ISOLAMENTO DE UMA FRAO ENRIQUECIDA EM SINAPTOSOMAS DE CREBRO DA ABELHA APIS MELLIFERA UTILIZANDO GRADIENTE DESCONTNUO DE PERCOLL E IDENTIFICAO DE MIOSINAS V E VI Original Article 122 PLASTICIDADE PARA O TAMANHO E A FECUNDIDADE DO PULGÃO Brevicoryne Brassicae (L.) (HEMIPTERA: APHIDIDAE) NA UTILIZAÇÃO DE DISTINTOS HOSPEDEIROS PLASTICITY ON SIZE AND FECUNDITY OF THE APHID Brevicoryne brassicae (L.) (HEMIPTERA: APHIDIDAE) UTILIZING DISTINCT HOSTS Cristiane Dias PEREIRA1; Cecília Lomônaco de PAULA2 1. Aluna do Programa de Pós-Graduação em Genética e Bioquímica – UFU, Uberlândia, MG, Brasil. 2. Professora, Doutora, Instituto de Biologia, Universidade Federal de Uberlândia - UFU, Uberlândia, MG, Brasil. lomonaco@ufu.br ; RESUMO: Este trabalho descreve a plasticidade na expressão fenotípica do tamanho e fecundidade de Brevicoryne brassicae (L.) utilizando rabanete (Raphanus sativus) e acelga (Brassica campestris var. pekinensis) como hospedeiros. Onze clones foram coletados em diferentes localidades e mantidos nos hospedeiros, sob as mesmas condições de temperatura e luminosidade. Após 30 dias, o comprimento de quatro caracteres morfológicos (rostro, sifúnculo, III segmento antenal e tíbia anterior) foi obtido em dez indivíduos de cada clone e em cada hospedeiro (n=220), sendo em seguida simplificadas pela análise de componente principal para obtenção de um índice multivariado de tamanho. O número de ninfas presentes no aparelho reprodutivo foi registrado para estimativa de fecundidade. A ocorrência de plasticidade no tamanho e na fecundidade foi avaliada segundo o modelo de genética quantitativa (ANOVA para dois fatores). Os clones apresentaram plasticidade para o tamanho, fecundidade e variações genéticas nas respostas plásticas. A correlação fenotípica entre o tamanho e a fecundidade foi positiva e significativa apenas no hospedeiro rabanete. Divergências nas correlações fenotípicas na utilização dos hospedeiros podem ser indicativas de que há distintos mecanismos genéticos operando em cada ambiente. O rostro é um caráter canalizado, uma vez que apresentou o menor coeficiente de variação de todas as estruturas morfológicas analisadas. PALAVRAS-CHAVE: Insecta. Correlações fenotípicas. Genética quantitativa. Plasticidade morfológica. INTRODUÇÃO A plasticidade fenotípica é a habilidade do indivíduo alterar seu fenótipo em resposta às condições ambientais, sem alterar o seu genótipo (BRADSHAW, 1965; SCHLICHTING, 1986; VIA et al., 1995). Variações de natureza plástica podem ocorrer tanto em caracteres fisiológicos quanto morfológicos e, de modo geral, plasticidade morfológica é muitas vezes acompanhada por plasticidade em outros caracteres da história de vida, tais como: sobrevivência, reprodução e fecundidade (KINDLMANN; DIXON, 1992; SCHEINER, 1993). Nas interações entre insetos e plantas, a plasticidade fenotípica pode ter papel relevante porque possibilita o uso de distintos hospedeiros em espécies polífagas. Além da expansão do número de hospedeiros utilizados, a plasticidade fenotípica pode também ser verificada em populações de insetos fitófagos sob condições peculiares que incluem mudança ambiental drástica ou invasão de um novo predador (VIA; SHAW, 1996). Como os pulgões são vetores de diversas viroses em plantas, seus processos de escolha e reprodução nos distintos hospedeiros tem impactos econômicos diretos na agricultura (POWELL et al., 2006). Por isso, o conhecimento da capacidade plástica dos insetos pode ser útil em programas de manejo e controle de pragas, visto que permite o controle da expansão do uso de novos hospedeiros e a proliferação de doenças. A plasticidade de um caráter pode estar sob controle genético e pode, portanto, ser influenciada pela seleção natural (BRADSHAW, 1965). Representa, deste modo, um componente adaptativo fundamental, capaz de