua = Umidade atual do solo (% em peso); Da = Densidade aparente do solo (g cm-3); Z = Profundidade efetiva do sistema radicular (cm). Para o tratamento de turno de rega de um dia e nível de irrigação de 100%, a CTA é igual a LAA, resultando em um valor de Ks igual à unidade, por isso, que a evapotranspiração neste tratamento é igual a dos lisímetros. Para os demais tratamentos, os valores de Ks e LAA eram atualizados diariamente conforme a estimativa da ETajc. O volume de água aplicado em cada tratamento era calculado multiplicando-se a lâmina de água evapotranspirada pela área de seção transversal dos recipientes. O fornecimento de água às plantas era realizado manualmente, utilizando-se um regador. A semeadura do capim tanzânia foi realizada em 26/01/2004, utilizando-se sementes com valor cultural de 28%. Após as plântulas atingirem uma altura de 5 cm, efetuou-se um desbaste, deixando-se um estande de 20 plantas por unidade amostral, o que representava 70 plantas m- 2. Aos 46 dias após a semeadura procedeu-se o corte de uniformização. Após este, foram realizados três cortes às idades de 31, 37 e 61 dias. As plantas eram cortadas ao atingirem cerca de 1,0 m de altura, utilizando-se uma tesoura de poda, à altura de 9,0 cm do solo. A avaliação da composição bromatológica e a digestibilidade “in vitro” da matéria seca (DIVMS) foram realizadas apenas após o último corte, no dia 19 de julho de 2004, quando que o material de cada recipiente foi colocado em saco de papel, identificado e levado à estufa com circulação forçada de ar a 65°C, durante 72 h. A forragem, depois de pré-seca, foi pesada em balança digital (precisão: 0,01 g), assim como o saco de papel, que depois, por diferença, proporcionou o peso pré-seco da forragem. As amostras pré-secas foram moídas em moinho do tipo Willey, em peneira de malha de um milímetro e acondicionadas em recipientes devidamente identificados. Os teores de proteína bruta (PB), fibra em detergente neutro (FDN) e fibra em detergente ácido (FDA) foram determinados segundo métodos descritos por Silva; Queiroz (2002) e a DIVMS, segundo técnica descrita por Tilley; Terry (1963), adotando-se apenas o primeiro estágio. Essas determinações foram realizadas no Laboratório de Nutrição Animal do Departamento de Zootecnia da Universidade Federal de Viçosa. Depois de obtidos os valores bromatológicos e a DIVMS das amostras pré-secas, foi realizado sua correção em base na MS definitiva. A secagem definitiva foi obtida tomando-se sub-amostras em torno de duas gramas do material pré-seco e transferindo-as para estufa a 105°C, por 24 h (SILVA; QUEIROZ, 2002). O teor de MS foi determinado pela equação 7: Equação 7: 100 65 ASEPMS CMS − = � sendo, MS = Matéria seca (g); PMS65°C = Peso do material pré-seco em estufa ventilada a 65°C, 72 h; ASE = Percentual de matéria seca obtida pela secagem da MS65°C em estufa a 105°C, 24 h (%). O experimento foi analisado no esquema fatorial 3 x 3 (três níveis de irrigação e três turnos de rega) no delineamento inteiramente casualizado, com quatro repetições. Na comparação das médias adotou-se o teste de Tukey em nível de 5% de probabilidade. A não opção por regressão, já que se trata de fatores quantitativos, foi motivada pelo baixo número de pontos (apenas três) da variável independente. As análises estatísticas foram realizadas, empregando-se o software SAEG 8.0 desenvolvido pela UFV. RESULTADOS E DISCUSSÃO Composição bromatologica… CUNHA, F. F. