A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 139 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico The autonomy of municipalities within the regional provision of sanitation services Submetido(submitted): 20 June 2022 Andrea Ferreira Caputo Jobim* https://orcid.org/0000-0002-3450-4237 Daniel Derenusson Kowarski** https://orcid.org/0000-0002-7935-5239 Giovani Morelli*** https://orcid.org/0000-0003-3318-9009 Tatianna Fernandes da Paz Ribeiro de Souza**** https://orcid.org/0000-0003-2610-5460 Parecer(reviewed): 5 October 2022 Revisado(revised): 5 December 2022 Aceito(accepted): 9 December 2022 Artigo submetido à revisão cega por pares (Article submitted to peer blind review) Licensed under a Creative Commons Attribution 4.0 International Abstract [Purpose] This paper addresses the autonomy of municipalities within the context of regional provision of sanitation services established as a fundamental principle in the basic sanitation sector by federal law nº 14.026/2020. [Methodology/approach/design] It was briefly analyzed the evolution of the sector from the ruling on the ADI 1842/RJ to the enactment of the federal law no. 14,026/2020, focusing on the ownership and the regional provision of the service, with bibliographic, jurisprudential, and comparative law analysis. [Findings] The research noted that the recent legislative changes resulted in the mitigation of municipal autonomy. [Practical implications] In this context, some ways were presented so that the municipalities could exercise their autonomy, in the different types of regionalization brought by federal law no. 14,026/2020, differentiating the municipal action in the contexts of federative coordination and cooperation. Keywords: Sanitation. Regional Provision. Coordination. Cooperation. Autonomy of Municipalities. *Advogada Pública atuante na área de saneamento básico – RJ; LLM em Litigation pela Fundação Getúlio Vargas (FGV); Graduada pela UFRJ. E-mail: andreafcaputo@yahoo.com.br. **Advogado Público atuante na área de saneamento básico – RJ; Mestre em Direito da Regulação pela Fundação Getúlio Vargas (FGV); Graduado pela PUC -Rio. E-mail: derekowa@gmail.com. ***Advogado Público atuante na área de saneamento básico – RJ; Especialista em Processo Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Graduado pela UERJ. E-mail: giovanimorelli@gmail.com. ****Procuradora do Município do Rio de Janeiro; Especialista em Direito Administrativo pela Universidade Cândido Mendes (UCAM); Graduada pela UFRJ. E-mail: tatianna.fprs@gmail.com. mailto:andreafcaputo@yahoo.com.br mailto:derekowa@gmail.com mailto:giovanimorelli@gmail.com mailto:tatianna.fprs@gmail.com 140 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. Resumo [Propósito] O presente artigo aborda a temática da autonomia municipal dentro do contexto da prestação regionalizada nos serviços de saneamento básico instituíd a como princípio fundamental setorial pela lei federal nº 14.026/2020. [Metodologia/abordagem/design] Para tanto, foi analisada, de maneira sucinta, a evolução do setor desde o julgamento da ADI 1842/RJ até a edição da lei federal 14.026/2020, com enfoque nas temáticas do exercício da titularidade e da regionalização da prestação dos serviços, trabalhando-se com análise bibliográfica, jurisprudencial e de direito comparado. [Resultados] A pesquisa observou que as recentes alterações legislativas culminaram na mitigação da autonomia municipal. [Implicações práticas] Neste contexto, foram apresentadas algumas formas para que os entes municipais exerçam sua autonomia nos diferentes cenários de regionalização trazidos pela lei federal nº 14.026/2021, diferenciando a atuação municipal nos contextos de coordenação e cooperação federativa. Palavras-chave: Saneamento básico. Prestação regionalizada. Coordenação. Cooperação. Autonomia Municipal. INTRODUÇÃO A lei federal nº 14.026/2020, que alterou o marco regulatório do setor de saneamento básico (lei n° 11.445/2007), introduziu uma série de reformas e atualizações setoriais, buscando caminhos para a universalização do abastecimento de água e do serviço de esgotamento sanitário no Brasil. Adotando parcialmente o estabelecido no Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB), a nova legislação trouxe metas de universalização que preveem que 99% (noventa e nove por cento) da população brasileira tenha acesso à água tratada e 90% (noventa por cento) tenha acesso à coleta e tratamento de esgoto até o final do ano de 20331. A lei prevê possibilidade de prorrogação do prazo, por mais sete anos, para os municípios que se depararem com maiores dificuldades e comprovarem inviabilidade técnica e/ou financeira. 1 O Plano Nacional de Saneamento Básico (PLANSAB) consiste no planejamento integrado do saneamento básico considerando seus quatro componentes: abastecimento de água potável, esgotamento sanitário, coleta de lixo e manejo de resíduos sólidos e drenagem e manejo das águas pluviais urbanas, e possui o horizonte de 20 anos (2014 a 2033). Os prazos para universalização do serviço de abastecimento de água tratada e esgotamento sanitário que constam no PLANSAB são: até 2033, o abastecimento de água para 90% e o esgotamento sanitário para 92% da população brasileira. Deste modo, a lei federal nº 14.026 foi além das metas estabelecidas no referido plano. Plano Nacional de Saneamento Básico. Disponível em: . Acesso em 12/10/2021. https://www.gov.br/mdr/pt-br/assuntos/saneamento/plansab https://www.gov.br/mdr/pt-br/assuntos/saneamento/plansab A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 141 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. Há, inclusive, previsão de que os contratos de prestação de serviços públicos de saneamento básico - mesmo aqueles em vigor - tragam metas de universalização, prevendo a lei prazo até março de 2022 para esta inclusão pelos concessionários2. Os serviços de abastecimento de água tratada e esgotamento sanitário possuem características de monopólio natural, refletindo um setor com elevados custos fixos, baixos custos marginais e custos médios de produção decrescentes; o que diminui o incentivo para a realização de investimentos (RAGAZZO, 2011). Isto significa dizer que para a implantação da infraestrutura inaugural indispensável à prestação destes serviços são necessários investimentos iniciais irrecuperáveis, já que seus custos fixos são muito elevados relativamente à demanda. De outro lado, os mencionados serviços apresentam as externalidades3 positivas ocorridas em operações em rede: a conexão ao sistema melhora a vida de todas as pessoas envolvidas, seja por meio de promoção da saúde pública, seja pela melhoria da qualidade do meio ambiente. Ademais, a diluição dos custos da prestação por toda uma população favorece a manutenção de uma tarifa módica para estes serviços públicos (SAMPAIO, 2021). Como forma de propiciar o atingimento das metas de universalização propostas para um setor que apresenta esses elevados custos iniciais, a nova legislação trouxe como um de seus princípios a regionalização dos serviços, 2 Lei 11.445/2007. Art. 11-B. Os contratos de prestação dos serviços públicos de saneamento básico deverão definir metas de universalização que garantam o atendimento de 99% (noventa e nove por cento) da população com água potável e de 90% (noventa por cento) da população com coleta e tratamento de esgotos até 31 de dezembro de 2033, assim como metas quantitativas de não intermitência do abastecimento, de redução de perdas e de melhoria dos processos de tratamento. (Redação pela Lei nº 14.026, de 2020). § 1º Os contratos em vigor que não possuírem as metas de que trata o caput deste arti go terão até 31 de março de 2022 para viabilizar essa inclusão. (...). §9º Quando os estudos para a licitação da prestação regionalizada apontarem para a inviabilidade econômico - financeira da universalização na data referida no caput deste artigo, mesmo após o agrupamento de Municípios de diferentes portes, fica permitida a dilação do prazo, desde que não ultrapasse 1º de janeiro de 2040 e haja anuência prévia da agência reguladora, que, em sua análise, deverá observar o princípio da modicidade tarifária. (Incluído pela Lei nº 14.026, de 2020). 3 Cumpre trazer uma definição de externalidade. Constituem-se em efeitos causados a terceiros em relações a que a princípio são alheios, mas resulta em uma discrepância entre estruturas de custo e benefício privadas e sociais de alguma forma pertinentes a essa relação. Nestes casos, a intervenção estatal busca reequilibrar estruturas de custo e benefício, internalizando as externalidades. O setor de saneamento básico tem externalidades que podem ser reunidas em três grupos: (1) impactos na saúde pública e meio ambiente; (2) impactos no desenvolvimento urbano e (3) impactos na competitividade internacional. RAGAZZO, Carlos Emmanuel Joppert. Regulação Jurídica, Racionalidade Econômica e Saneamento Básico. Rio de Janeiro : Renovar, 2011, p. 311 e 312. 