gerar mudanças evolutivas (THOMPSON, 1991). Assim, a plasticidade, que atua inicialmente como mecanismo adaptativo gerador de variabilidade para a manutenção da polifagia, pode ter seus custos aumentados, se a seleção natural operar intensificando a especificidade entre insetos e sua planta hospedeira. Como conseqüência, poderá haver, por seleção disruptiva, o aumento no grau de adaptabilidade e especialidade a um hospedeiro determinado, acompanhado pela perda na eficiência de utilização de um hospedeiro alternativo, resultando na formação de ecótipos ou raças (SCHEINER; CALLAHAN, 1999). Além disto, se as pressões de seleção forem mantidas e as divergências acentuadas, novas espécies poderiam ser formadas, mesmo simpatricamente (VIA, 1999). Biosci. J., Uberlândia, v. 25, n. 2, p. 122-130, Mar./Apr. 2009 Received: 25/09/07 Accepted: 19/06/08 mailto:lomonaco@ufu.br Plasticidade para o tamanho... PEREIRA, C. D.; PAULA, C. L. 123 Afídeos são pequenos insetos (1 a 10 mm) da Ordem Hemiptera, com cerca de 4.000 espécies descritas, cuja maior parte vive em climas temperados (DIXON, 1985). Entretanto, também nas regiões tropicais afídeos danificam lavouras e são capazes de veicular viroses às plantas hospedeiras (DIXON, 1985). Apresentam ciclo de vida partenogenético em climas tropicais, o que não é muito usual entre os insetos. Em climas temperados, o ciclo de vida dos afídeos apresenta alternância de gerações (sexuada e assexuada) (BLACKMAN; EASTOP, 1984). Tendem a se associar com espécies particulares de hospedeiros e são ocasionalmente encontradas em outras plantas, que normalmente não colonizam (DIXON, 1985). A introdução de plantas cultivadas também pode fornecer livres e novos nichos ecológicos, que atuam como reservas de hospedeiros para estes insetos (BLACKMAN; EASTOP, 1984; SIMON et al., 2003; GORUR, 2005). A coevolução morfológica entre fitófagos e hospedeiros é muito comum entre os afídeos (VIA; SHAW, 1996; WOOL; HALES, 1997; GORUR et al., 2007) contribuindo para o seu processo de especialização e especiação. Este trabalho verificou a ocorrência de plasticidade fenotípica no tamanho e na fecundidade do pulgão Brevicoryne brassicae (L.), em decorrência do uso dos hospedeiros: rabanete (Raphanus sativus L.) e acelga (Brassica campestris var. pekinsens (Lour.) Viehoever). Verificou também se as correlações fenotípicas entre tamanho e fecundidade são alteradas em virtude da seleção para diferentes regimes alimentares indicando potencialidades para especialização. A hipótese testada é a de que o uso dos hospedeiros distintos irá afetar a expressão fenotípica do tamanho corporal e fecundidade dos clones. MATERIAL E MÉTODOS O organismo estudado O pulgão B. brassicae é a principal praga da couve e demais brassicáceas. Sob condições tropicais, ocorre o ano todo, apresentando reprodução partenogenética (DIXON, 1985). Quando a colônia é ainda inicial, localizam-se nos brotos e folhas novas. À medida que a população aumenta, os afídeos vão se distribuindo por todo o hospedeiro, parasitando inclusive folhas velhas. Toda a planta sofre graves danos, tais como deformações e amarelecimento das folhas, paralisia parcial ou total no crescimento e, às vezes, a morte (MARICONI et al., 1963; LARA et al., 1978). Coleta e manutenção dos clones em laboratório Onze clones de B. brassicae foram coletados em couve em onze bairros da cidade de Uberlândia, MG. (clone LUI- bairro Luizote de Freitas I; clone TUB- bairro Chácaras Tubalina; clone PLA- bairro Planalto; clone ROO- bairro Roosevelt; clone MAT- bairro Martins; clone UMU- bairro Jardim Umuarama; clone BRA- Bairro Brasil; clone TRY- bairro Tibery; clone PAM- bairro Pampulha; clone STM- bairro Santa Mônica; JKB- Bairro Jardim Karaíba) para aumentar a probabilidade de que os clones fossem geneticamente diferentes. Todos os clones foram