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 23, n. 2, p. 25-33, Apr./June 2007 28 Radiação, temperatura e consumo de água Nas Figuras 1a e 1b são apresentados os valores diários de radiação solar e temperatura, respectivamente, no período de crescimento em que foram realizados as análises do capim tanzânia. Ambos elementos climáticos apresentaram grandes oscilações durante esse período. Os valores de radiação solar durante o último corte variaram de 42 a 209 W m-2, registrando-se um valor médio de 118 W m-2. Os valores de temperatura durante o experimento variaram de 14,3 a 21,2°C, registrando-se um valor médio de 17,7°C. 0 70 140 210 20/5 1/6 13/6 25/6 7/7 19/7 Dias (b) R . m éd ia (W m -2 ) 13 16 19 22 20/5 1/6 13/6 25/6 7/7 19/7 Dias (a) T . m éd ia (º C ) Figura 1. Valores de radiação solar (a) e temperatura (b) dentro do ambiente protegido cultivado com capim tanzânia. Na Tabela 1 é apresentado o consumo de água pelo capim tanzânia no corte em que foram realizadas as avaliações para os diferentes tratamentos. Dentro de cada turno de rega, observou-se que a lâmina de água aplicada foi maior conforme aumentava o nível de irrigação, resultados esses, esperados, pois quando se mantêm o solo com maior teor de água, maior é o coeficiente de umidade do solo (Ks) e, conseqüentemente, maior é a evapotranspiração da cultura. Tabela 1. Consumo de água (em mm) aplicada no último corte do capim tanzânia para os distintos turnos de rega e níveis de irrigação Tratamento 1:50 1:75 1:100 4:50 4:75 4:100 7:50 7:75 7:100 Consumo de água 137 161 209 92 146 159 81 113 190 1, 4 e 7 representam os turno de rega, em dias; e 50, 75 e 100, os níveis de irrigação, em porcentagem. Ao analisar o consumo de água no mesmo nível de irrigação nos diferentes turnos de rega, observa-se que ela diminui à medida que aumenta o turno de rega. Nos tratamentos constituídos de turno de rega de um dia, o teor de água no solo, antes da irrigação, sempre esteve próximo à capacidade de campo, proporcionando valores de Ks próximos da unidade. Já no turno de rega de sete dias, o teor de água no solo, antes da irrigação, estava bem abaixo da capacidade de campo, gerando valores menores de Ks. Diante disso, os tratamentos com turno de rega menor consumiram mais água em relação aos tratamentos de turno de rega maior, para o mesmo nível de irrigação. Composição bromatológica e DIVMS O teor de proteína bruta (PB) teve efeito significativo (p<0,05) na interação turno de rega e nível de irrigação (Tabela 2). Tabela 2. Teores de PB (%) em função dos diferentes turnos de rega e níveis de irrigação, para o corte 3 do capim tanzânia Nível de irrigação (%) Turno de rega (dias) 50 75 100 1 30,9 Aa 27,5 ABb 23,0 Bc 4 29,9 Aa 29,0 Aa 25,0 Ab 7 29,6 Aa 25,1 Bb 24,7 ABb Para o turno de rega, médias seguidas por mesma letra maiúscula e, para o nível de irrigação, médias seguidas por mesma letra minúscula, não diferem entre si pelo teste de Tukey (p>0,05). Composição bromatologica… CUNHA, F. F. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 23, n. 2, p. 25-33, Apr./June 2007 29 Observa-se que no nível de irrigação de 50% o teor de PB não variou significativamente (p>0,05) nos três turnos de rega avaliados. Contudo, ocorreram diferenças significativas (p<0,05) nos teores protéicos no capim tanzânia nos níveis de irrigação de 75 e 100%. Ao analisar o nível de irrigação dentro do turno de rega, constata- se que, independentemente do turno de rega, os valores protéicos no nível de irrigação de 50% foram maiores significativamente (p<0,05) em relação ao nível de 100%. O teor de PB foi maior quanto menor foi a quantidade de água aplicada. Isto deve-se, provavelmente, a um menor crescimento da gramínea, resultando em menor alongamento do colmo e portanto em maior valor protéico. Zimmer (1999), trabalhando com duas alturas de pós-pastejo e duas doses de N em Panicum maximum Jacq. cv. Aruana, na estação seca do ano, obteve teor médio de PB de 18,7%. Jank (1995) encontrou valor médio de 12,7% para a PB de folhas do capim tanzânia. Outros autores como Barbosa; Euclides (1997) e Machado et al. (1998) determinaram teores de PB de capim tanzânia e obtiveram teores médios de 12,3 e 11,8%, respectivamente; Andrade (1993) obteve valores entre 11,6 e 10,5%. Observa-se que os valores encontrados na literatura são inferiores ao menor valor encontrado nesse trabalho. É possível que os 9,0 cm de colmo que não foram