142 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. estimulando ao máximo essa forma de prestação. De conseguinte, se por um lado, há um estímulo à regionalização, ao mesmo tempo, há redução na esfera de autonomia municipal para a prestação dos serviços de saneamento básico. Neste contexto, o presente artigo apresenta como objetivo analisar como a regionalização dos serviços de saneamento básico, trazida pela lei federal nº 14.026/2020, se coaduna com a autonomia municipal, ainda que esta seja vista de forma mitigada, e como se dará seu exercício dentro de um ambiente regionalizado. Diante das recentes alterações legislativas, que afastam o protagonismo setorial do Município, esse recorte temático possui grande relevância, tanto prática quanto acadêmica, em função da necessidade de melhor compreensão acerca da forma como aquele ente federativo irá atuar no setor de saneamento básico, sobretudo quando se observa o evidente estímulo à regionalização da prestação dos serviços e a consequente mitigação da autonomia municipal trazidas através da edição da lei federal nº 14.026/2020 (RIBEIRO e CUKIERT, 2020). Para tanto, este trabalho foi estruturado em três capítulos de desenvolvimento em que foram abordadas, a partir de pesquisa bibliográfica e jurisprudencial e análise de direito comparado, as formas que a recente modificação legislativa trouxe para propiciar a regionalização dos serviços, os novos cenários da autonomia municipal no contexto da regionalização e, ao final são propostas formas de atuação municipais adequadas à nova realidade setorial de modo a compatibilizar esta autonomia com a prestação regionalizada dos serviços. O ponto de partida da presente análise está na ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 1842/RJ, decisão fundamental para a compreensão dos temas que serão expostos neste artigo. Foi através de referida ação que a questão da titularidade dos serviços de saneamento básico foi definida. Deste modo, inevitável abordá-la sobretudo para tratar dos temas da prestação regionalizada e da autonomia municipal, o que será feito a seguir. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 143 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. I. A PRESTAÇÃO REGIONALIZADA: DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE (ADI) 1842 À LEI FEDERAL Nº 14.026/2020 O Brasil sofre, inegavelmente, com um déficit na prestação dos serviços de saneamento básico. Os números evidenciam que grande parte da população do país não tem acesso adequado a tais serviços.4 Historicamente, um dos principais problemas que dificultou a realização de investimentos na área, especialmente pelo setor privado, foi a falta de segurança jurídica ocasionada por disputas federativas sobre qual ente seria o titular de tal serviço e, por conseguinte, o poder concedente (GALVÃO JUNIOR, 2009) Não raro, referidas disputas acabavam nos tribunais, o que, decerto, contribuiu para afastar investidores potenciais. A mais significativa de tais disputas culminou no ajuizamento da ação direta de inconstitucionalidade (ADI) 1842/RJ. Na pendência de julgamento desta ADI, sobreveio a lei federal n° 11.445/2007, conhecida como Marco Regulatório do Saneamento Básico, que, apesar de trazer inúmeros avanços setoriais, propositadamente não definiu a questão da titularidade do serviço, contribuindo para a manutenção do cenário de insegurança jurídica.5 Quando finalmente julgada, em 2013, a ADI 1842/RJ colocou um ponto final na questão da titularidade e do poder concedente do serviço. Entendeu o STF que, em regra, a titularidade, e o consequente poder concedente, pertence aos Municípios. Porém, havendo integração metropolitana, na interpretação conferida pelo Supremo, existe um interesse comum metropolitano, nos termos do art. 25 §3º da Constituição, que leva à conclusão de que, nesses casos, a titularidade e o poder concedente são dos Municípios e do Estado. em sede de gestão compartilhada expressa por meio do órgão colegiado. Ademais, o STF, invocando o entendimento que já havia sido firmado na ADI 1841/RJ, deixou bastante claro que não há possibilidade de escolha pelo Município em participar dos mecanismos da denominada integração 4 Raio X do saneamento no Brasil: 16% não têm água tratada e 47% não têm acesso à rede de esgoto. Disponível em . Acesso em 10/10/2021. 5Quando da edição da lei federal 11.445/2007 houve um acordo político para que sua aprovação ficasse condicionada à não indicação expressa da titularidade, optando -se por aguardar a decisão do STF na ADI 1842/RJ. A evolução da tramitação do que culminou na lei mencionada encontra-se bastante detalhada em SALLES, Maria José. Política nacional de saneamento: percorrendo caminhos em busca da universalização. 2009. 185 f. Tese (Doutorado em Saúde Pública) - Escola Nacional de Saúde Pública Sergio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro, 2009. 144 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. metropolitana, o que, de acordo com o entendimento exarado, não esvaziaria a autonomia do ente municipal. O julgamento da ADI 1842/RJ, que conferiu maior segurança jurídica ao setor, não foi acompanhado por um aumento nos investimentos. Pelo contrário, a média de investimentos, que já vinha em queda desde 2010, continuou reduzindo (TRATA BRASIL, s.d.). Neste contexto, desde ao menos 2018, começou-se a discutir a necessária reforma no setor de saneamento básico. Inicialmente, foram editadas as medidas provisórias 844 e 868 já no ano de 2018 que, apesar de sinalizarem interessantes modificações, não foram convertidas em lei (BRASIL, 2018). No entanto, serviram como fagulha para o processo de reforma setorial. Encerrada a vigência das medidas provisórias supra referidas, iniciou-se discussão no Congresso Nacional para a edição de uma nova legislação para regular o setor de saneamento básico, o que culminou, em 2020, na edição da lei federal nº 14.026/2020. A lei federal n° 14.026/2020, denominada de Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico, trouxe inúmeras - e aguardadas - alterações setoriais. Dentre as mudanças, as que interessam ao presente trabalho são aquelas que versam, ainda que indiretamente, sobre o exercício da titularidade do serviço, a prestação regionalizada e a atuação dos Municípios no contexto trazido pela novel legislação, notadamente no que diz respeito à sua autonomia na prestação dos serviços. Em relação ao exercício da titularidade, a lei federal n° 14.026/2020 incorporou o entendimento fixado pelo STF na ADI 1842/RJ6, tendo definido que, nos casos de interesse local, cabe aos Municípios e ao Distrito Federal e, nos casos de interesse comum, compete ao Estado, em conjunto com os Municípios. Além disso, alterou a legislação infraconstitucional regulamentadora da gestão associada por meio de consórcios públicos e os convênios de cooperação, previstos no art. 241 da CRFB/88. O Novo Marco instituiu como princípio fundamental a prestação regionalizada, com o intuito de buscar ganhos de escala nos investimentos em prol da universalização do serviço. A instituição da prestação regionalizada decorre da existência de monopólio natural no setor, pois nem todos os Municípios possuem recursos hídricos e financeiros para a prestação do serviço, 6 Há, em doutrina, entendimento de que a lei federal 14.026/2020 não seguiu integralmente a decisão proferida pelo STF na ADI 1842/R J, numa espécie de backlash. RIBEIRO, Wladimir Antonio; CUKIERT, Tamara. O que esperar do Novo Marco Legal do Saneamento Básico? Disponível em . Acesso em 08/11/2021. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 145 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. de forma que a integração se revela necessária com o objetivo de ganho de escala na captação.7 O arranjo da regionalização visa, precipuamente, a adequar a situação financeira de inúmeros municípios com a obrigatoriedade de prestação dos serviços de saneamento básico, o que restaria impossibilitado de maneira isolada. Nesse sentido, a solução que a lei trouxe foi justamente a de estimular a agregação de Municípios menores para ganharem maior atratividade de investimentos. A regionalização na prestação dos serviços de saneamento básico não é exatamente uma novidade. Contudo, a lei federal n° 14.026/2020 trouxe novos contornos ao tema (MARRARA, 2021). A legislação admite a instituição de região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião nos termos do previsto no Estatuto da Metrópole, o que decorre de expressa previsão constitucional. No entanto, admite novas formas de regionalização de duvidosa constitucionalidade, sendo elas a unidade regional de saneamento básico e o bloco de referência (MASCARENHAS, 2021). Ademais, a legislação trouxe alguns mecanismos objetivando estimular a regionalização pelos Municípios não inseridos na integração metropolitana. A leitura da alteração legislativa parece indicar que a melhor forma para a prestação dos serviços é de maneira associada. Observa-se, assim, que a ideia de prestação regionalizada acaba, de certa forma, impactando na atuação dos Municípios para a prestação do serviço. Sob o viés da autonomia municipal, esse será o objeto de análise mais pormenorizada nos próximos tópicos. II. A AUTONOMIA MUNICIPAL PARA A PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS DE SANEAMENTO BÁSICO A autonomia municipal, garantida pela Constituição de 1988, representou o reconhecimento de uma realidade natural, nascida espontaneamente, desde antes da Independência, quando aglomerados humanos já legislavam de acordo com seus usos e costumes, conforme as necessidades 7Vejamos, por exemplo, o caso do Município do Rio de Janeiro, que não possui, dentro de seu território, acesso a qualquer manancial capaz de proporcionar o abastecimento de sua população. Para tanto, depende da água proveniente, sobretudo, da Estação de Tratamento do Guandu, localizada no município vizinho de Nova Iguaçu. O mencionado município também é abastecido pelo sistema de Ribeirão das Lajes, situado em Piraí, mas com menor abrangência populacional. NOVA CEDAE. Livreto Guandu. Disponível em: Acesso em 14/11/2021. INEA. “Sistemas de abastecimento público de água” Disponível em: Acesso em 14/11/2021 http://www.inea.rj.gov.br/ar-agua-e-solo/seguranca-hidrica/sistemas-de-abastecimento/guandu-lajes-acari/ http://www.inea.rj.gov.br/ar-agua-e-solo/seguranca-hidrica/sistemas-de-abastecimento/guandu-lajes-acari/ 146 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. locais (TEMER, 2007). Essa autonomia propicia aos Municípios a possibilidade de agir, de maneira responsável e conforme sua liberdade de escolha racional, em prol do melhor caminho a ser seguido para a consecução dos fins sociais previstos na Constituição. Nada mais natural que assim seja tendo em vista a maior proximidade dos gestores municipais em relação às necessidades diárias da população. O federalismo cooperativo, adotado pela Constituição de 1988, visa equilibrar, com instrumentos de cooperação e coordenação, o exercício das competências legislativas e administrativas, para alcançar de modo mais eficiente as finalidades estatais (SARLET et al., 2018). Nesse federalismo, também denominado como multinível, os Municípios foram erigidos a membros da Federação brasileira. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil a eles conferiu, ao lado da União, dos Estados e do Distrito Federal, autonomia federativa para atuar em prol de seus interesses (art. 18) (MODESTO, 2016). A Constituição de 1988, ao incluir o Município como ente federativo, elevou o princípio da autonomia municipal a um grau de caracterização política e jurídico tão alto e expressivo quanto nenhuma outra união federativa contemporânea (BONAVIDES, 2006). Decorrente do próprio modelo de federalismo adotado no país, cláusula pétrea em nossa Constituição (art. 60 §4°, I), a autonomia municipal possui tamanha relevância que a sua violação por Estado-membro abre possibilidade para que a União nele intervenha. Esta intervenção federal é medida necessária à manutenção do desenho federativo instituído pelo constituinte originário, tratando-se de dever da União para assegurar a observância do princípio constitucional sensível da autonomia municipal (art. 34, VII, c)8. Da leitura do desenho federativo constitucional é possível extrair as principais características da autonomia municipal: a auto-organização, manifestada através da elaboração de sua própria lei orgânica; o autogoverno através da eleição de seus representantes; e a autoadministração, relacionada à 8 Por todos, confira-se: “No caso brasileiro, por exemplo, a Constituição claramente situa em patamar superior, sob o ponto de vista material, os direitos fundamentais, se comparados, por exemplo, aos princípios constitucionais da administração pública ou da ordem econômica. A própria circunstância de a Constituição situar tais princípios no início de seu texto (ao contrário do que ocorria na Constituição anterior, do regime militar) já revela a maior importância, o maior “peso abstrato”, que lhes conferiu. Essa hierarquia material superior é confirmada ainda pelo fato de figurarem no texto constitucional como princípios constitucionais sensíveis, legitimando a intervenção federal nos estados que os violarem (art. 34, VII, b), e como cláusulas pétreas (art. 60, §4º,VI)”. SOUZA NETO, Cláudio Pereira de. SARMENTO, Daniel. Direito constitucional: teoria, história e métodos de trabalho. Belo Horizonte: Fórum, 2012, p. 412 e 413. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 147 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. própria gestão pública, bem como à prestação e gestão dos serviços de interesses locais e autonomia financeira. Nesse sentido, é possível afirmar que os Municípios detêm autonomia política, administrativa e financeira decorrentes das características de autogoverno e autoadministração (MODESTO, 2016). Na lição de Hely Lopes Meirelles (2008, p. 94), em sua clássica obra Direito Municipal Brasileiro, ao tratar dos serviços de interesse local, de competência municipal, é estabelecido que: “(...) O provimento de tais negócios cabe exclusivamente ao Município interessado, não sendo lícita a ingerência de poderes estranhos sem ofensa à autonomia local. Pode e deve o Município repelir tais interferências, partam elas de outro Município, do Estado-membro ou da União, através de qualquer de seus órgãos ou poderes. E não sendo possível ao Município ofendido em sua autonomia convencer administrativamente o poder estranho a cessar sua intromissão, poderá recorrer ao Judiciário para anular o ato concreto de interferência inconstitucional.” Assim, a organização dos serviços públicos locais constitui, dentro da ideia de autoadministração, prerrogativa administrativa municipal decorrente de sua autonomia política e financeira. Sua autonomia está intrinsecamente ligada à liberdade de atuação de maneira racional na busca do interesse da população, não podendo ser desrespeitada por qualquer dos demais entes federativos. No entanto, é importante ter-se em mente que afirmar a autonomia do município não implica em reconhecer uma carta branca para sua atuação. Ao mesmo tempo que a Constituição da República garante a autonomia dos municípios, ela traz competências que devem ser encaradas como impositivas. Afinal, a Constituição não é uma mera carta de intenções e deve ser cumprida. A autonomia municipal implica a responsabilidade pelo atendimento das demandas sociais, alicerçadas em direitos fundamentais (CARVALHO FILHO, 2018). Não se pode admitir que os Municípios se utilizem do argumento da autonomia para não cumprirem com o dever constitucional de prestar serviço tão fundamental que é saneamento básico. É nesse contexto que se deve entender a autonomia. De um lado, exige- se que a liberdade de agir dos Municípios na busca do atingimento das competências e atribuições constitucionalmente distribuídas seja respeitada. Por outro lado, não é possível defender que este respeito se estenda ao não fazer, devendo haver consequências para a inação municipal.9 9 Há quem defenda que municípios incapazes de prover o mínimo à sua população devem ser extintos. Neste sentido, argumenta Ricardo Martins. Entende o doutrinador que os 148 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. Definidas as premissas pelas quais se entende a autonomia municipal, é preciso analisar como se dá sua relação com a regionalização da prestação dos serviços de saneamento básico, conforme previsto na lei n° 14.026/2020. A prestação regionalizada dos serviços de saneamento básico, como forma de universalizá-los e a eles conferir maior racionalidade, é, evidentemente, uma premissa posta pela lei n° 14.026/2020 ao alterar a lei n° 11.445/2007. Isto porque, defrontando-se com a realidade do setor, percebeu-se que a maioria dos Municípios isoladamente não tinham capacidade técnica ou financeira de realizar a prestação dos serviços demandados pelo quantitativo populacional que dispunham, observando o ritmo da expansão urbana. Nesse cenário, é importante entender que a atuação e o nível de autonomia do Município serão distintos a depender do mecanismo de regionalização utilizado. Se, de um lado, a regionalização se dará através do Municípios devem possuir condições financeiras de prestar os serviços exigidos pelo texto constitucional. Se uma entidade, considerado o grau de autonomia municipal atribuído a ela pela Constituição, não tem a mínima possibilidade de cumprir suas missões e não há meio de ter autonomia