coletados em couve (Brassica oleraceae var acephala) em hortas domésticas ou comerciais. O estabelecimento de cada clone em laboratório em culturas estoque foi feito a partir de cinco ninfas geradas pelo mesmo indivíduo, mantidas em folha de acelga. Desenho experimental Foram utilizados dois hospedeiros: acelga e rabanete. Os indivíduos provenientes das culturas estoque foram simultaneamente replicados, formando colônias nos hospedeiros testados, de modo que cada clone foi replicado nos dois ambientes. As variáveis (tamanho e fecundidade) foram obtidas 30 dias após a replicação, tempo que, segundo Pereira e Lomônaco (2001), permitiria a ocorrência de pelo menos três gerações nos hospedeiros testados. O desenvolvimento dos clones nos hospedeiros rabanete (variedade Crimson gigante) e acelga foi obtido em (∅ 13,5 cm, altura 25,0 cm; ∅ 11,5 cm e altura 9,8 cm, respectivamente), que possuíam aberturas laterais e tampas perfuradas cobertas com organza, para permitir a ventilação. Todos os clones foram mantidos sob as mesmas condições de temperatura (tmín=25,5 ± 1,6°C e tmáx=27,2 ± 1,6°C), em iluminação artificial (luz fria incandescente), com fotoperíodo de 24 h. Semanalmente, as folhas de acelga e rabanete eram substituídas por folhas jovens depositadas sobre as antigas, permitindo que pulgões pudessem se transportar ativamente de uma folha para outra. As folhas de acelga eram fornecidas por encomenda, por um pequeno horticultor (Sítio Estrela D'alva) e as folhas de rabanete eram cultivados no jardim experimental do Instituto de Biologia da Universidade Federal de Uberlândia. Medidas morfológicas de 220 indivíduos adultos (10 fêmeas de cada clone em cada hospedeiro) foram coletados aleatoriamente, fixados Biosci. J., Uberlândia, v. 25, n. 2, p. 122-130, Mar./Apr. 2009 Plasticidade para o tamanho... PEREIRA, C. D.; PAULA, C. L. 124 em álcool 70% e montados à fresco entre lâminas e lamínulas. Quatro caracteres morfológicos (comprimento do último segmento rostral, comprimento do sifúnculo direito, comprimento do segmento antenal III e comprimento da tíbia anterior direita) foram medidos em cada indivíduo, utilizando régua micrométrica do microscópio Axiosplan, no aumento de 10 vezes. Estes caracteres foram escolhidos por apresentarem poucas deformações, após montagem dos insetos entre lâminas e lamínulas. O número de ninfas presentes no aparelho reprodutivo também foi registrado por meio de inspeção visual, para estimativa de fecundidade. Métodos de análise. Foi gerada uma matriz de correlação entre as medidas morfológicas, posteriormente ajustadas pelo índice de comparação múltipla de Bonferroni (WILKINSON, 1999). Os dados foram submetidos à análise de componente principal (ACP) para redução da multidimensionalidade dos dados, e obtenção do índice multivariado de tamanho para cada indivíduo (MANLY, 1994). Foram também calculados os coeficientes de variação de cada caráter métrico. A ocorrência de plasticidade no tamanho e na fecundidade de B. brassicae no uso dos hospedeiros distintos foi avaliada segundo o modelo quantitativo de Via e Lande (1985). Este modelo considera que a variação fenotípica total equivale à soma de seus componentes sendo, Vf= Vg + Va + Vga, onde Vf é a variação fenotípica total da população amostrada, Vg é a variação atribuída às diferenças genéticas entre os clones, Va é a variação atribuída aos fatores ambientais que diferiram entre os hospedeiros testados e Vga é a variação atribuída à interação entre os componentes genéticos (clones) e ambiental (hospedeiros) (FALCONER, 1989). Deste modo, foi considerado neste trabalho o tipo de hospedeiro como fonte de variação ambiental e os diferentes clones como fonte de variação genética. A ANOVA para dois fatores (clones e hospedeiros) foi efetuada, tomando-se como variáveis o índice multivariado de