incluídos nas análises tenham sido os responsáveis por esses elevados valores de PB, pois sabe-se que as folhas contribuem de forma mais significativa para o aumento do teor de PB. Acredita-se que se fossem feitas análises de PB juntamente com esses colmos haveria um efeito de diluição, diminuindo, dessa forma, tais valores. É oportuno ressaltar, também, que as análises de PB foram repetidas por três vezes no laboratório, comparando-se os valores obtidos com amostras de forragem padrão, em razão dos elevados valores encontrados. Outra possível justificativa desses altos valores de PB foram os elevados níveis de adubação nitrogenada, 100 mg dm-3/corte que equivalem a 200 kg ha-1/corte de N. Soria (2002) constatou que o uso de N na pastagem de capim tanzânia proporcionou um aumento nos seus teores de PB. Os tratamentos que receberam níveis de adubação de 31 e 230 kg ha-1/corte de N apresentaram teores de PB de 10 e 17%, respectivamente. Outros autores também observaram aumento nos teores de PB com o uso de adubação nitrogenada foram Favoretto et al. (1988), Corrêa et al. (1998) e Forni et al. (2000), trabalhando com gramíneas forrageiras da espécie Panicum maximum Jacq. (Colonião, Tanzânia, Vencedor, Mombaça e Centenário). Para os teores de fibra em detergente ácido (FDA) observou-se efeito significativo (p<0,01) da interação turno de rega e nível de irrigação. Observa-se na Tabela 3 que, independentemente do turno de rega, os teores de FDA nos níveis de irrigação de 50% foram significativamente menores (p<0,05). Verifica-se também, que apenas no turno de rega de um dia foi verificado maior (p<0,05) teor de FDA no nível de irrigação de 100%. Avaliando-se o turno de rega dentro de cada nível de irrigação, observa-se que nos níveis de irrigação de 50 e 75% não foram constatadas diferenças estatística (p>0,05) entre os teores de FDA pelo efeito dos turnos de rega. Entretanto, para o nível de irrigação de 100%, maiores (p<0,05) teores de FDA foram observados para o turno de rega de um dia. Tabela 3. Teores de FDA (%) em função dos diferentes turnos de rega e níveis de irrigação, para o corte 3 do capim tanzânia Nível de irrigação (%) Turno de rega (dias) 50 75 100 1 29,5 Ac 32,3 Ab 36,6 Aa 4 29,1 Ab 33,6 Aa 32,8 Ba 7 30,9 Ab 34,3 Aa 32,7 Bab Para o turno de rega, médias seguidas por mesma letra maiúscula e, para o nível de irrigação, médias seguidas por mesma letra minúscula, não diferem entre si pelo teste de Tukey (p>0,05). Os teores de FDA encontrados foram semelhantes aos relatados por outros autores. Barros et al. (2002) e Barbosa; Euclides (1997) encontraram teores médios de FDA de 35,0 e 38,2% para o capim tanzânia, respectivamente. Teixeira (1997) obteve teor médio de FDA de 45,8% para o capim tobiatã. Para os teores de fibra em detergente neutro (FDN) não foi observado efeito significativo (p>0,05) dos turnos de rega e níveis de irrigação. O teor médio de FDN foi de 61,9%, valor bem Composição bromatologica… CUNHA, F. F. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 23, n. 2, p. 25-33, Apr./June 2007 30 inferior aos encontrados por Barros et al. (2002); Machado et al. (1998) e Barbosa ; Euclides (1997), em pastagens não irrigadas, que foram de 71,0; 71,1 e 72,9%, respectivamente. Euclides (1995), estudando diversas cultivares de Panicum maximum, concluiu que valores de FDN inferiores a 55% são raros. Valores superiores a 65% são comuns em tecidos novos e teores entre 75 e 80% são encontrados em materiais de maturidade avançada. A FDN apresenta uma relação inversa com o consumo voluntário do pasto, ou seja, menores valores de FDN implicam em maior consumo da forrageira. A exemplo da FDN, a digestibilidade “in vitro” da matéria seca (DIVMS) não foi influenciada significativamente (p>0,05) por nenhum dos fatores estudados, nem tão pouco pela interação (p>0,05) destes, registrando-se um valor médio de 72,4%. Barros et al. (2002) e Machado et al. (1998) encontraram