financeira, o que garantiria a sua sobrevivência, deve esta ser extinta. A solução correta não seria uma permissão de transferência ou compartilhamento de competências. Cooperação não é substituição. A impossibilidade permanente de cumprir deveres constitucionais deve ser causa da extinção da entidade. (MARTINS, Ricardo Marcondes. “Titularidade do serviço de saneamento básico à luz da lei federal 14.026/2020”. in DAL POZZO, Augusto Neves (coord.). O Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico. São Paulo: Thomson Reu ters Brasil, 2020, p. 183). A ideia, em si, apesar de drástica, provoca reflexões acerca do elevado número de municípios que compõem a federação e se não seria o caso de se pensar em meios para que eles se tornem viáveis, diante de sua criação sem qualquer estudo de viabilidade municipal. Sobre a criação de município sem este estudo, importante decisão foi tomada pelo Supremo Tribunal Federal na ADI 3.316 de relatoria do Ministro Eros Grau. Buscou-se aferir a constitucionalidade de lei que criara, quase dez anos antes, Município, sem observância dos pressupostos da Emenda Constitucional nº 15 de 1996. O STF entendeu que havia uma “situação excepcional consolidada, de caráter institucional, político”. Invocou-se o princípio da continuidade do Estado e levou-se em conta que o STF, no Mandado de Injunção nº 725, determinara que o Congresso Nacional editasse a lei complementar federal referida pelo § 4º do art. 18 da Constituição. A ação direta de inconstitucionalidade foi julgada procedente, sem a pronúncia de n ulidade pelo prazo de vinte e quatro meses. A lei não foi produzida nesse período. Sobreveio em 2008 a Emenda Constitucional nº 57, inserindo nas Ato das Disposições Constitucionais Transitórias o art. 96: “Art. 96. Ficam convalidados os atos de criação, fusão, incorporação e desmembramento de Municípios, cuja lei tenha sido publicada até 31 de dezembro de 2006, atendidos os requisitos estabelecidos na legislação do respectivo Estado à época de sua criação”. A Emenda abriu exceção, com efeito retroativo, à s normas sobre criação de municípios constantes do art. 18 da Constituição, isentando de nulidade os atos de criação dessas entidades, por não atendimento a todos os requisitos do art. 18, em especial o que se refere à obediência a calendário fixado pelo l egislador federal. MENDES, Gilmar Ferreira. BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 9ª edição, 2014. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 149 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. ferramental da integração metropolitana ou, de outro, a partir da gestão associada mediante consórcio público ou convênio de cooperação ambas previstas na Constituição e no texto original da lei n° 11.445/07 ou, ainda, unidade regional de saneamento básico ou bloco de referência, previstas apenas na lei n° 14.026/2020. Nos mecanismos de regionalização previstos no parágrafo 3º do art. 25 da Constituição - região metropolitana, aglomerações urbanas e microrregiões - a integração do município é compulsória por força da própria previsão constitucional. Essa foi a interpretação conferida pelo STF no julgamento das já mencionadas ADI 1.841/RJ e 1.842/RJ. Tais institutos, trazidos pelo art. 25, §3º da Constituição, têm seu desenho constitucional expresso, qual seja: grupamentos de municípios limítrofes, integrados para a organização e o planejamento na execução de funções públicas de interesse comum. Importante realizar essa diferenciação, pois o constituinte originário, ao definir a regra acima mencionada, realizou espécie de ponderação de interesses, optando por mitigar a autonomia municipal e prestigiar a consecução das funções de interesse comum metropolitano, em prol da realização de direitos fundamentais por meio de serviços públicos. Assim, mesmo nestes mecanismos de integração metropolitana, há a preservação da autonomia municipal, mas os municípios a exercem de maneira mitigada e distinta em função da presença dos interesses comuns (SANTOS, 2017). Por outro lado, nos demais casos previstos na legislação que objetivam a regionalização dos serviços de saneamento básico a discussão se altera. Em tese, a autonomia para a idealização e formação da prestação regionalizada se mostra plena. É o que aparenta o disposto no art. 8º-A da lei federal n° 11.445/2007 a partir da nova redação trazida pela lei federal n° 14.026/2020. No entanto, na prática, a análise mais detalhada dos institutos trazidos para a regionalização fora do ambiente metropolitano permite chegar a conclusões dissociadas da autonomia plena trazida pelo supracitado artigo, a depender do meio idealizado para a regionalização. A gestão associada por meio de consórcio público ou convênio de cooperação, por decorrer de expressa previsão constitucional (art. 241, CRFB), não apresenta maiores controvérsias. Nos termos da legislação recém promulgada, essa modalidade de regionalização dos serviços se dará exclusivamente por Municípios, para prestação direta, através da instituição de autarquia intermunicipal, sendo vedados novos contratos de programa com sociedade de economia mista ou empresa pública e a subdelegação por meio da autarquia municipal sem prévio procedimento licitatório.10 10Conforme previsto no art. 8º, II da lei 11.445/2007. 150 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. Trata-se de manifestação de autonomia municipal com esteio constitucional que deve ser estimulada de modo a propiciar o melhor atendimento da população interessada na prestação dos serviços. No caso das unidades regionais de saneamento básico e dos blocos de referência, inovações recentes, a situação se mostra diversa. A unidade regional de saneamento básico será instituída por lei ordinária estadual visando agrupamento de municípios não limítrofes para atender adequadamente às exigências de higiene e saúde pública, ou para dar viabilidade econômica e técnica aos Municípios menos favorecidos. Já o bloco de referência é mecanismo de regionalização criado pela União, em atuação subsidiária ao Estado, para os municípios não limítrofes. Estas duas formas de regionalização, contudo, são de duvidosa constitucionalidade. Tanto o bloco de referência como a unidade regional de saneamento básico não guardam qualquer previsão constitucional, tendo sido introduzidas tão somente pela lei n° 14.026/2020. Desta forma, representam meios de regionalização, e por conseguinte de mitigação da autonomia municipal, fora das hipóteses previstas na Constituição. Toda e qualquer limitação à autonomia municipal deve estar prevista na Constituição, o que não ocorre com os blocos de referência e a unidade regional de saneamento básico. Ademais, como é cediço, não há hierarquia entre os entes federativos e sim uma divisão de atribuições constitucionalmente previstas. Contudo, parece haver uma prevalência posta pela lei n° 14.026/2020 à União e também aos Estados, que por meio de seus Poderes Legislativos, poderiam afastar a autonomia municipal para a criação destas regionalizações, tratando de serviços públicos que não são de sua competência, consoante interpretação do Supremo Tribunal Federal. Embora pareça que a regionalização visa a atender a direitos fundamentais, há que se fazer uma leitura parcimoniosa dos mecanismos de regionalização trazidos pela lei n° 14.026/2020. A Constituição já traz os meios necessários à expansão dos serviços e atendimento das metas trazidas pela referida lei, sem qualquer desrespeito à forma federativa. Qualquer solução vislumbrada, portanto, deve atender aos ditames constitucionais.11 A modificação das competências constitucionais, posta pela lei n° 14.026/2020, por melhor que pareça ser a intenção do legislador, não pode ser operada por via de lei ordinária federal, sobretudo diante do fato do modelo 11“Mas o fato é que boas intenções e a seriedade do proble ma a ser resolvido não justificam gambiarras (in)constitucionais.” MASCARENHAS, Rodrigo Tostes de Alencar. A ANA e a federação por água abaixo: notas sobre o novo marco legal do saneamento. Disponível em . Acesso em 09/09/2021. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 151 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. federativo adotado na Constituição ser cláusula pétrea. Assim, é vedada a mera deliberação de proposta de emenda tendente a abolir características deste modelo, nos termos do art. 60, §4º,VI. Com muito mais razão, a matéria, por tratar do desenho da forma federativa do Estado, não pode ser tratada por lei ordinária federal. A violação à autonomia municipal parece se agravar ao analisarmos o condicionamento da alocação de recursos à estruturação de prestação regionalizada, o uso do denominado spending power12. Trata-se de tentativa da União de gerar incentivos econômicos à regionalização da prestação dos serviços de modo a obter economia de escala dos investimentos. Uma ferramenta da denominada “arquitetura de escolhas” (SUNSTEIN e THALER, 2019, p. 139). A discussão sobre transferência condicionada e a possível violação do pacto federativo já foi discutida nos EUA. No caso South Dakota vs Dole (1987) foi debatida a constitucionalidade de norma federal que condicionava a transferência de recursos financeiros vinculados ao Highway Trust Fund ao estabelecimento pelos Estados da idade de 21 anos para a aquisição e consumo de bebidas alcoólicas. A Suprema Corte norte-americana considerou válida a norma federal apenas se a condição imposta for clara, estiver razoavelmente relacionada para um objetivo nacional legítimo e o ente federado não for coagido a aceitá-la (ESTADOS UNIDOS, 1987). Já no caso National Federation of Independent Business vs Sebelius (2012), a Suprema Corte dos EUA entendeu ser inconstitucional a ameaça imposta aos Estados de retenção do financiamento federal do Medicaid, caso o Estado não adotasse determinados padrões de expansão deste programa. A Corte ressaltou que os fundos retidos representavam em torno de 10% do orçamento estadual, não deixando outra escolha ao Estado senão ceder às demandas da União (ESTADOS UNIDOS, 2012) . No julgamento da ADI nº 2238/DF, na qual se discutia a constitucionalidade da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o STF considerou ser constitucional o art. 11 de referido diploma normativo, que proíbe a realização de transferências voluntárias aos entes federativos que não exerçam plenamente suas competências tributárias (BRASIL, 2020). Trata-se de um 12O spending power é um mecanismo de coordenação federativa por meio do qual a União subordina a transferência de recursos aos Estados ou Municípios a instituição de políticas específicas, como determinar a adoção de programas elaborados nacionalmente para regulamentar as indústrias de saúde, ou planos autorizados nacionalmente para limitar a poluição do ar. Taking Federalism Seriously: Limiting State Acceptance of National Grants. The Yale Law Journal, Jun., 1981, Vol. 90, No. 7 (Jun., 1981). Disponível em: . Acesso em: 01/09/2021. pp. 1695-1696. 152 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. mecanismo de spending power, obrigando que os entes federativos tenham um compromisso fiscal, sob pena de perderem acesso aos recursos federais voluntários13. Analisando as condições de acesso a recursos federais impostas pela lei federal n° 14.026/2020, diante dos casos acima mencionados, resta saber se representam uma violação à autonomia municipal. Aplicando-se os requisitos previstos no caso South Dakota vs Dole (1987), é possível vislumbrar que as condições para a regionalização impostas são claras e estão de acordo com objetivos constitucionais. Entretanto, a polêmica que parece estar presente diz respeito ao grau de indução promovido pela norma, que traz características demasiadamente impositivas. Aqueles que defendem o manejo do recurso do spending power alegam que a adesão é mero incentivo e que o cumprimento da condicionante é opcional e, desta forma, não afeta a autonomia do ente federativo menor, por ser meramente indutivo14. Contudo, entende-se que, considerando o contexto fático atual, não é possível falar-se em facultatividade da adesão dos titulares de serviços públicos de saneamento às estruturas das formas de prestação regionalizada não constitucionalmente previstas (art. 8-A da lei 11.445/2007), inexistindo mecanismo indutivo. Isto porque a adesão à regionalização é uma exigência para a alocação de recursos públicos federais e financiamentos com recursos da União, conforme previsto no art. 50 da mesma lei, e sabe-se que, na realidade, grande parte dos municípios não possuem condições econômicas de recusar tal auxílio. Conforme previamente destacado, a autonomia está intrinsecamente ligada à capacidade de gestão. E, considerando a realidade financeira da maior parte dos municípios do país, não há muitas possibilidades de haver uma manifestação verdadeiramente livre e autônoma se os custos envolvidos na escolha ou eventual recusa se revelam muito elevados, como é o caso. Mesmo que um Município de menor orçamento, com a necessidade de promover melhorias nos serviços de saneamento básico, apresente boas ideias para tal, não terá possibilidades de desenvolvê-las caso não opte pela regionalização, tendo em vista esta ser uma das condições para se acessar o auxílio financeiro da União de que necessita para a execução. Assim, essa condição, ao que parece, nada mais é do que a imposição de um projeto da União em detrimento da autonomia municipal, decorrente de uma postura eminentemente centralizadora das decisões e paternalista, partindo-se 13 Esse caso da ADI 2238 é peculiar, porque visa pro ibir que entes que ainda podem exercer sua competência tributária plena busquem recursos federais 14 Exemplificativamente quanto a este ponto veja-se: RIBEIRO, Wladimir Antonio. Regionalização e Autonomia Municipal. Revista Internacional da Academia Paulist a de Direito, n. 7, Nova Série, Edição Especial. 2021. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 153 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. da premissa de que os entes municipais são incapazes de prestar adequadamente os serviços. A União não pode, sob qualquer pretexto, impor suas decisões, ainda que, à primeira vista, sejam tidas como mais eficientes, tendo em vista a necessidade de se preservar a federação.15 Toda essa discussão acerca da modelagem da prestação regionalizada e sua intersecção com a autonomia municipal foi apresentada ao STF por meio de algumas ADI que foram recentemente julgadas, sendo fixado o entendimento pela constitucionalidade das inovações trazidas pela lei 14.026/2020. No entanto, é válida a análise da discussão levada ao STF em função da profundidade e da didática apresentada pelos autores das ADI.16. Em função de sua maior assertividade no enfrentamento do tema enfrentado no presente trabalho, merecem menção as discussões abordadas na ADI nº 6.583/DF, proposta pela Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento (ASSEMAE) (BRASIL, 2020). Na mencionada ação direta de inconstitucionalidade, a ASSEMAE argumenta que a definição de unidade regional de saneamento básico violaria tanto a jurisprudência do STF e o §3º art. 25 da Constituição Federal ao atribuir ao Estado a competência de sua criação por lei ordinária, sem que estejam satisfeitos os critérios para a instituição de uma região metropolitana, aglomeração urbana ou microrregião. Além disso, é apontado que a jurisprudência do STF é clara no sentido de que apenas os Municípios, titulares do serviço de saneamento básico, podem decidir se agrupar por meio de consórcio público ou convênio de cooperação, nos termos do art. 241 da Constituição, não sendo possível ao Estado intervir na 15 “(...) nem tudo que é conveniente do ponto de vista da gestão (normas uniformes de boa qualidade técnica) ou do ponto de vista econômico (capacidade de investimento) pode, numa federação, ser imposto pelo ente central.” MASCARENHAS, Rodrigo Tostes de Alencar. A ANA e a federação por água abaixo: notas sobre o novo marco legal do saneamento. Disponível em . Acesso em 09/09/2021. 16A primeira ação a ser proposta foi a ADI 6.492/DF, distribuída em 23/07/2020 pelo Partido Democrático Trabalhista. Além dela, existem outras 3 ações diretas de inconstitucionalidade debatendo dispositivos da lei nº 11.445/2007 com a redação dada pela lei federal nº 14.026 a ela apensadas. São elas: ADI 6.882/DF, movida pela Associação Brasileira das Empresas Estaduais de Saneamento (AESBE), ADI 6.536/DF, de autoria do Partido Comunista do Brasil (PCdoB), Partido Socialismo e Liberda de (PSOL), Partido Socialista Brasileiro (PSB) e do Partido dos Trabalhadores (PT) e ADI 6.583/DF de autoria da Associação Nacional dos Serviços Municipais de Saneamento Básico (ASSEMAE). Todas encontram-se disponibilizadas no site do Supremo Tribunal Federal. A ADI 6.492 encontra-se em . Acesso em 15/11/2021. https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5965908 154 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. autonomia municipal, exceção posta unicamente no §3º art. 25 da Carta Magna. A criação, pelo Estado, da unidade regional de saneamento básico constituiria, então, burla ao pacto federativo, à distribuição de competências constitucionalmente definidas e, em última instância, à jurisprudência vinculante do STF. Ainda de acordo com a petição inicial da ADI em análise, a criação do chamado bloco de referência segue pelo mesmo caminho. Não apenas haveria violação da autonomia municipal pelo Estado, como também pela União. Além disso, haveria um “absurdo lógico”, tendo em vista que, se apenas os Municípios podem decidir se associar, no exercício de sua autonomia