tamanho e a fecundidade para estimar: o componente genético de variabilidade entre clones (fator clone); o componente ambiental da variação, ou seja, a resposta plástica no uso de hospedeiros distintos (fator hospedeiro) e a variabilidade genética para o potencial plástico entre clones (fator clone x hospedeiro). A verificação da normalidade das distribuições do índice de tamanho e da fecundidade foi feita pelo teste de Kolmogorov Smirnov (SOKAL; ROHLF, 1995; WILKINSON, 1999). As distribuições também foram analisadas quanto à homoscedasticidade (ZAR, 1984). Uma vez que a análise de variância informa apenas a quantidade de variação ocorrida entre os clones, normas de reação, que denotam a direção de variação, foram também confeccionadas para os caracteres analisados. Normas de reação representam graficamente a média dos valores fenotípicos (valores genotípicos) em cada hospedeiro testado (STEARNS, 1989). Utilizando valores fenotípicos individuais (10 indivíduos para cada clone) foram calculadas as correlações fenotípicas entre tamanho e fecundidade em cada hospedeiro. A correlação fenotípica denota a associação entre duas características que podem ser observadas diretamente, em um número de indivíduos da população (FALCONER, 1989). Correlações fenotípicas foram calculadas obtendo-se o coeficiente de correlação de Pearson (ZAR, 1984). As análises estatísticas foram realizadas com auxílio do programa SYSTAT para Windows versão 9.0 (WILKINSON, 1999). RESULTADOS Plasticidade no tamanho e na fecundidade. Como os caracteres estavam significativamente correlacionados, a ACP foi considerada adequada para a redução da multidimensionalidade dos dados e obtenção de índices de tamanho. Isto porque na ACP, quando as variáveis métricas originais estão altamente correlacionadas, o primeiro componente representa o tamanho e os componentes seguintes são os indicadores de diferenças na forma dos organismos estudados (REIS, 1988). A percentagem total de variação explicada pelo primeiro componente principal (variação atribuída ao tamanho) foi de 69,2%. Todos os pesos das variáveis neste componente apresentaram valores positivos e altos (próximos de uma unidade), embora com magnitudes diferentes. O coeficiente da variável rostro no segundo componente principal apresentou sinal negativo. Assim, o segundo componente principal pode ser entendido como variação na forma e explica 19,4% do total percentual de variância contida nos dados analisados (Tabela 1). O coeficiente de variação do rostro foi menor que os das demais variáveis morfológicas (Tabela 2). Além disto, o comprimento do rostro (1,14 ± 0,01; n=110 na acelga e 1,13 ± 0,01; n=110 no rabanete) não diferiu entre os indivíduos que utilizaram os distintos hospedeiros (F=1,997; P=0,159). Biosci. J., Uberlândia, v. 25, n. 2, p. 122-130, Mar./Apr. 2009 Plasticidade para o tamanho... PEREIRA, C. D.; PAULA, C. L. 125 Tabela 1. Peso das variáveis nos primeiros três componentes extraídos da matriz de correlação entre as medidas morfométricas de B. brassicae. A percentagem de variação explica o quanto cada componente contribui para a variabilidade total dos dados. Variáveis Componentes 1 (Tamanho) 2 (Forma) 3 (Forma) Sifúnculo Antena Tíbia Rostro 0,864 0,913 0,932 0,565 0,109 0,255 0,148 -0,824 -0,492 0,211 0,224 0,041 Percentagem de variação 69,180 19,440 8,457 Tabela 2. Coeficiente de variação dos caracteres morfológicos estimados para os clones de B. brassicae que utilizaram acelga e rabanete como hospedeiros. Característica Acelga RABANETE Sifúnculo 0,087 0,084 Antena 0,121 0,141 Tíbia Rostro 0,106 0,048 0,108 0,043 As distribuições dos índices de tamanho foram normais (Dmax= 0,071; P=0,214), o que não ocorreu para as distribuições de fecundidade (Dmax=0,955; P<0,001). Entretanto, segundo Zar (1984), a ANOVA é robusta, ou seja, apenas