Microsoft Word - 15-revisado_956.doc Original Article Biosci. J., Uberlândia, v. 26, n. 4, p. 610-618, July/Aug. 2010 610 PRÁTICAS DE PRODUÇÃO APLICADAS NO CONTROLE DE CONTAMINAÇÃO MICROBIANA NA PRODUÇÃO DE LEITE CRU PRODUCING PRACTICES APPLIED ON THE CONTROL OF MICROBIOLOGICAL CONTAMINATION IN RAW MILK PRODUCTION Anderson Keizo YAMAZI1; Paula Mendonça MORAES2; Gabriela Nogueira VIÇOSA1; Maria Beatriz Tassinari ORTOLANI3; Luís Augusto NERO4 1. Aluno do curso de Medicina Veterinária, Universidade Federal de Viçosa - UFV, Viçosa, MG, Brasil; 2. Mestranda em Medicina Veterinária – UFV, Viçosa, MG, Brasil; 3. Mestre em Medicina Veterinária – UFV, Viçosa, MG, Brasil; 4. Professor, Doutor, Departamento de Veterinária, Universidade Federal de Viçosa, Viçosa, MG, Brasil. nero@ufv.br RESUMO: A qualidade do leite cru é influenciada diretamente pelas condições de higiene na ordenha e armazenamento, bem como sanidade dos animais. Isso determina que a adoção de Boas Práticas de Produção é fundamental para obtenção de produtos final com baixas contagens microbianas, característica indicativa de boa qualidade. Visando avaliar a eficácia de práticas higiênicas durante o procedimento de ordenha em uma propriedade rural, pontos específicos foram selecionados e amostrados em duas etapas: uma fase inicial, com as práticas do produtor, e uma fase seguinte, em que práticas higiênicas específicas foram adotadas (soluções de cloro para pré-dipping, a 750ppm, e higiene de utensílios, a 300 ppm, além de descarte de primeiros jatos de leite). As amostras foram coletadas em 3 repetições em cada etapa e submetidas a contagens de aeróbios mesófilos (Petrifilm™ AC, 35ºC por 48h), psicrotróficos (superfície de ágar padrão de contagem, 7ºC por 10 dias), coliformes totais e Escherichia coli (Petrifilm™ EC, 35ºC por 48h). Os resultados finais obtidos foram comparados em cada etapa. Na etapa inicial os grupos identificados como principais contaminantes da linha de ordenha foram os aeróbios mesófilos e psicrotróficos, presentes em altos níveis nos tetos e leite dos animais. As práticas adotadas geraram redução da contaminação dos microrganismos indicadores pesquisados em vários pontos da linha de ordenha, indicando a eficácia das soluções de cloro para higienização de tetos dos animais e utensílios de ordenha. PALAVRAS-CHAVE: Leite. Higiene. Boas práticas de produção. Cloro. INTRODUÇÃO O leite cru produzido em várias regiões do Brasil possui baixa qualidade microbiológica, derivada de práticas inadequadas na obtenção, conservação e transporte desse produto até indústrias de beneficiamento (ARCURI et al., 2006; NERO et al., 2004; CERQUEIRA et al., 1994). Essa baixa qualidade não é identificada somente no Brasil, sendo caracterizada principalmente por altas contagens de microrganismos indicadores de higiene, como aeróbios mesófilos e coliformes, além da presença de patógenos (JAYARAO et al., 2006; CHYE, ABDULLAH e AYOB, 2004; JAYARAO; HENNING, 2001; HEESCHEN, 1996). Esses microrganismos são originados principalmente do ambiente de ordenha e utensílios empregados, além dos próprios animais (SLAGHUIS, 1996; DONNELLY, 1990). Considerando essas características, em 2002 o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) publicou a Instrução Normativa no 51 (IN51) (BRASIL, 2002), que determina normas específicas para a produção de leite cru no Brasil, além de parâmetros detalhados para a verificação adequada da qualidade e segurança desse produto. A preocupação com a qualidade e segurança de alimentos produzidos no Brasil não é recente, já que desde 1952 são exigidas condições adequadas de higiene em todas as fases da produção pelo Regulamento da Inspeção Industrial e Sanitária de Produtos de Origem Animal (RIISPOA) (BRASIL, 1952), e posteriormente em 1997 pela Portaria no 368 (BRASIL, 1997). Entretanto, em ambas as legislações não há um