municipal, não faria sentido a União criar essa forma de regionalização por meio de lei ordinária. Esta previsão, seria, então, forma de a União coagir os municípios a aceitarem a criação do bloco de referência. Ademais, é sustentado haver “contradição em termos” entre o disposto na alínea “c” do inc. VI do art. 3º da Lei nº 11.445/07, que dispõe que o bloco de referência será estabelecido por lei federal, mas formalmente criado por meio de gestão associada voluntária dos titulares, e o inc. II do mesmo art. 3º, que reconhece que gestão associada é aquela voluntária prevista no art. 241 da Constituição Federal. Deste modo, se os Municípios, no exercício de sua competência municipal, já se organizaram voluntariamente para a criação de um consórcio público ou convênio de cooperação, não seria necessária mais uma nova lei federal para constituir um bloco de referência. Haveria, assim, usurpação, pela União, da competência municipal sobre o serviço de saneamento básico, eliminando por completo o autogoverno e a autodeterminação do Município. Assim, argumenta-se que a solução da lei seria a invasão pelos Estados das competências municipais para criação das unidades regionais que entenderem adequadas, mesmo não estando presente o requisito constitucional do interesse comum, ou a União invadirá e fará o que desejar. Conforme mencionado anteriormente, o STF, julgando as ações diretas de inconstitucionalidade nº 6.492, 6.536, 6.583 e 6.882, entendeu pela constitucionalidade de todas as modificações trazidas pela lei 14.026/2020. Com base em uma lógica mais política, para incentivar o crescimento do setor, buscando conferir segurança jurídica, do que em argumentos jurídicos, o entendimento foi pela improcedência total das ações. O voto condutor do julgamento se limitou a uma análise do cenário setorial do saneamento básico no Brasil e das mudanças pretendidas com a lei 14.026/2020. O ponto da autonomia municipal foi tratado no acórdão dentro da análise dos chamados mecanismos de cooperação interfederativa, notadamente quanto à participação da União. Em relação à alegada afronta à mencionada autonomia municipal, o acórdão simplesmente afirma não haver tal violação, A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 155 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. sem, contudo, apresentar qualquer argumento de cunho jurídico que sustente tal entendimento. Merece destaque o seguinte trecho: “(...) É dado presumir que o Estado - ou, subsidiariamente, a União - desenhará arranjos federativos de contratação pública atentos às necessidades das populações locais, às disparidades intermunicipais e à agenda do desenvolvimento urbano”. Deste modo, parece claro que a nova legislação, demonstrando preocupação com a universalização dos serviços de saneamento básico, buscou estimular a regionalização da prestação objetivando ganhos de escala, o que foi reconhecido pelo STF no julgamento das ADI mencionadas anteriormente.17 No entanto, evidencia-se que o caminho escolhido para tanto acaba por reduzir a autonomia municipal nas escolhas legítimas para a prestação dos serviços.18 17 O STF entendeu que a organização das atividades continua sob a titularidade dos Municípios, ao passo que o planejamento é o resultado da deliberação democrática em dois níveis: o Plano Federal e o Estadual ou Regional. Além disso, os novos arranjos federativos seriam um dos trunfos do marco regulatório para promover a modicidade tarifária. Aponta a Corte, ainda, que as unidades regionais de saneamento básico e os blocos de referência podem ser benéficos à outorga dos serviços que contemplam subsídios cruzados, agregando entes administrativos deficitários e superavitários quanto à arrecadação com os serviços de saneamento, buscando corrigir disparidades em face do acesso e da capilaridade. 18 MASCARENHAS faz severas críticas ao uso do spending power pela União Federal: “Mas o NMLSB criou (na verdade aperfeiçoou) um mecanismo que ainda será objeto de estudos de alta teoria do direito. Trata-se da ‘força pecuniária vinculante’, ou, om português castiço, ‘eu pago, você me obedece’. Com efeito, a leitura do novo artigo 48 da Lei da ANA combinada com o artigo 50, III da LSB alterado pelo NMLSB (Art. 50. A alocação de recursos públicos federais e os financiamentos com recursos da União ou com recursos geridos ou operados por órgãos ou entidades da União serão condicionados: Ill-à observância das normas de referência para a regulação da prestação dos serviços públicos de saneamento básico expedidas pela ANA), deixa claro o seguinte: quem não seguir as normas de referência em questão não poderá receber recursos da União. Note-se que a União já fez algo parecido - mas bem mais tímido - ao condicionar o repasse de recursos federais ao cumprimento por estados e municípios deste ou daquele compromisso (por exemplo no art. 11 da Lei de Responsabilidade Fiscal). A prática já era discutível. Mas agora (na vigência do slogan "Mais Brasil menos Brasilia") a ousadia é grande. Como condição para acesso a financiamentos federais, a União simplesmente pretende (na prática) transferir a regulação dos serviços de saneamento dos titulares definidos pela Constituição (interpretada pelo STF) para ela própria. Em suma, as normas em questão serão obedecidas por quem quiser, em especial por quem quiser receber recursos da União, o que certamente constitui a grande maioria de estados e municípios. Mas atenção, para receber tais recursos não basta abrir mão de sua autonomia e obedecer tais normas. Com efeito, o NMLSB (na nova redação do artigo 50 da LSB) estabeleceu tantas outras condições de difícil comprovação para o recebimento de recursos federais que (em tempos de apagão das canetas e de justificado medo dos servidores públicos, 156 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. Neste contexto de mitigação da autonomia dos Municípios, é importante observarmos como estes entes poderão exercê-la dentro da estrutura de regionalização. III. O EFETIVO EXERCÍCIO DA AUTONOMIA MUNICIPAL E AS FORMAS DE SUA MANIFESTAÇÃO Conforme exposto previamente, a lei federal n° 14.026/2020 trouxe como meio para a adequada prestação do serviço de saneamento básico a prestação regionalizada. Esta forma de prestação, por melhores que sejam as justificativas para sua implementação, representa, a depender do contexto em que inserida a regionalização, limitação à autonomia municipal em maior ou menor grau. Neste sentido, considerando a proximidade do gestor do Município às necessidades da população no setor de saneamento básico, o efetivo exercício da competência municipal, de acordo com o plano de governo legitimado pelo voto popular, deveria ser privilegiado. Dentro do desenho das relações federativas há dois ambientes para a prestação conjunta dos serviços públicos. Um deles é o da coordenação federativa, de natureza compulsória e que tem lastro na Constituição Federal. Outro ambiente é o da cooperação federativa que se origina apenas da vontade dos entes envolvidos (RIBEIRO, 2021). Não é possível, portanto, afirmar-se que a presença compulsória dos municípios na integração metropolitana representa violação à autonomia municipal, tendo em vista que a própria Constituição previu este modelo de cooperação entre os entes na persecução do interesse comum metropolitano. Mesmo com a integração compulsória, os municípios preservam sua autonomia, ainda que mitigada, exercendo-na de forma distinta em função da existência de interesses comuns a todos os entes que compõem a os mecanismos de integração metropolitana (SANTOS, 2017). Nas modalidades de regionalização previstas no art. 25, § 3º da Constituição, que trata de funções públicas de interesse comum, há adesão compulsória para os municípios. Trata-se de expressão da denominada coordenação federativa. tema já tratado em outro artigo neste mesmo espaço), dificilmente algum estado ou município conseguirá comprovar que atende todos os requisitos (ocasião em que ouviremos dizer que dinheiro para saneamento existe, o que não existe são bons projetos, uma boa forma de colocar a culpa nos estados e municípios).” MASCARENHAS, Rodrigo Tostes de Alencar. A ANA e a federação por água abaixo: notas sobre o novo marco legal do saneamento. Disponível em . Acesso em 09/09/2021. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm#art25%C2%A73 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 157 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. Nessa sistemática, o serviço de saneamento básico constitui interesse comum que não pode estar subordinado à direção de único ente, mas deve ser planejado e executado em ambiente de gestão compartilhada com decisões colegiadas em que participem tanto os Municípios compreendidos como o Estado. A titularidade passará, então, a ser exercida de forma colegiada pelo conjunto dos Municípios e o Estado e, dentro desta forma de regionalização, a integração metropolitana será constituída como uma entidade intergovernamental com natureza de autarquia interfederativa compulsória, servindo de instrumento de organização e planejamento dos entes federativos que a integram (RIBEIRO, 2021). Neste sentido, os Municípios exercem de forma diversa sua autonomia. De fato, as principais decisões que envolvem a prestação do serviço dentro da integração metropolitana devem passar pelo órgão colegiado titular do serviço público. No entanto, podem ser vislumbradas algumas atividades atribuíveis apenas aos Municípios que podem ser por eles exercidas dentro do ambiente de integração metropolitana como expressão de sua autonomia. A primeira forma de exercício da referida autonomia a ser mencionada decorre da participação dos Municípios no órgão colegiado da integração metropolitana, através do voto. Para a efetividade da autonomia municipal, deve existir real possibilidade de influenciar a tomada de decisões. Nos termos da ADI 1.842/RJ, não é cabível que haja predomínio do poder de decisão de um ente sobre os demais. Assim, não pode a Lei Complementar que institui a referida região atribuir ao Estado as possibilidades de definir os rumos dos serviços públicos dentro da integração metropolitana, cabendo também aos municípios a escolha do que será realizado naquele ambiente. Outra possibilidade de exercício da autonomia municipal é a elaboração dos planos municipais de saneamento básico, caso ausente o plano regionalizado previsto no art. 17 da lei federal n° 11.445/2007. Trata-se de importante mecanismo para apontar as reais necessidades dos Municípios no tocante à prestação dos serviços. Por outro lado, caso haja plano regional de saneamento básico, os municípios envolvidos devem ser ouvidos em sua elaboração como forma de defesa dos interesses da população de seus territórios. Ainda se vislumbra a possibilidade de preservação da autonomia municipal por meio da fiscalização da prestação dos serviços de saneamento básico. Ainda que a função regulatória seja exercida no ambiente da regionalização, é possível que os Municípios exerçam a fiscalização dos serviços, caso eventual agência reguladora não exerça de maneira efetiva, possibilitando que os direitos fundamentais de sua população sejam plenamente satisfeitos. A existência de mecanismo de regionalização não afasta a 158 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. competência dos entes federativos do exercício do poder de polícia, devendo, entretanto, ser respeitada, caso exercida, a função regulatória da agência prevista no contrato de concessão. Por fim, ainda merece ser destacada a possibilidade do Município, eventualmente, legislar sobre matérias que, apesar de definidas como interesse comum, afetam diretamente a população local. Isso porque a instituição de quaisquer das entidades de integração metropolitana não tem o condão de criar um ente político-federativo. Deste modo, a região metropolitana e as demais entidades não são competentes para a edição de leis e, por isso, editam apenas normas de caráter administrativo que, em princípio, não vinculam os entes políticos (ALVES, 1998). Há que se problematizar, ainda, a hipótese de Municípios que, por algum motivo, se sentirem preteridos na prestação do serviço dentro do ambiente de integração metropolitana buscarem sair da regionalização. Já há vozes na doutrina apontando para este eventual problema19, que, a priori, não apresenta fácil solução. Se, por um lado, a compulsoriedade da adesão à integração metropolitana pode levar à conclusão de impossibilidade de um Município insatisfeito com a prestação dos serviços dela se retirar, há que se considerar que é dever dos gestores zelar pelo melhor interesse de sua população. Nesta hipótese, a solução que se vislumbra é gradual: primeiramente, a atuação municipal dentro do órgão colegiado em vistas à melhoria de sua situação e, caso isso não ocorra, o caminho da judicialização ou outros mecanismos de 19 “As regiões legais - regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões - têm uma disciplina jurídica da estrutura de governança a elas aplicável ainda muito indefinida. Não se sabe qual é exatamente o papel das instâncias executiva e colegiada de tais regiões, a quem compete sua representação legal, sobretud o para o exercício das funções de poder concedente, e como se resolvem questões importantes em matéria de voto, veto, impasses, conflitos e contribuições financeiras interfederativas em seu âmbito. Por essa razão, vem sendo combinadas com instrumentos de g estão associada, especificamente convênios de cooperação entre a região - representada para tal fim pelo colegiado -, o estado enquanto entidade delegatária do exercício das titularidades, mas exclusivamente para o fim de, ulteriormente, conceder a prestaç ão dos serviços de saneamento básico mediante prévia concorrência entre os interessados. A formação da decisão pela celebração do convênio de cooperação nessas situações, porém, pode apresentar inconsistências relevantes. Se um município participante da região legal for dissidente e não concordar com o convênio, ele se manteria vinculado ante o voto da maioria dos municípios participantes? Qual o valor do voto de cada município? O Estado pode tomar parte dessa deliberação? Se sim, qual o valor do seu voto?” VANZELLA, Rafael Domingos Faiardo. BORGES, Jéssica Suruagy Amaral. “Notas sobre a prestação regionalizada dos serviços públicos de saneamento básico”. in DAL POZZO, Augusto Neves (coord.). O Novo Marco Regulatório do Saneamento Básico. São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020, p. 248 e 249. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 159 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. solução de controvérsias porventura existentes no desenho institucional realizado. Ressalte-se não se cogitar a hipótese de o município insatisfeito simplesmente se retirar da prestação regionalizada no contexto de integração metropolitana em função da compulsoriedade de sua adesão que, por uma espécie de paralelismo, deve servir à preservação ao máximo da estrutura de regionalização dos serviços. Outro caminho para a prestação regionalizada é o da cooperação federativa que, por se dar fora do ambiente de integração metropolitana, possui natureza voluntária, decorrendo da vontade dos entes através do exercício de sua autonomia. A repartição de competências pela Constituição não significa que cada ente deve atender aos seus interesses de maneira isolada, mas, sim, que os entes devem exercê-las em prol do interesse público. Daí decorre a ideia de cooperação entre os entes federativos (RIBEIRO, 2021). No campo dos serviços públicos, a cooperação federativa está desenhada no art. 241 da Constituição Federal, através da previsão da gestão associada dos serviços públicos e, por decorrer da autonomia dos entes federativos, autoriza a transferência total ou parcial de encargos, serviços, pessoal e bens essenciais à continuidade dos serviços transferidos. Neste caso, admite-se a reunião de Municípios que não possuem contiguidade territorial e podem ser adotadas as formas de consórcio público ou de convênio de cooperação entre os entes federados. Decerto, apesar da previsão da prestação regionalizada pela via da cooperação federativa, o Município pode optar por prestar o serviço por conta própria, de forma direta ou por meio de concessão precedida de licitação. Exemplos de Municípios que optaram por este caminho não faltam.20 Entretanto, revela-se, igualmente, como forma de expressão de sua autonomia, a decisão pela adesão ou não à regionalização. Se a integração aos mecanismos de prestação regionalizada é voluntária, a própria adesão dos Municípios decorre de sua autonomia. Trata-se de mitigação voluntária da própria autonomia municipal. Como a adesão aos mecanismos de prestação regionalizada se dá de forma voluntária, os Municípios envolvidos podem e devem negociar os termos da atuação no campo político, escolhendo quais os serviços serão prestados por meio da entidade regional criada, como se dará a regulação, se a prestação será 20A título exemplificativo, pode ser citado o caso de Teresópolis, município da região serrana do Estado do Rio de Janeiro, que, no segundo semestre de 2021, publicou edital para a concessão dos serviços de abastecimento de água e esgotamento sanitário, como pode ser observado no seguinte sítio eletrônico: < https://teresopolis.rj.gov.br/saneamento/> 160 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. realizada por intermédio de autarquia interfederativa ou concedido, entre outros. Todas as escolhas decorrem da atuação conjunta dos Municípios. Nesse cenário, é possível sustentar, ainda, que as controversas figuras dos blocos de referência e das