levemente afetada mesmo em relação a severos desvios de normalidade, especialmente se os tamanhos das amostras forem grandes. Como todas as amostras foram homoscedásticas (F=1,016; P>0,05 para o tamanho e F=1,048; P>0,05 para a fecundidade) e de tamanho considerável (n=110 para cada hospedeiro), optou-se pela utilização de análise paramétrica, considerando desprezíveis os efeitos gerados pela não normalidade dos dados relativos à fecundidade. A ANOVA indicou que há diferenças estatísticas significativas no tamanho entre os clones (F=28,079; P<0,001), o que indica a ocorrência de variações genéticas entre eles. Há, também, significativa plasticidade fenotípica de tamanho (F=24,354; P<0,0001), ou seja, respostas plásticas aos hospedeiros (ambientes) foram detectadas. A interação genético-ambiental nas respostas plásticas foi significativa (F=7,800; P<0,001) indicando que os clones responderam fenotipicamente de modo distinto às influências ambientais (Tabela 3). Tabela 3. Análise de Variância (ANOVA) para dois fatores do índice multivariado de tamanho (obtido por Análise de Componente Principal) e número de ninfas (fecundidade) de clones de B. brassicae que utilizaram acelga e rabanete como hospedeiros. Fonte GL QM F P Tamanho Clone Hospedeiro Clone x Hospedeiro Erro 10 1 10 198 10,581 9,177 2,941 0,377 28,079 24,354 7,804 <0,0001 <0,0001 <0,0001 Fecundidade Clone Hospedeiro Clone x Hospedeiro Erro 10 1 10 198 14,971 126,768 14,938 4,379 3,419 28,947 3,411 <0,0001 <0,0001 <0,0001 Biosci. J., Uberlândia, v. 25, n. 2, p. 122-130, Mar./Apr. 2009 Plasticidade para o tamanho... PEREIRA, C. D.; PAULA, C. L. 126 Considerando toda a amostra (N= 220), clones criados na acelga (X= 0,20 + 0,09) foram significativamente maiores (F=24,354; P<0,001) que aqueles criados no rabanete (X= -0,20 + 0,09). Entretanto, três clones não demonstraram plasticidade para o tamanho (clones PAM, MAT e TUB) e outros dois clones (clones UMU e BRA) foram maiores quando utilizaram o rabanete como hospedeiro (Figura 1). -4 -3 -2 -1 0 1 2 3 4 acelga rabanete Hospedeiros ín di ce m ul ti va ri ad o de ta m an ho 0 2 4 6 8 10 12 acelga rabanete Hospedeiros F ec un di da de (n úm er o de n in fa s) Figura 1. Normas de reação do índice multivariado de tamanho e da fecundidade para clones de B. brassicae que utilizaram acelga e rabanete como hospedeiros. Observou-se significativa diferença genotípica (entre os clones) em relação à fecundidade (número de ninfas) (F=3,419; P<0,0001) e ainda diferenças atribuídas ao fator hospedeiro, o que demonstra significativamente a ocorrência de plasticidade fenotípica para a fecundidade (F=28,947; P<0,0001). A interação clone x hospedeiro também foi significativa (Tabela 3), indicando haver variabilidade nas respostas plásticas, apresentadas pelos clones quanto à fecundidade entre os hospedeiros (Figura 1). Os clones na acelga (X= 7,1 + 0,23) tiveram significativa maior fecundidade média (F= 28,947; P< 0,001) do que clones que utilizaram o rabanete (X= 5,5 + 0,22). Entretanto, um clone (PAM) não se mostrou plástico para este caracter e outro (BRA) apresentou maior fecundidade utilizando o rabanete. As normas de reação confirmaram, graficamente, a ocorrência de plasticidade para o tamanho e a fecundidade (Figura 1). Houve correlação fenotípica positiva e significativa entre o tamanho e a fecundidade (r=0,233: P=0,014) apenas no hospedeiro rabanete, (r=0,140; P=0,144 na acelga). Biosci. J., Uberlândia, v. 25, n. 2, p. 122-130, Mar./Apr. 2009 Plasticidade para o tamanho... PEREIRA, C. D.; PAULA, C. L. 127 DISCUSSÃO Os diferentes clones de B. brassicae responderam fenotipicamente às influências dos seus hospedeiros. Deste modo, a determinação do tamanho e da fecundidade não dependeu apenas da expressão genética, porque houve considerável influência do ambiente. As significativas