detalhamento específico para a produção de leite. A determinação de novos parâmetros e normas para a produção de leite cru visa a obtenção de um produto final com alta qualidade, capaz de ser processado de forma adequada na indústria gerando produtos beneficiados com características que atendam o exigente mercado interno e externo. Programas de qualidade como Boas Práticas de Fabricação (BPF) e Análises de Perigos e Pontos Críticos de Controle (APPCC) (ICMSF, 1988) são adotados pelas indústrias de alimentos a fim de atingir e garantir esses padrões de qualidade em seus produtos finais. Segundo esses programas, a verificação da contaminação microbiana e procedimentos higiênicos em etapas chave da produção são fundamentais para minimizar possíveis Received: 06/09/09 Accepted: 13/02/10 Boas práticas de produção... YAMAZI, A. K. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 26, n. 4, p. 610-618, July/Aug. 2010 611 contaminações e garantir a qualidade e segurança final. Em relação a leite, a etapa de obtenção da matéria-prima é fundamental para esse controle, uma vez que interfere diretamente na qualidade e segurança de todos os produtos beneficiados e derivados (CHAMBERS, 2002). Na obtenção do leite cru, os principais pontos de contaminação microbiana considerados são o interior da glândula mamária, o exterior do úbere e das tetas e os equipamentos de ordenha e de armazenamento (SLAGHUIS, 1996; DONNELLY, 1990). Dessa forma, a higienização prévia dos tetos, mãos do ordenhador e do local de ordenha, que incluem teteiras, latões, ordenhadeira e do piso, é fundamental para redução da contaminação por microrganismos deteriorantes e patogênicos no leite, além de melhorar as condições higiênicas finais (NADER FILHO et al. 1982). Considerando a importância de um controle efetivo da contaminação microbiana durante a obtenção do leite, esse estudo teve como objetivo identificar quais são os principais pontos de contaminação do leite cru na linha de ordenha de uma propriedade rural, e os efeitos de práticas higiênicas na redução do nível de contaminação microbiológica. MATERIAL E MÉTODOS Propriedade rural Uma propriedade leiteira localizada na região de Viçosa, MG, foi selecionada para a execução da pesquisa por apresentar características de produção típicas da região (NERO, VIÇOSA; PEREIRA, 2009). Durante a execução das atividades, a propriedade apresentava 53 vacas em lactação, com produção média de 1.100 litros por dia. O sistema de ordenha do leite era mecânico, com captação da produção em latões (balde ao pé) que eram armazenados em tanques de imersão por até 24h. Diariamente a produção era encaminhada para beneficiamento em um pequeno laticínio localizado na mesma propriedade. A rotina de higiene de ordenha adotada pelo produtor consistia em lavagem constante do estábulo (antes, durante e após ordenha), lavagem de tetas apenas com água seguida de secagem com papel toalha, uso apenas de pós-dipping (solução de iodo) e lavagem completa mensal da ordenhadeira com detergente alcalino. Planejamento do estudo e coleta de amostras A pesquisa foi desenvolvida em duas fases. Inicialmente (Etapa 1) foram consideradas as práticas higiênicas adotadas convencionalmente pelo produtor, com coletas de amostras de leite e superfícies de equipamentos e tetos de animais em diversos pontos da linha de ordenha (SANTANA et al., 2004) que foram submetidas a análises microbiológicas (Tabela 1). Essa fase da pesquisa teve como objetivo a caracterização dos níveis de contaminação usuais na linha de ordenha. Tabela 1. Amostras coletadas na linha de ordenha de uma propriedade rural com atividade leiteira, e práticas higiênicas convencionalmente adotadas e propostas. Amostra Quantidade amostrada Prática higiênica do produtor Prática higiênica proposta Antes da ordenha Teteira 3 cm2 Lavagem com água Lavagem com solução de cloro a 300 ppm* Latão (estoque do leite) 50 cm2 Lavagem com água Lavagem com solução de cloro a 300 ppm* Tetos 3 cm2 Lavagem com água Pré-dipping com solução de cloro a 750 ppm* Durante ordenha Leite (1os jatos) 20 mL -- Descarte Boas práticas de produção... YAMAZI, A. K. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 26, n. 4, p. 610-618, July/Aug. 2010 612 Leite (após 1os jatos) 20 mL -- -- Teteira 3 cm2 -- Lavagem com solução de cloro a 300 ppm entre um animal e outro* Após ordenha Leite 100 mL -- -- Água (uso geral) 100 mL -- -- * Soluções preparadas com Deosan Clortbas (JohnsonDiversey Brasil Ltda., São Paulo, SP, Brasil). Concentrações das soluções conforme FAGAN et al. (2005) Posteriormente (Etapa 2), práticas higiênicas específicas foram propostas e aplicadas em diferentes etapas da linha de ordenha. As práticas aplicadas estão detalhadas na Tabela 1, e as soluções de cloro utilizadas foram obtidas diluindo- se pastilhas de Deosan Clortabs (JohnsonDiversey Brasil Ltda, São Paulo, SP, Brasil) em água da propriedade rural. Após aplicação das práticas, amostras dos mesmos pontos (SANTANA et al., 2004) foram coletadas e submetidas a novas análises microbiológicas. Para coleta de amostras superficiais, foram feitos moldes em papel-cartão com áreas de 3 e 50 cm2, esterilizados e no momento do uso posicionados nas superfícies. As amostras foram coletadas com swab estéreis (J. Prolab, São José dos Pinhais, PR, Brasil) umedecidos em NaCl 0,85%, e em seguida acondicionados em tubos contendo 3 mL de NaCl 0,85%. Em condições assépticas, o volume obtido final da área amostrada foi adicionado de NaCl 0,85% a fim de atingir uma solução final com a equivalência de 1 mL = 1 cm2. Todas as amostras foram coletadas em 3 ocasiões com as práticas higiênicas de ordenha usualmente empregadas pelo produtor (Etapa 1), e em 3 ocasiões após a implantação de práticas higiênicas específicas (Etapa 2), detalhadas na Tabela 1. As amostras de leite e água (não clorada, de poço) foram coletadas em frascos estéreis, após o procedimento convencional do produtor de higienização e as práticas sugeridas. As amostras superficiais de tetos e de leite antes e após o descarte dos primeiros jatos foram coletadas de 5 vacas selecionadas aleatoriamente, em condições adequadas de ordenha (ausência de mastite clínica), em cada coleta. Ao final do procedimento de ordenha em cada coleta, o leite final obtido foi coletado em frasco estéril. Todas as amostras foram conservadas sob refrigeração até o momento das análises laboratoriais. Análises microbiológicas Diluições. Todas as amostras foram diluídas serialmente em escala decimal utilizando-se NaCl 0,85% estéril. Para cada amostra e análise microbiológica, duas diluições foram selecionadas considerando o nível de contaminação esperado. Aeróbios Mesófilos. Alíquotas de 1,0 mL das diluições selecionadas foram semeadas em placas de Petrifilm™ AC (3M Microbiology, St. Paul, MN, EUA), com incubação a 35ºC por 48h. Após incubação, as colônias formadas foram enumeradas e o resultado final foi expresso em Unidades Formadoras de Colônias por mL ou cm2 (UFC/mL ou cm2). Psicrotróficos. Alíquotas de 0,1 mL das diluições selecionadas foram semeadas por superfície em Ágar Padrão de Contagem (PCA), em duplicata, e incubadas a 7ºC por 10 dias (WEHR; FRANK, 2004). Após incubação, as colônias formadas foram enumeradas e o resultado final expresso em UFC/mL ou cm2. Coliformes totais e Escherichia coli. Alíquotas de 1,0 mL das diluições selecionadas foram semeadas em placas de Petrifilm™ EC (3M Microbiology), com incubação a 35ºC por 48h. Após incubação, as colônias com coloração azul e associadas a gás foram enumeradas como E. coli, e somadas às vermelhas associadas a gás foram enumeradas como coliformes totais. O resultado final foi expresso em UFC/mL ou cm2. Boas práticas de produção... YAMAZI, A. K. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 26, n. 4, p. 610-618, July/Aug. 2010 613 Análise dos dados As médias dos resultados obtidos para contagem de cada grupo de microrganismos indicadores e amostra foram calculadas e comparadas considerando a Etapa 1 ou 2, para verificação da eficácia das práticas sugeridas na contaminação microbiana nos diversos pontos amostrados. Também foi verificada a eficácia das práticas adotadas na redução da contaminação microbiana em pontos específicos da linha de ordenha. RESULTADOS E DISCUSSÃO Os valores médios de aeróbios mesófilos, psicrotróficos, coliformes totais e E. coli obtidos nas diferentes amostras coletadas na linha de ordenha antes (Etapa 1) e depois (Etapa 2) da adoção de práticas higiênicas são apresentados na Tabela 2. Não foi verificada contaminação relevante por nenhum grupo de microrganismo pesquisado em nenhuma das amostras de água analisadas, indicando que a mesma não pode ser considerada uma fonte de contaminação importante no ambiente de ordenha da propriedade. Na Etapa 1 os tetos e o leite dos animais (primeiros jatos e após descarte destes) foram os principais pontos de contaminação, principalmente em relação a aeróbios mesófilos e psicrotróficos. Na Etapa 2, mesmo após a aplicação das práticas higiênicas, os principais pontos de contaminação identificados foram os tetos e leite dos animais e a superfície dos latões, entretanto apenas para aeróbios mesófilos. Em todos os pontos verificados houve redução da contaminação por psicrotróficos. Coliformes totais e E. coli apresentaram baixos níveis de contaminação nos diferentes pontos de coleta e etapas da pesquisa. Dessa forma, aeróbios mesófilos e psicrotróficos podem ser considerados os principais grupos de microrganismos responsáveis pela qualidade microbiológica final do leite na propriedade estudada. As teteiras de ordenhadeiras mecânicas são comumente descritas como importantes pontos de contaminação microbiana no leite (BRITO, BRITO e VERNEQUE, 2000; McKINNON, ROWLANDS e BRAMLEY, 1990). Entretanto, estudos similares realizados em outros países revelaram que a contaminação por aeróbios mesófilos em superfícies de utensílios com contato direto com leite, como teteiras e latões, atingiram valores relativamente baixos, entre 40 e 500 UFC/cm2 (SALO et al., 2006; GRAN et al., 2002). O grupo dos psicrotróficos também foi identificado como importante contaminante, associado principalmente aos primeiros jatos de leite (Tabela 2). Na propriedade onde o trabalho foi realizado não havia o descarte dessa primeira porção de leite, que pode representar uma importante fonte de contaminação (CHAMBERS, 2002). Santana et al.(2004) identificaram como principais pontos de contaminação desse grupo na linha de ordenha utensílios mal higienizados, água residual de recipientes (latões e tanques de expansão) e tetos, com contagens variando entre 23.000 e 63.000 UFC/cm2. Nos primeiros jatos de leite, os mesmos autores encontraram contagens de psicrotróficos variando entre 1.000 e 5.000 UFC/mL, inferiores aos obtidos no presente estudo na Etapa 1 (Tabela 2). A pesquisa de psicrotróficos em leite e identificação de seus principais pontos de contaminação assume grande importância principalmente pelas atuais condições de conservação desse produto permitidas no Brasil (BRASIL, 2002). Na refrigeração do leite em tanques de imersão é tolerada a temperatura de 7ºC, na qual microrganismos psicrotróficos conseguem se desenvolver e produzir enzimas proteolíticas e lipolíticas, termo-resistentes, que irão comprometer a qualidade dos produtos finais (MUNSCH- ALATOSSAVA; ALATOSSAVA, 2006; SILVEIRA, CARVALHO; TEIXEIRA, 1998; SØRHAUG; STEPANIAK, 1997; SHAH, 1994). Comparando-se a contaminação do leite nos primeiros jatos e após o descarte dessa porção, e considerando todas as amostras em ambas as etapas da pesquisa, verifica-se redução