unidades regionais de saneamento básico possam ser interpretadas conforme a Constituição, conduzindo ao entendimento de se tratarem de mecanismos de regionalização voluntária, em que pese o STF não ter se manifestado nesse sentido ao analisar as Ações Diretas de Inconstitucionalidade, mencionadas no tópico anterior. Desta forma, respeita-se a autonomia municipal conforme previsão do já mencionado art. 8º-A da lei federal n° 14.026/2020, embora seja necessária sua análise relacionada ao aspecto indutivo previsto na referida norma, tratado no item anterior, em relação ao spending power. Ademais, o que foi dito no caso da coordenação federativa acerca da elaboração dos planos de saneamento básico e da competência legislativa também pode ser transplantado para o cenário de cooperação federativa, razão pela qual para lá se remete o leitor. Por fim, é possível cogitar-se, a depender do arranjo realizado para a regionalização, que a retirada de um Município da prestação regionalizada, neste contexto, se mostra mais acessível do que na integração metropolitana, justamente em função da voluntariedade na adesão. Mesmo em casos em que o serviço seja concedido à iniciativa privada, é possível vislumbrar cenário em que um Município que se sinta preterido na atuação da concessionária possa tomar providências na defesa do interesse de seus munícipes, como a formação de diálogo com os demais entes que pertencem a unidade regional e, ainda, a aplicação de sanções pela Agência Reguladora ou, até mesmo, a aplicação de sanções previstas no próprio contrato de concessão. Ademais, em situação extrema, pode-se cogitar que um Município insatisfeito opte por não mais fazer parte do cenário de regionalização, seja por declaração de caducidade ou por encampação21, e retorne à prestação de maneira isolada. Independente do contexto em que se dá a regionalização do serviço, seja por meio de coordenação ou cooperação federativa, é necessário frisar que o exercício da autonomia municipal deve ser lido, sempre, em conjunto com a necessária responsabilidade pela realização dos direitos fundamentais. Como dito anteriormente, autonomia municipal não pode ser invocada para justificar um não fazer. Desta forma, toda e qualquer atuação do ente municipal em vistas ao exercício de sua autonomia municipal deve servir ao fim último que é a 21 Sabe-se que esta última hipótese existe, basicamente, no campo teórico, tendo em vista a dura realidade da maior parte dos Municípios que não possuem recursos suficientes para custear as indenizações decorrentes de um processo de encampação de contratos de concessão. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 161 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. melhoria e universalização dos serviços de saneamento básico prestado à população. CONCLUSÃO A alteração promovida pela lei federal n° 14.026/2020 trouxe inúmeras novidades para o setor de saneamento básico no país. Dentre elas, destaca-se o maior estímulo dado à regionalização da prestação dos serviços, como forma de alcançar ganho de escala e, desta forma, aumentar os investimentos no setor com vistas a universalizar o serviço dentro das metas trazidas pela mencionada lei. Esse estímulo à regionalização, ainda que visto como o instrumento para a concretização de ótimas intenções, considerando que os serviços de saneamento básico se relacionam à dignidade humana e direitos fundamentais, não se mostra livre de críticas. A opção pela prestação regionalizada, com a criação de mecanismos de regionalização sem lastro na Constituição e o spending power, meio utilizado para estimulá-la, apresentam duvidosa legitimidade por, no mínimo, reduzirem a autonomia municipal prevista constitucionalmente, impactando no modelo federativo adotado no país. Ainda que a limitação à autonomia municipal no contexto da integração metropolitana se mostre adequada do ponto de vista constitucional, o mesmo não pode ser dito dos mecanismos da unidade regional de saneamento e do bloco de referência. Estes, por não possuírem lastro na Constituição, podem ser vistos como ilegítima restrição à autonomia dos Municípios, podendo se falar neste caso de inconstitucionalidade destas previsões trazidas pela lei federal nº 14.026/2020, ressalvada a interpretação conforme à Constituição apontada no corpo do presente trabalho. Por sua vez, a necessidade de recursos financeiros e a disciplina de transferências voluntárias pela União, estabelecida pela lei federal n° 14.026/2020, atrelada à precariedade de recursos dos municípios fará, na realidade, com que a autonomia municipal seja limitada pela necessidade de se ter recursos para investimentos em saneamento básico. Assim, acredita-se que, na prática, os municípios acabarão se regionalizando compulsoriamente para ter acesso a linhas de financiamento e créditos para o setor de saneamento básico. Neste contexto, o presente artigo pretendeu, após as devidas contextualizações, propor e sistematizar mecanismos de atuação municipal dentro da quase que imposta regionalização do serviço de saneamento básico, no intuito de verificar quais seriam os espaços de exercício da autonomia dos municípios. 162 A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento... (p. 139-166) JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. Sendo assim, concluiu-se, na esteira do entendimento do STF, que, independentemente do mecanismo adotado para regionalizar os serviços, sempre haverá um espaço de atuação autônoma dos Municípios, variando apenas o grau da autonomia. Se dentro da denominada coordenação federativa, haverá maior restrição à ação municipal. Por outro lado, caso se tratar da denominada cooperação federativa, os entes municipais terão maior espaço de atuação. É importante que se garanta meios para a manifestação dos municípios de modo que possam exercer sua autonomia e, desta forma, preservar a federação brasileira. A adesão aos mecanismos de prestação regionalizada visa a possibilitar maiores investimentos no setor, e, diante de diversos contratos em curso para prestação destes serviços públicos e de outros tantos que serão celebrados e que precisam ser respeitados, a delimitação de espaços de atuação de cada ente federativo garantirá a esperada segurança jurídica para o setor. Assim, diante de todo exposto percebe-se serem muitas as considerações que precisam ser feitas a respeito das alterações promovidas pela lei federal n° 14.026/2020. Entende-se que a motivação de sua edição se baseou muito mais em questões políticas e econômicas, necessárias à universalização, porém de modo a colocar em risco o desenho federativo. Esta situação está foi levada ao STF por meio de ações diretas de inconstitucionalidade. Em julgamento finalizado em dezembro de 2021, o STF, por maioria de votos, julgou improcedentes todas as ADI ajuizadas contra a lei federal n° 14.026/2020. Entendeu o Supremo que “a eficiência de tal serviço é de interesse dos Estados e da União, já que ajuda a preservar a saúde das pessoas e o meio ambiente e a promover desenvolvimento econômico sustentável.” Apesar de ser uma decisão criticável, fato é que nossa Corte Suprema confirmou a constitucionalidade das inovações trazidas pela novel legislação, o que, por si só, já traz maior segurança jurídica ao setor, inclusive garantindo a paridade de armas entre os players que participarão dos futuros certames para concessão dos serviços de saneamento básico. Contudo, muitos serão os desafios a serem enfrentados pelos gestores públicos, pelos prestadores dos serviços e pelos operadores do direito face a esta nova realidade decorrente da lei federal n° 14.026/2020, não sendo possível entender, de plano, qual será o cenário do setor de saneamento básico a forma que a autonomia municipal será efetivada. Espera-se que o presente trabalho possa contribuir para o aprimoramento do debate em torno de importante legislação que veio para mudar um setor tão carente de melhorias. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico (p. 139-166) 163 JOBIM, A. F. C.; KOWARSKI, D. D.; MORELLI, G.; PAZ, T. F. da; SOUSA, R. de. A autonomia municipal na prestação regionalizada de saneamento básico. Revista de Direito Setorial e Regulatório, v. 9, nº 1, p. 138-166, maio de 2023. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Alaôr Caffé. Regiões Metropolitanas, Aglomerações Urbanas e Microrregiões: Novas Dimensões Constitucionais da Organização do Estado Brasileiro. Revista da Procuradoria Geral do Estado de São Paulo: Edição Especial em Comemoração aos 10 Anos de Constituição Federal, set. 1998. Disponível em . Acesso em 05/10/2021. BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional Positivo. São Paulo: Ed. Malheiros, 18ª Ed., 2006. BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Regional. 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