interações genótipo– ambiente e as normas de reação indicaram haver variações na intensidade e direção das respostas plásticas entre os clones para o tamanho e a fecundidade. Apesar de alguns clones terem respostas canalizadas ou semelhantes nos cultivares testados, custos para a plasticidade podem ser apontados pela redução em alguns clones do tamanho e da fecundidade no hospedeiro alternativo. Como B. brassicae apresentou maior tamanho e fecundidade ao utilizar a acelga, este parece ser um hospedeiro mais favorável, se comparado ao rabanete. Entretanto, em ambientes com forte seleção para sobrevivência, como observado nos clones alimentando-se no rabanete, espera-se, geralmente, encontrar baixa variabilidade populacional (FALCONER, 1989). Uma vez que a variabilidade fenotípica total para estes caracteres foi similar na utilização dos cultivares, o que pode ser facilmente visualizado nas normas de reação, pode-se supor que os aumentos na variabilidade para o tamanho e a fecundidade estejam sendo gerados por plasticidade fenotípica (GORUR, 2005; GORUR et al., 2005). Assim, os ajustes morfológicos e também fisiológicos em resposta a heterogeneidade ambiental estariam auxiliando a manutenção da sobrevivência e da capacidade reprodutiva, podendo, por causa disto, serem considerados adaptativos (THOMPSON, 1991; ZHIVOTOVSKY et al., 1996; POWELL et al., 2006). Diversos fatores podem ter contribuído para tornar o rabanete um hospedeiro menos adequado ao desenvolvimento e à reprodução de B. brassicae. Além das diferenças nutricionais, os hospedeiros possuem distintas características foliares como a presença de tricomas no rabanete e cera na acelga. Thompson (1988) afirmou que os caracteres anatômicos nas espécies hospedeiras são importantes agentes indutores da especialização herbívora. Tricomas e pêlos são considerados defesas morfológicas em plantas, porque podem restringir o acesso de fitófagos ao floema (MORAN, 1986). A especialização morfológica às peculiaridades da superfície foliar pode, deste modo, atuar seletivamente nos modos de locomoção, investigação e penetração da superfície para alimentação (VIA; SHAW, 1996). Para pulgões do gênero Uroleucon Mordvilko, por exemplo, Moran (1986) observou correlação positiva entre comprimento do rostro e diversidade de tricomas foliares de suas plantas hospedeiras Os clones de B. brassicae apresentaram baixos coeficientes de variação no comprimento do rostro, apesar das diferenças anatômicas dos hospedeiros testados. Contrariamente, Peppe e Lomônaco (2003) verificaram que clones do afídeo Mysus persicae Sulzer criados em rabanete possuíam rostros maiores que aqueles que se alimentaram em couve. Divergências nas estratégias de variações plásticas entre B. brassicae e M. persicae poderiam ser conseqüentes de diferenças no tamanho destes pulgões. B. brassicae são maiores que M. persicae, o que pode ser facilmente verificado por inspeção visual. Por causa disto, seleção para rostro de maior tamanho em hospedeiros que apresentam grande diversidade de pêlos nas folhas seria mais intensa em M. persicae, dado seu menor tamanho. A determinação fenotípica do tamanho dos afídeos parece ser bastante influenciada pelo valor nutricional de seus hospedeiros ou pela qualidade dos elementos do floema, dos quais se alimentam (GRUBER; DIXON, 1988, BLACKMAN; SPENCE, 1994; GORUR et al., 2007). Além da qualidade nutricional e características anatômicas de hospedeiros, fatores climáticos são também capazes de influenciar a variação nas características quantitativas da população de afídeos, tais como dimensões do comprimento do corpo e número de descendentes (DIXON, 1985). Embora B. brassicae tenha mostrado potencial plástico tanto para caracteres morfológicos quanto para a fecundidade, correlações fenotípicas entre estes caracteres somente foram