de 77,5% na contagem média de aeróbios mesófilos, 97,9% de psicrotróficos, 43,1% de coliformes totais e 52,8% de E. coli (Figura 1). A adoção de soluções de cloro para higienização dos utensílios e tetos dos animais foi baseada em recomendações de FAGAN et al. (2005), que verificou a eficiência dessa substância na redução da contaminação microbiana em diferentes pontos da linha de ordenha em propriedades rurais. A utilização dessa substância na concentração de 300 ppm resultou em redução de todos os microrganismos indicadores pesquisados na superfície de teteiras antes do início e durante a ordenha. No latão de armazenamento do leite resultou em redução de psicrotróficos e coliformes totais (Tabela 2). Boas práticas de produção... YAMAZI, A. K. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 26, n. 4, p. 610-618, July/Aug. 2010 614 Tabela 2. Média das contagens de aeróbios mesófilos, psicrotróficos, coliformes totais e Escherichia coli em amostras coletadas na linha de ordenha de leite antes (Etapa 1) e após (Etapa 2) adoção de práticas higiênicas. Em cada grupo de microrganismo indicador é indicada a eficiência do procedimento aplicado entre as duas etapas (Diferença, porcentagem de redução/aumento considerando o valor da primeira etapa). Aeróbios mesófilos* Psicrotróficos* Coliformes totais* Escherichia coli* Amostra Etapa 1 Etapa 2 Diferença Etapa 1 Etapa 2 Diferença Etapa 1 Etapa 2 Diferença Etapa 1 Etapa 2 Diferença Antes ordenha Teteira 163,0 108,0 -33,7% 14,2 3,8 -72,9% 40,0 0,0 -100,0% 39,0 0,0 -100,0% Latão 745,0 1.218,7 63,6% 24,7 0,5 -98,0% 10,5 0,3 -96,8% 0,0 0,0 0,0% Tetos 1.289,9 905,9 -29,8% 233,7 45,6 -80,5% 8,5 7,7 -9,8% 2,5 6,8 170,0% Durante ordenha Leite (1os jatos) 84.670,0 124.500,0 47,0% 10.268,2 98,2 -99,0% 42,0 30,3 -27,8% 5,0 8,6 71,7% Leite (após 1os jatos) 28.401,7 13.395,6 -52,8% 188,4 24,2 -87,2% 11,0 16,5 50,0% 10,5 2,5 -76,2% Teteira 659,3 13,3 -98,0% 112,3 0,2 -99,9% 1,0 0,0 -100,0% 0,0 0,0 0,0% Após ordenha Leite 7.466,7 9.066,7 21,4% 355,0 2.240,0 531,0% 180,7 66,0 -63,5% 118,0 14,0 -88,1% Água 0,0 0,0 0,0% 43,8 0,0 -100,0% 0,0 0,0 0,0% 0,0 0,0 0,0% * Unidades em UFC/mL ou UFC/cm2, de acordo com cada amostra (Tabela 1) Boas práticas de produção... YAMAZI, A. K. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 26, n. 4, p. 610-618, July/Aug. 2010 615 0 1 2 3 4 5 6 AM PSI CT EC Microrganismo indicador M é d ia ( lo g U F C /m L ) Figura 1. Médias das contagens de aeróbios mesófilos (AM), psicrotróficos (PSI), coliformes totais (CT) e Escherichia coli (EC) em leite dos primeiros jatos (colunas pretas) e após descarte dos primeiros jatos (colunas cinzas). Valores médios calculados considerando valores reais (UFC/mL) e convertidos em log10 UFC/mL para visualização adequada. A utilização do cloro na concentração de 750 ppm como pré-dipping resultou em redução da contaminação de aeróbios mesófilos, psicrotróficos e coliformes totais na superfície dos tetos dos animais (Tabela 2). As concentrações utilizadas nas soluções de cloro aplicadas em utensílios e tetos dos animais são suficientes para determinarem um efeito bactericida efetivo, porém sem gerar resíduos no leite produzido nem irritar a pele dos animais (FAGAN et al., 2005). A utilização de soluções de cloro nos procedimentos de ordenha a fim de se reduzir a contaminação microbiana já é conhecida (BESSEMS, 1998; BYERS; EWALT, 1943) e são consideradas bastante úteis pelo custo reduzido e eficácia na redução da contaminação, porém é importante que seja renovada constantemente para manter a sua efetividade e concentração desejada (BODDIE, NICKERSON; ADKINSON, 2000; ROSSONI; GAYLARDE, 2000; DRECHSLER, WILDMAN; PANKEY, 1990; BODDIE, NICKERSON; ADKINSON, 1982). Associada a concentração, o tempo de ação necessário para que a solução de cloro tenha seu efeito bactericida é fundamental (ROSSONI; GAYLARDE, 2000; BESSEMS, 