valores de 65,3 e 65,2%, respectivamente. Gontijo Neto (2003) e Tossi (1999), trabalhando com capim tanzânia, obtiveram valores de DIVMS variando entre 45,8 e 54,7%, e de 71,41%, respectivamente. Apesar do turno de rega e do nível de irrigação não influenciarem significativamente (p>0,05) os valores de DIVMS, observou-se uma tendência de redução destes conforme se aumentou os níveis de irrigação, comportamento esse diferente do observado para os teores de FDA (Figura 2). Van Soest (1994) e Soria (2002) também encontraram resultados semelhantes, em que o tratamento que proporcionou maior valor de digestibilidade, obteve menor teor de FDA. O primeiro autor afirma que essa associação negativa depende de diversos fatores, entre os quais destacam-se a espécie, o clima, o solo e o manejo adotado. Os maiores valores de digestibilidade estão associados a MS de melhor qualidade, com maior produção de massa foliar, perfilhos novos, hastes mais tenras que proporcionam menores teores de lignina, traduzindo em maior consumo voluntário de MS. Soria (2002), utilizando maiores doses de adubo nitrogenado, observou maiores valores de digestibilidade, concluindo que a sua aplicação confere benefícios não apenas na quantidade produzida, mas também na qualidade, pois a digestibilidade é um dos melhores indicadores da qualidade relativa da forragem. 26 30 34 38 4//50 1//50 7//50 1//75 7//100 4//100 4//75 7//75 1//100 F D A ( % ) 66 70 74 78 D IV M S ( % ) FDA DIVMS Figura 2. Relação entre os teores de fibra em detergente ácido (FDA) e os valores de digestibilidade "in vitro" da matéria seca (DIVMS) do capim tanzânia no corte 3. Está fortemente comprovado que o valor alimentar da forragem decresce com o avanço da idade das forrageiras. Andrade (1987) comprovou isso, para três cultivares de Panicum maximum, observando que com o avanço da idade da forragem sua qualidade diminuiu. Segundo Santos (2002), a digestibilidade diminui com a idade da forrageira. Em seu experimento, ele observou uma acentuada redução da digestibilidade ao longo dos cortes (diminuição de 3 a 6 pontos percentuais de digestibilidade por corte). Composição bromatologica… CUNHA, F. F. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 23, n. 2, p. 25-33, Apr./June 2007 31 CONCLUSÕES Diante dos resultados obtidos pode-se concluir que o turno de rega pouco influencia nos fatores estudados e que a irrigação quando manejada de forma convencional, elevando o teor de água do solo próximo a capacidade de campo, diminui os teores de PB, aumenta os FDA e não interfere nos teores de FDN e na DIVMS do capim tanzânia. Apesar de a DIVMS ser indiferente ao nível de irrigação, seus valores se comportam inversamente proporcionais aos da FDA. ABSTRACT: The aim of this work was to study the effect of different frequency and levels of irrigation on chemical composition and “in vitro” dry matter digestibility (IVDMD) of tanzânia grass (Panicum maximum Jacq. cv Tanzania-1). The experiment was carried out under greenhouse conditions where drums were filled with soil and cultivated with tanzania grass. The irrigations were performed with a frequency of one, four and seven days, in order to reestablish soil water content to 50, 75 and 100% of the total available water in the soil. During the experiment were evaluated the crude protein (CD), neutral detergent fiber (NDF), acid detergent fiber (ADF) and IVDMD after the last cut. The CD increased as the irrigation depth decreased. The values of IVDMD of were inversely proportional to that of the ADF. The results show that irrigation frequency does not influency in the monitored variables and the irrigation could be to elevate the water soil near to the capacity field, causing decrease and increase the CD and ADF rates, respectively. KEYWORDS: Pasture. Animal nutrition. Forage crops. Tropical forage. Irrigation frequency. REFERÊNCIAS ANDRADE, I. F. 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