verificadas em um dos ambientes (rabanete). Isto não significa, entretanto, que sejam caracteres independentes no ambiente onde as correlações não foram detectadas, pois Scheiner e Lyman (1989) verificaram que em uma interação como esta, um novo nível de organização genômica pode estar ocorrendo. Esta nova arquitetura genética pode ser causada pela expressão de novos genes ou diferentes expressões do mesmo grupo de genes com efeitos pleiotrópicos sobre os caracteres analisados (HOLLOWAY et al., 1990; GOMULKIEWICZ; KIRKPATRICK, 1992). Este fato poderia estar influenciando a relação entre fecundidade e tamanho, tornando-a não linear e, portanto, não passível de ser detectada por correlação simples. Biosci. J., Uberlândia, v. 25, n. 2, p. 122-130, Mar./Apr. 2009 Plasticidade para o tamanho... PEREIRA, C. D.; PAULA, C. L. 128 CONCLUSÃO O grande potencial plástico de B. brassicae para o tamanho e a fecundidade permitiu a utilização do rabanete como hospedeiro alternativo, mesmo sendo este pouco favorável. Embora a trajetória evolutiva do B. brassicae tenha favorecido especialização para o uso de brássicas, parece haver, grandes potencialidades para a pré-adaptação a diferenciados hospedeiros, como o ocorrido com o rabanete neste trabalho que poderiam eventualmente ser incorporados à gama de recursos já utilizado pela espécie. AGRADECIMENTOS As autoras agradecem ao CNPq pela bolsa de mestrado concedida, à FAPEMIG e Universidade Federal de Uberlândia pelos auxílios oferecidos para a execução deste trabalho. Ao técnico Lázaro de Maria Peres e a Grace de Lourdes Cardoso pela ajuda na coleta de dados, ao Prof. Dr. Paulo Eugênio Oliveira pela revisão do Abstract e aos estatísticos Dr. Leonardo Cunha Melo e Dr. Heyder Diniz Silva, pelas sugestões dadas nas análises quantitativas. ABSTRACT:This work describes the plasticity on the phenotypic expression of Brevicoryne brassicae (L.) size and fecundity, utilizing radish (Raphanus sativus) and Chinese cabbage (Brassica campestris var. pekinensis) as hosts. Eleven clones were collected in different locations and kept on the tested hosts under the same conditions of temperature and luminosity. Thirty days after clone establishment on each host, morphological traits were obtained for ten individuals from each clone and on each host (n=220) and summarized employing principal component analysis in order to obtain a multivariate index of size. The number of nymphs inside the reproductive apparatus was also registered to estimate fecundity. Plasticity on size and fecundity of B. brassicae was evaluated using a quantitative genetic model (two-way ANOVA). Clones demonstrated plasticity for size and fecundity. Genetic variation among the clones on its plastic responses was also observed both for size and fecundity. Phenotypic correlation between size and fecundity was positive and significant only for individuals reared on radish. Divergences on phenotypic correlations related to host use may indicate the occurrence of distinct genetic mechanisms operating on each environment. The rostrum is a canalised structure, among clones and hosts, since they showed the lowest coefficient of variation. KEYWORDS: Insecta. Morphological plasticity. Phenotypic correlations. Quantitative genetics. REFERÊNCIAS BRADSHAW, A. D. Evolutionary significance of phenotypic plasticity in plants. Adv. Genet., New York, n. 13, p. 115-155. 1965. BLACKMAN, R. L.; EASTOP, V. F. Aphids on the word’s crops: an identification and information guide. New York: John Wiley Sons, 1984. 466p. BLACKMAN, R. L.; SPENCE, J. M. The effects of temperature on aphid morphology using a multivariate approach. Eur. J. Entomol., Branisovska, n. 91, p. 7-22. 1994. DIXON, A. F. G. Aphid ecology. Glasgow and London: Blackie, 1985. 157p. 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