1998), e pode variar entre 60 minutos para soluções a 200 ppm (WHO, 1993) até 2 minutos para soluções a 1.000 a 2.000 ppm (PITT et al., 1992). As soluções utilizadas nesse estudo agiram por tempo até inferior a 2 minutos, e mesmo assim resultaram em efeito bactericida (Tabela 2). Embora as práticas higiênicas adotadas tenham resultado em redução da contaminação microbiana em vários pontos da ordenha, o leite final obtido não apresentou redução do nível de contaminação por aeróbios mesófilos e psicrotróficos. As más condições higiênicas do local de armazenamento do leite na propriedade estudada podem ter contribuído para as altas contagens observadas, além da ineficiência da solução de cloro a 300 ppm na higienização dos latões (Tabela 2). Quanto a esse aspecto, um aumento no tempo de contato entre essa solução de cloro e os latões poderia gerar um aumento da eficiência (PITT et al., 1992), atingindo o efeito bactericida desejado. Ainda, poderia ser utilizada uma solução de cloro mais concentrada e, principalmente, conservação da produção final em condições adequadas de refrigeração (CHAMBERS, 2002). CONCLUSÃO As práticas de produção aplicadas na produção de leite cru são eficazes para reduzir o nível de contaminação em pontos específicos da linha de ordenha, como teteiras de ordenhadeiras mecânicas e superfície de tetos dos animais em lactação, contribuindo para a melhoraria da qualidade do leite. Boas práticas de produção... YAMAZI, A. K. et al. Biosci. J., Uberlândia, v. 26, n. 4, p. 610-618, July/Aug. 2010 616 ABSTRACT: The quality of raw milk is directly influenced by hygiene conditions during milking and storage, and also by animal sanity. Considering these characteristics, Good Producing Practices (GPP) must be adopted systematically in milk production in order to obtain final products with low microbial counts, what is indicative of quality. A dairy farm was selected to evaluate the efficiency of some GPP during milking process, when milk and surface samples were collected from specific milking steps in two stages: a first one, when hygienic procedures from the farmers were conducted, and a following one, when specific hygienic procedures were adopted (chlorine solutions for pre-dipping, at 750ppm, and utensils cleaning, at 300ppm, and discard of the forestrip milk). The samples were collected in three repetitions in each phase and submitted to microbiological analysis of mesophilic aerobes (Petrifilm™ AC, 35ºC for 48h), psychrotrophics (surface of plate count agar, 7ºC for 10 days), total coliforms e Escherichia coli (Petrifilm™ EC, 35ºC for 48h). The final results were then compared in each phase. At the initial phase, mesophilic aerobes and psychrotrophics were identified as the main contaminants of milking procedure by their high levels in the teats and milk. The adopted procedures generated reduction of microbial contamination in several sampling points, indicating the efficacy of chlorine solutions for hygiene of teats and milking utensils. KEYWORDS: Milk. Hygiene. Good producing practices. Chlorine. REFERÊNCIAS AMARAL, L. A.; DIAS, L. T.; NADER FILHO, A.; ISA, H.; ROSSI JR, O. D. Avaliação da eficiência da desinfecção de teteiras e dos tetos no processo de ordenha mecânica de vacas. Pesquisa Veterinária Brasileira, Seropédica, v. 24, n. 4, p. 173-177, Oct. 2004. ARCURI, E. F.; BRITO, M. A. V. P.; BRITO, J. R. F.; PINTO, S. M.; ÂNGELO, F. G. F.; SOUZA, G. N. Qualidade microbiológica do leite refrigerado nas fazendas. Arquivo Brasileiro de Medicina Veterinária e Zootecnia, Belo Horizonte, v. 58, n. 3, p. 440-446, Jun. 2006. BESSEMS E. The effect of practical conditions on the efficacy of disinfectants. International Biodeterioration & Biodegradation, Amsterdam, v. 41, n. 3-4, p. 177-183, Sept. 1998. BRITO, J. R. F.; BRITO, M. A. V. 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